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Sentimento nobre. Causa nobre. Horário nobre. Não faz sentido histórico nenhum, mas o adjetivo é positivo, dizem os dicionários. Segundo o Aulete, a nobreza, qualidade do nobre, é “superioridade moral, grandeza de caráter, magnanimidade”.
Na prática, ao longo dos séculos, o verbete tem outra cara. E nem precisamos recuar na linha do tempo até Maria Antonieta.
Como estamos no caderno de esportes, vamos a 2016, quando o milionário presidente do Palmeiras, entre um brioche e outro, fechou a rua do moderno estádio do clube para aqueles que não conseguiam pagar o ingresso e faziam sua festa nos arredores.
Repare que o pobre não pode ir ao jogo e não pode nem chegar perto da arena. Nobre, nobilíssimo.
Mas não adianta. O brasileiro tem um fetiche irremediável. Em 2019, há quem se diga príncipe, e os supostos hábitos sexuais da dita Família Real podem definir o vice-presidente da República. República?
A discussão sociológica não cabe aqui, nem sou capaz de dar conta dela, porém não parece difícil entender a sede de realeza de quem é sempre ferrado por ela. A elite branca, assim, permite àqueles que não são Orléans e Bragança, especialmente aos negros, uma cota.
Há 40 anos, Glória Maria preenchia essa cota na TV Globo. Agora, é a vez de Maria Júlia Coutinho.
Aqui, ocorre a mesma coisa. Às terças-feiras, escreve neste espaço o ótimo companheiro Luís André Rosa, negro. Todo o resto da semana é branco.
É um negro por vez, e olhe lá. A realeza permitida é a do Rei do Futebol, cujo gol mil foi celebrado nesta semana, ou a do Príncipe do Pagode, que nos deixou também nesta semana, trabalhando bravamente até o fim.
Não sei se cabe a um branco falar tudo isso aqui. Não é meu lugar, não é minha luta, embora seja também. Só posso dizer que a apoio. E que, entre o Príncipe do Pagode e o não príncipe Orléans e Bragança, este é um retrato escrito que vem ratificar o óbvio.