Venezuelanos que fugiram da crise refazem a vida na capital
Vizinhos de brasileiros, imigrantes deixaram o país após sofrerem perseguições políticas e fome
Conteúdo restrito a assinantes e cadastrados
Você atingiu o limite de
5 reportagens
5 reportagens
por mês.
Tenha acesso ilimitado: Assine ou Já é assinante? Faça login
Em fuga da falta de alimentos, da perseguição política e sem perspectivas, venezuelanos começaram a chegar a São Paulo em 2016. E a partir de 2018, passaram a vir em maior número. Hoje começam a se estabilizar.
Não há dado exato sobre quantos venezuelanos vivem na capital paulista, mas um levantamento da Caritas Arquidiocesana de São Paulo dá uma ideia. Só em 2018, a entidade ligada à Igreja Católica realizou 773 atendimentos.
Já a Missão Paz, instituição católica que recebe e apoia imigrantes, calcula que ao menos 1.100 venezuelanos passaram pelo abrigo da entidade, no Glicério (centro) desde abril de 2018.
Segundo o padre Paolo Parise, diretor da Missão Paz, o número de venezuelanos atendidos é bem menor do que cerca de 22 mil haitianos que vieram para o Brasil entre 2010 e 2015. “A diferença é que o povo haitiano tem tradição em imigrar. Já o venezuelano, que era acostumado a receber imigrantes, tinha casa e carro, teve de largar tudo e deixar seu país. E chegam aqui com o rosto muito emagrecido”, afirma.
Padre Paolo ressalta que ao contrário dos haitianos, os venezuelanos chegam com documentos em ordem para buscar trabalho. “Em pouco tempo eles conseguem emprego em diversas áreas”, diz.
Quem não arruma emprego no mercado formal, acaba encontrando alternativas para se manter. É o caso do jornalista e professor universitário aposentado Raul Escalona, 73 anos, que chegou a São Paulo em outubro de 2018.
O que ele recebe de aposentadoria não é suficiente para pagar as contas, por isso ele e a mulher, Elvira, 65, ajudam o filho no preparo e na divulgação da comida venezuelana orgânica que eles fazem para festas e eventos. Nas horas livres, Escalona prepara uma peça de teatro sobre a vida de refugiado em São Paulo.
“Quero formar um grupo de teatro para que as pessoas compreendam as situações e os problemas dos refugiados no Brasil”, diz. “Tivemos um braço acolhedor aqui em São Paulo, mas sabemos que outros estrangeiros não tiveram a mesma sorte que nós, com emprego e moradia”, afirma.
‘Tenho que ajudar outras pessoas’, diz administradora
A administradora de empresas Carmen Torrealba, 45 anos, ainda enfrenta com amor a distância que separa o que ela teve que deixar para vir para São Paulo, em setembro de 2016.
Ela tinha uma vida estabelecida em Maracaibo, onde vivia com o filho e a mãe. Gerenciava uma rede de lojas, estudava direito e tinha casa própria e carro. Mas como num passe de mágica, em 2015, disse ter visto o governo tomar tudo.
“Tive de deixar tudo para trás e fui para Colômbia. Mas não deu certo e vim para o Brasil”, recorda Carmen.
Ela veio por conta própria, morou em um pequeno hotel na região central e trabalhou como ajudante em uma loja da rua 25 de Março.
Encontrou o apoio que precisava na ONG Migraflix, que auxilia refugiados. Aprendeu a cozinhar e hoje prepara e vende comida venezuelana para festas e eventos. Sua especialidade são as hallacas, espécie de pamonha com recheio de carne ou frango.
“Sinto uma dor ao ver meu país assim. Mas eu amo São Paulo. Agora tenho que ajudar outras pessoas”, diz ela, que mora com o neto, um sobrinho e aguarda a chegada de outro.
De carona, pai e filho chegaram ao Brasil
O venezuelano Juan José Velasquez Roja, 36 anos, chegou a São Paulo em 6 de abril de 2018, vindo de Boa Vista (RR), em um avião da Força Aérea Brasileira, com o filho Jhunior, 12 anos.
A decisão de deixar Isla Margarita, um paraíso no mar do Caribe onde vivia com a mulher e quatro filhos, foi tomada quando o mais novo, Germain, com pouco mais de 2 anos, foi internado com desnutrição.
De carona em carona, Roja e filho chegaram a Boa Vista. Por três semanas pai e filho viveram nas ruas da cidade e conseguiram embarcar para São Paulo. Menos de uma semana depois estavam no abrigo. “Fiquei impressionado com o tratamento das pessoas”, diz Roja, que ficou três meses na Missão Paz.
Tão logo conseguiu um emprego, alugou uma casa e trouxe a mulher, os três filhos, a mãe e uma irmã. Mas acabou perdendo o trabalho e todos voltaram ao abrigo.
Em novembro de 2018, Roja conseguiu um novo emprego em uma empresa que fornece equipamentos e máquinas para lanchonetes e padarias. “Comecei como ajudante. Agora trabalho como designer gráfico, minha profissão.”