Ferreira Gullar é imortal

Saiba porque o poeta maranhense Ferreira Gullar já havia se tornado imortal em 1976, 40 anos antes de se despedir da vida no último domingo

O poeta, crítico, tradutor e biógrafo Ferreira Gullar pode ter deixado o mundo dos vivos no último dia 4, aos 86 anos, vítima de uma pneumonia, mas, na verdade, já havia se tornado imortal muito antes de ter sido eleito para ocupar a cadeira 37 da Academia Brasileira de Letras, em 2014.

Um dos intelectuais mais importantes do nosso país, que se preocupava acima de tudo em compreender a alma e a existência humana, Gullar se eternizou ao compor "Poema Sujo" (R$ 32,90, 112 págs., José Olympio), sua obra-prima mais conhecida e ícone da resistência à ditadura militar. O poema foi publicado em 1976, na mesma época do livro de poesias "Dentro da Noite Veloz".

Fã de Carlos Drummond de Andrade (1902-1987) e de Manuel Bandeira (1886-1968), Gullar considerou as páginas de "Poema Sujo", com métricas e rimas inovadoras, uma resposta à onda de repressão na América Latina. Foi o período mais dramático de sua vida, quando esteve exilado, acusado de "subversão comunista".

Na obra, percebe-se a ânsia do poeta em tentar se expressar quando todos querem calá-lo, com a utilização, por exemplo, de recursos sonoros que remetem à angústia e à escuridão, revelando a sordidez da realidade humana. "Cheiros de umbigo e de vagina/ graves cheiros indecifráveis/ como símbolos/ do corpo/ do teu corpo do meu corpo", diz um trecho. As memórias desses anos estão registradas em "Rabo de Foguete - Os Anos de Exílio" (R$ 46, 272 págs., ed. Revan).

Já um outro lado da obra de Gullar que vale a pena ser conhecido é a biografia "Nise da Silveira: uma Psiquiatra Rebelde" (achado apenas em sebos), de 1996, feita a partir de uma longa entrevista do poeta coma célebre psicanalista junguiana brasileira. Nise (1905-1999) revolucionou os métodos de atendimento aos pacientes com transtornos mentais, até então tratados com lobotomia, eletrochoques e outros métodos agressivos.

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Vivian Masutti, 30 anos, é jornalista formada pela Cásper Líbero e bacharel em letras (português e francês) pela Universidade de São Paulo, onde também cursou a Faculdade de Educação e obteve licenciatura plena em língua portuguesa.