Tecnologia ajuda idosos a lidar com isolamento na quarentena

Psicólogos afirmam que vídeo chamadas e mensagens ajudam a amenizar o distanciamento social

São Paulo

Quem poderia imaginar que a tecnologia iria preencher o vazio deixado pelo distanciamento social durante a quarentena para conter o avanço do novo coronavírus. Graças a internet e os aplicativos de mensagens e de vídeo chamada, pessoas do mundo inteiro, principalmente os idosos, têm se encontrado para matar a saudade dos familiares e amigos.

Idosos usam redes sociais para interagir com os amigos e familiares durante período de quarentena. Esse é o caso de Luzia Palopoli Rotta, 72 anos. - Rivaldo Gomes/Folhapress

É pelas telas do aparelho celular que a aposentada Luzia B. Polopoli Rotta, 72 anos, tem mantido o contato com as amigas da hidroginástica, das aulas de dança e também do carteado que costumava jogar todos os fins de semana. Isso sem contar as conversas com os irmãos, que são todos idosos, e com os filhos e netos.

“A gente se fala todos os dias pelo WhatsApp. Umas mandam piadas, outras, música. Tem coisa boa e coisa ruim. Mas eu só aproveito as boas. Ainda bem que a gente tem isso, né?”, afirmou a aposentada.

A última vez que Luzia se encontrou com as amigas Maria José e Rita para jogar tranca, comer bolo, tomar café e papear foi no dia 14 de março. Desde então, não sai mais do apartamento onde mora com o neto Victor, 21 anos. E faz mais de duas semanas que ela não vê a neta Helena, 6 anos. “A última vez que ela veio aqui só me olhou, mandou um beijo de longe e foi embora. Não me abraçou. Mas depois a minha filha tira fotos, faz vídeos dela e me manda”, afirmou.

Essa interação com amigos e com familiares pelo celular é importante e necessária para que idosos não se sintam ainda mais isolados, segundo psicólogos ouvidos pela reportagem.

O corretor de seguros Celso Felippe Anauate, 70 anos, deixou a sala no escritório e está trabalhando recluso em seu apartamento há pouco mais de dez dias. Antes da quarentena, ele costumava jogar futebol com os amigos aos domingos, se encontrava com outro grupo aos sábados e ainda se encontrava frequentemente com outros dois casais para comer pizza. Isso fora as reuniões familiares e com os filhos e netas.

“Sim, eu sinto falta de encontrar meus amigos. A gente tinha as nossas conversas e a resenha e a cerveja depois do futebol. Agora eu acordo, tiro o pijama e fico em casa. Chega sexta à noite e depois o sábado e continuo em casa só entre a gente [ele e a mulher]”, afirmou Anauate.

Mas Celso manteve ativo os grupos no WhatsApp e é por lá que conversa diariamente com os amigos e também mata saudades da neta Carolina. “A última vez que tive com ela foi no dia 14 de março, quando ela completou um mês. Agora o meu filho faz vídeo chamada pra gente ver como ela está. Só pelo celular”, disse.

Parabéns por vídeo

A aposentada Maria Perpétuo do Socorro Lima, 69 anos, tinha uma rotina agitada antes da quarentena: fazia ginástica duas vezes por semana, se reunia com as amigas do clube ou então com as senhoras da igreja.

Mas o que a dona Socorro não podia imaginar é que seu aniversário de 69 anos, completados no dia 24 de março, seria longe de todos esses amigos e familiares. “Meu filho me fez uma surpresa: comprou um bolo e fez uma vídeo-chamada para minha filha, que cantou parabéns a distância.”

Ela diz que está se sentindo “um pouco presa”, pois não sai à rua há mais de duas semanas. “Meu ritmo é totalmente diferente. Agora está muito mais restrito, mas entendo que temos que nos precaver.”

Todos na mesma situação

Psicólogos ouvidos pela reportagem disseram que manter contato com familiares e amigos, mesmo que seja pela tela do celular ou do computador, é uma forma de perceber que todos estão enfrentando o mesmo distanciamento social e que ninguém está sozinho.

“É muito importante manter esse contato [pelo celular]. É o que os idosos podem ter neste momento e é maravilhoso. Faz com que eles percebam que têm outros na mesma situação. E eles vão perceber que o grupo [no WhatsApp] é muito além do que o futebol ou a hidroginástica. É o que faz ter a sensação de pertencimento”, afirmou a psicóloga Dorli Kamkhagi, pesquisadora do Instituto de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP.

Para a psicóloga Silvia Cury Ismael, gerente do Serviço de Psicologia do Hospital do Coração, manter conversas ou chamadas de vídeo pelo celular é muito positivo para que o idoso não se sinta totalmente isolado. “Nas chamadas de vídeo as pessoas podem se olhar mesmo que seja pela tela, e isso é bom. A tecnologia vai amenizar a distância”, disse.

Segundo Dorli, esse tempo pode ser comparado ao luto, pois dá a sensação que a vida que vivíamos antes do distanciamento social nos foi roubada. “Por isso há um sentimento grande de frustração”.

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