Justiça derruba decisão que obrigava planos de saúde a cobrir exame para Covid-19
Decisão atende a pedido da ANS, que por enquanto manterá a exigência da cobertura
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A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) derrubou na Justiça a decisão liminar que obrigava os planos de saúde a cobrir o teste de sorologia para Covid-19.
No dia 29 de junho, a ANS publicou norma que obrigava os planos a incluírem o teste sorológico que identifica a presença de anticorpos. A decisão da agência reguladora seguia determinação judicial.
Agora, mesmo após conseguir derrubar a determinação da Justiça, a ANS informou que ainda vai analisar a decisão liminar e, por enquanto, as operadoras de planos de saúde continuam tendo que garantir a cobertura dos testes.
"O tema será levado para discussão da Diretoria Colegiada da ANS, que avaliará a medida a ser tomada. Enquanto isso, segue válida a Resolução Normativa nº 458, que desde o dia 29 de junho obrigou os planos de saúde a oferecerem os exames sorológicos - pesquisa de anticorpos IgA, IgG ou IgM (com Diretriz de Utilização) para Covid-19", afirma a agência reguladora.
A ANS diz ainda que está em curso uma avaliação técnica sobre a inclusão dos testes sorológicos para detecção de anticorpos relacionados ao novo coronavírus no rol de coberturas obrigatórias. "Inclusive, a matéria estava em estudo antes mesmo da propositura da ação civil pública, sendo que a conclusão do mesmo está prevista para os próximos dias", informa o órgão.
Segundo a agência, estudos e análises de diversas sociedades médicas apontam a possibilidade de ocorrência de alto percentual de resultados falso-negativos e há dúvidas também quanto ao uso desses exames para o controle epidemiológico da Covid-19.
Decisão da Justiça
O exame sorológico, liberado em 29 de junho para os beneficiários de planos de saúde, detecta a presença de anticorpos IgA, IgG ou IgM, produzidos pelo organismo após exposição ao vírus. Para isso, é necessário colher uma amostra de sangue. Esse tipo de teste é indicado a partir do oitavo dia de início dos sintomas.
Nesta segunda-feira (13), o TRF-5 (Tribunal Regional Federal da 5ª Região) acatou o pedido de agravo de instrumento interposto pela ANS contra a decisão de 1ª instância favorável à ação civil pública da Aduseps (Associação de Defesa dos Usuários de Seguros, Planos e Sistemas de Saúde), que permitiu a inclusão do exame no rol de coberturas obrigatórias dos planos de saúde.
Na decisão, o desembargador Leonardo Augusto Nunes Coutinho atendeu os argumentos defendidos pela ANS. "Quanto aos exames IgG e IgM, defendeu a agravante que, conquanto eles proporcionem a identificação de anticorpos, não estaria descartada a possibilidade de reatividade cruzada com outros coronavírus não causadores da Covid-19, de modo que, aquilo que denominou de 'teste padrão ouro', seria o RT-PCR, já incorporado ao rol de procedimentos obrigatórios da ANS no início da pandemia", afirma o magistrado.
O desembargador apontou, também, a transferência da responsabilidade do fornecimento de testes do setor público para o privado.
"Embora tenha reconhecido a utilidade dos testes IgM e IgG, insurgiu-se a ora recorrente [ANS] contra a realização deles de forma indiscriminada, de modo que a decisão teria resultado na transferência, ao sistema de saúde suplementar, daquilo que se compreende como adequado ao sistema público", afirma Coutinho, que assinalou ainda o impacto financeiro que a decisão teria sobre as operadoras.
"Sinalizou perigo de dano reverso, a colocar em risco a população, além da higidez financeira do sistema de saúde suplementar, composto por operadoras dos mais diversos portes econômicos, em se considerando o impacto ao sistema suplementar de saúde pública, que arque com o pagamento de testes ainda novos no mercado."
A FenaSaúde (Federação Nacional de Saúde Suplementar), que é amicus curiae na ação, defendeu a decisão da Justiça.
"Os testes sorológicos são de baixa acurácia e podem levar a diagnósticos errôneos em relação ao tratamento para a Covid-19, sendo uma decisão favorável, sobretudo, aos beneficiários dos planos de saúde", afirma Vera Valente, diretora executiva da entidade.
"De acordo com a Anvisa, dos 102 testes rápidos liberados até hoje, 44,1% não possuem desempenho de acordo com o alegado pelo fornecedor. Além disso, segundo a publicação científica britânica The BMJ, em 34% dos casos os testes rápidos dão falso negativo. A OMS [Organização Mundial da Saúde] e o Ministério da Saúde também não os recomendam para diagnosticar a doença", afirma Valente.
Autora de ação vai recorrer
A Aduseps, autora da Ação Civil Pública que resultou na obrigatoriedade de cobertura, já informou que entrará com recurso para comprovar a necessidade dos testes.
"A atitude da ANS em derrubar a liminar é uma afronta, uma falta de respeito aos consumidores que pagam pelos seus planos e seguros de saúde", afirma Renâ Patriota, presidente da entidade. "Os exames sorológicos atendem a uma necessidade que, de acordo com a indicação médica, vai dizer o nível de anticorpos pela titulação do IgG e IgM."
A representante da Aduseps critica ainda o posicionamento do governo ao permitir a venda de testes. "A ANS não considera o exame importante, pois as operadoras é que devem pagar pelo procedimento da sorologia. Enquanto isso, a Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] autoriza farmácias e drogarias a venderem testes sorológicos."
Advogado defende proteção ao consumidor
"Não são todos os exames que entram no rol de procedimentos da ANS. Um comitê atualiza, de dois em dois anos, quais testes serão incluídos na lista", explica o advogado Léo Rosenbaum, sócio titular e coordenador do Rosenbaum Associados. "Como a Covid pegou todos de surpresa, o rol não estava atualizado, a ANS não se mexeu e uma entidade [a Aduseps] foi à Justiça e obteve liminar para obrigar a inclusão. A ANS recorreu e agora veio o resultado."
"O desembargador, na nossa opinião, deveria ter analisado a decisão também sob o enfoque da lei 9.656/98, que dispõe sobre os direitos dos usuários dos planos de saúde, bem como deveria analisar sob o prisma do Código de Defesa do Consumidor, já que estamos diante de uma pandemia e deve-se proteger os consumidores em relação às operadoras, uma vez que são situações que os colocam em desvantagem e em maior risco na relação", afirma Rosenbaum.
O especialista em direito do consumidor pondera que, como são exames caros, a prática de se exigir a testagem acaba se tornando muito onerosa às operadoras, o que pode levar a uma contrapartida de ajuste nas mensalidades dos planos.
"O jurídico está numa situação que segue o bom senso, mas, mesmo assim, o consumidor não pode ser prejudicado. Uma vez que o exame não está incluso, você prejudica o combate à disseminação da doença e as operadoras têm que atender a essa realidade."
Para o advogado, uma saída seria um meio termo entre a ANS e os órgãos de defesa do consumidor, de forma que fosse editada uma norma prevendo a cobertura do exame. "Ter essa uniformidade seria favorável até para evitar atolar o judiciário com ações individuais pleiteando a realização dos testes."
O que continua com cobertura garantida
- Desde março, os convênios médicos estão obrigados a cobrir o teste RT-PCR, que coleta amostras pelo nariz e pela garganta
- Esse exame, porém, não detecta infecções em estágio inicial ou depois da cura da Covid-19
Como é feito
- Os exames de material genético (RNA) ou “partes” (antígenos) do vírus (RT-PCR) indicam quem está doente no momento do exame
- Existem os testes que usam sangue, soro ou plasma e os outros que precisam de amostras de secreções coletadas das vias respiratórias, como nasofaringe (nariz) e orofaringe (garganta)
Atenção
- É obrigatório o pedido médico para realizar o exame pelo convênio ou de forma particular
O que está em discussão na Justiça
Exame de sorologia
- Atendendo a determinação judicial, no dia 29 de junho, a ANS (agência reguladora dos planos) tornou obrigatória a cobertura do teste sorológico para Covid-19
- Agora, porém, a própria agência reguladora conseguiu derrubar na Justiça a liminar que obrigava os planos de saúde a cobrir o teste sorológico
Recurso
- A Aduseps (Associação de Defesa dos Usuários de Seguros, Planos e Sistemas de Saúde), que foi à Justiça pedir a cobertura do exame, informou que vai recorrer
Como é feito
- Feitos com amostra de sangue, o exame faz a pesquisa de anticorpos IgA, IgG ou IgM que detectam a presença de anticorpos produzidos pelo organismo após exposição ao vírus
- Esse tipo de teste é indicado a partir do oitavo dia de início dos sintomas, segundo a ANS