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A bola é um detalhe: Obrigado, fi!

As despedidas são parte inexorável da vida

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São Paulo

Quando chegou a Itaquera para assistir a seu primeiro jogo na casa nova do Corinthians, Reinaldo Raimundo estava tão emocionado que pensou que o viaduto do também novo complexo viário da região fosse parte do estádio. Ainda tentava entender onde estava no momento em que encontrou Tadeu, simpático e então atrapalhado dono de um bar ao lado da estação Artur Alvim do metrô.

"Ele estava penso. Já tinha tomado uns xinguá", diverte-se Careca, como é conhecido Raimundo, desde aquele instante cliente do Bar do Tadeu. "Ele falou: ‘Bem-vindo, fi, aqui você é convidado’. E eu falei: ‘Mano, achei meu bar, não troco’."

Muitos passaram por experiência semelhante. O boteco se tornou parada obrigatória para uma legião de fiéis que lá passaram a calibrar as expectativas antes de a bola rolar e a saborear o resultado após o apito final.

Nem os pôsteres do Palmeiras, que dividiam democraticamente a parede com os do Corinthians, incomodavam. E não adiantava sugerir ao alviverde Tadeu que tirasse as fotos dali ou questioná-lo se a decoração não poderia lhe causar problemas. "Fi, aqui tem 25 anos de piso, fi. Fica frio", respondia o baiano de Caculé, que dizia pegar onça na unha e lavar o rosto com pimenta.

No auge da pandemia, a Fiel teve de acompanhar seu amor a distância. E aqueles que se habituaram a ser bem tratados por Tadeu e por sua companheira, Nalva, precisaram ajustar a rotina. Pior, na volta, lamentavelmente, não encontraram Tadeu.

Torcedor após torcedor que chegava e perguntava sobre o palmeirense recebia da doce Nalva a notícia amarga: "Tivemos uma perda, fi, mas ele está feliz que você está aqui".

Nalva exibe homenagem preparada por clientes alvinegros, fãs do saudoso palmeirense Tadeu - Marcos Guedes/Folhapress

Itaquera está mais triste. Mas é preciso ir em frente, o que Nalva faz com amor, tratando a todos como quase filhos —ou "fi", em pronúncia idêntica à de Tadeu.

As despedidas são parte inexorável da vida. Este Agora também vai dando adeus. Com a licença de Tadeu e Nalva, parto e agradeço. Obrigado pela companhia até aqui, fi.

Tadeu de Souza Brito morreu aos 54 anos, em janeiro de 2021, após uma malsucedida cirurgia na vesícula biliar. Faz falta e merece a última homenagem deste verdadeiramente humilde espaço, cedido pelo generoso Gilvan Ribeiro.

Deixou Marinalva e os "fi" Maikon e Maiara, aos quais era muito apegado. Deixou também lições de tolerância e as pimentas com as quais lavava o rosto. Você pode prová-las na rua Doutor Luís Aires, 1.960.

Contribuíram para esta coluna de despedida Reinaldo Raimundo, o grande Careca, e João Luiz Ferreira Lebelenco, outro alvinegro que se encantou com a simpatia do alviverde que pegava onça na unha.

Os pôsteres do Corinthians continuam na parede do Bar do Tadeu, que ficou mais triste, mas ainda recebe com muito carinho - Marcos Guedes/Folhapress

Marcos Guedes

36 anos, é jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero e, como o homenageado deste espaço, Nelson Rodrigues, acha que há muito mais no jogo do que a bola, "um ínfimo, um ridículo detalhe". E-mail: marcos.guedes@grupofolha.com.br

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