No Dia de Finados, famílias de vítimas de Covid conseguem finalmente velar mortos

Devido ao risco de infecção, famílias impedidas de fazer velórios aproveitaram a data para realizar homenagens em São Paulo

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São Paulo

Para muitos dos parentes mortos pela Covid-19, esta segunda-feira (2), Dia de Finados, foi o primeiro momento em que foi possível prestar uma homenagem e se despedir com calma. Velórios, que têm de ser feito às pressas por protocolo sanitário, ou que até foram impedidos de ocorrer, acabam sendo realizados meses depois.

"Só agora estamos conseguindo nos despedir com calma", afirma a modelista Cristiane Marques, 40. Com o marido e o irmão, eles prestaram homenagens à mãe, Lenice Marques, que morreu há um mês, com 71 anos de idade, depois de 14 dias internada com a doença.

Esta foi a primeira vez que os três visitaram o cemitério da Vila Formosa, na zona leste da capital paulista, onde a idosa está enterrada. "Na época, foi só o reconhecimento do corpo. Foi ainda mais complicado [aceitar a morte], porque queríamos ficar mais tempo com ela, nos despedir melhor, mas não foi possível", diz Fábio Marques, 38.

Além da pressa para o enterro, os irmãos dizem, o dia foi ainda mais difícil porque eram muitos ao mesmo tempo. "Pode ver que, ao redor, são várias datas iguais à dela." Exatamente por isso, segundo Cristiane, eles resolveram visitar o local cedo da manhã, quando poucas pessoas estavam no cemitério.

Para Aparecida Fernandes, 56, ir ao cemitério São Luiz, zona sul da ciade, é uma forma de se sentir mais perto do marido, João Estrela. A última vez que o viu foi no meio de maio, quando deu entrada no hospital onde ficou internado por 20 dias, até que morreu pela Covid-19.

"Quando chegamos aqui no dia do enterro, não tivemos nem 10 minutos com ele, o caixão estava lacrado, eu não o vi. Sei que hoje, aqui, estão só os restos mortais dele, mas é uma visita ao homem que amei tanto, com quem passei 39 anos."

Devido aoi diabetes e à bronquite, Aparecida não voltou ao cemitério depois do enterro, pois também é grupo de risco para a doença. Ainda assim, não quis deixar de fazer a visita no Dia de Finados, como forma de se despedir com calma.

O motoboy José Roberto Macedo, 32, também não conseguiu se despedir do pai no dia do enterro, Sebastião Carlos, 60. Ele morreu em maio com a doença, depois de internado por 15 dias. "Foi muito ruim, muito difícil. Vir para cá [cemitério São Luiz] é uma chance de fazer isso."

Visitas no Dia de Finados

No primeiro Dia de Finados desde o início da pandemia, muitas pessoas buscaram horários alternativos para evitar aglomeração. Marlene Reis, 36, foi uma delas. Por volta das 8h30, a auxiliar de produção já deixava o cemitério da Vila Formosa depois de visitar os túmulos de parentes.

"Viemos cedo justamente para tentar pegar o espaço vazio e fazer isso com tranquilidade e segurança." Na entrada, teve a temperatura medida e recebeu álcool gel, e isso, diz, a deixou menos insegura.

Silvio Ramos, 48, também teve receio de ir ao cemitério São Luiz na data. "Tem muita gente aqui hoje. Quando cheguei, não tinha nem onde estacionar o carro." Ele diz que só ficou tranquilo depois de chegar à área dos túmulos, porque, na entrada, havia muita aglomeração.

Além dos cemitérios São Luiz e Vila Formosa, o Agora visitou, também, o cemitério Chora Menino, na zona norte. Nos três, funcionários mediam a temperatura de quem entrava e ofereciam álcool gel. O uso de máscara de proteção também era uma exigência.

Problemas

Mesmo com a necessidade de intensificar protocolos de saúde para evitar a disseminação do coronavírus num dia de movimento intenso, o cemitério São Luiz, zona sul, não tinha sabonete para lavagem de mãos nos banheiros por volta do meio-dia desta segunda.

A lavagem de mãos tinha que ser feita apenas com água, pois não havia dispensadores de sabão, tampouco papel. Enquanto esteve no local, a reportagem do Agora não avistou funcionários da limpeza para solicitar os insumos.

No cemitério Chora Menino, zona norte, havia sabão, água e papel, assim como no Vila Formosa, zona leste, onde havia, também, dispensadores de álcool gel distribuídos pela área de velório e equipe de limpeza a postos.

Na instituição da zona leste, havia bastante mato em torno dos túmulos. Alguns estavam, inclusive com o terreno cedendo.

Resposta

Questionada, a prefeitura, gestão Bruno Covas (PSDB), afirmou, em nota, que os banheiros dos cemitérios, inclusive do São Luiz, eram abastecidos a cada hora, e que "nenhuma reclamação chegou à administração quanto à falta de suprimentos."

Sobre o afundamento de túmulos, a prefeitura afirma que, na vistoria feita no local no fim de semana, não foi constatado nenhum caso do tipo.

"Na última semana todos os 22 cemitérios públicos intensificaram os trabalhos de limpeza. Como acontece periodicamente, os serviços de zeladoria foram devidamente executados, tais como corte de mato, poda de árvore e pintura", afirma a nota. A gestão não informou a estimativa de visitantes nos 22 cemitérios da capital.

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