Pais e professores reclamam de problemas nas aulas a distância em SP
Falta de celular, computador e internet são algumas das críticas ao novo método de ensino
Já é assinante? Faça seu login
Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:
Oferta Exclusiva
6 meses por R$ 1,90/mês
SOMENTE ESSA SEMANA
ASSINE A FOLHACancele quando quiser
Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.
O ensino a distância promovido pela Prefeitura de São Paulo e pelo governo estadual durante a pandemia de coronavírus é alvo de reclamação de pais, alunos e professores. Falta de celular e computador, internet, dificuldade no esclarecimento de dúvidas são algumas das críticas feitas por quem passou a ter aulas em casa durante a quarentena.
Uma das principais reclamações de professores e pais é que muitos alunos não têm aparelhos celulares ou computadores para esclarecer dúvidas e manter contato com professores. "A primeira questão foi de um pai que tinha três filhos e apenas um celular. Ele questionou como veria a plataforma com as três crianças e ainda tendo que trabalhar", afirma uma professora da rede municipal.
A educadora conta também que tem trabalhado muito acima da carga horária normal para ajudar os estudantes, usando aplicativo próprio de mensagem. "A grande maioria dos colegas não quer ter essa intimidade maior pelo WhatsApp, trabalhando somente pela plataforma oficial, até para não ter problema algum."
Outro professor da rede municipal ouvido pela reportagem disse que o que está acontecendo não é um ensino a distância, mas uma transferência de conteúdo. Diz também que as dificuldades de acesso à internet promovem desigualdade.
"A gente fica sabendo de famílias que foram obrigadas a aumentar o pacote de dados. Se elas têm que tirar do orçamento para pagar internet, já não é ensino gratuito e universal", diz.
Responsável por turmas do Fundamental 2, com classes formadas por adolescentes, o professor diz que a participação dos estudantes tem sido baixíssima. "No panorama geral, não temos mais que 10 acessos por sala de, aproximadamente, 30 alunos. Se no dia a dia, acompanhando e tirando dúvidas, já surgem inúmeras dificuldades, distante fica mais difícil."
Ele não concorda que a educação esteja se reinventando. "O aluno não consegue elaborar as dúvidas. O ano letivo deveria ser suspenso e, quando passar, veremos o será feito", diz.
Mãe diz que material não ajuda na alfabetização
Problemas também têm ocorrido na rede estadual, sob a gestão João Doria (PSDB). A líder de seção Antonia Rujani Ferreira de Oliveira, 36, afirma que a filha Ayla Rujani de Campos, que faz 7 anos nesta terça-feira (19), ainda não é alfabetizada e, mesmo assim, recebeu uma prova para ser feita até o próximo dia 25.
Ayla estuda na escola estadual Dr. Aniz Badra, no Parque Residencial Cocaia, no Grajaú (zona sul), e está no primeiro ano do Ensino Fundamental. “Eles deram material para apoio ao aluno na quarentena.
Mas minha filha não é nem alfabetizada. Deram uma prova para terminar até dia 25”, afirma Antonia. “Não vou fazer a prova por ela, senão o governo vai achar que foi minha filha, vai pensar que ela está alfabetizada”, diz.
Segundo a mãe, a criança apenas copia os cabeçalhos, sem saber o significado. “Ela veio de uma CEI, onde aprendeu o ‘a, e, i, o, u’ e a contar de 1 a 10. Hoje, ela fala todo o alfabeto, mas não sabe o que as letrinhas significam”, diz.
A líder de seção também destaca problemas pedagógicos para levar em frente a educação da menina. “Não sou professora e não sei como devo me comportar a respeito do aprendizado de uma criança. Tento fazer o melhor como mãe.”
'Atividades são insuficientes'
A auxiliar administrativo Fernanda Bianca da Conceição, 30 anos, afirma que as atividades disponíveis na rede estadual são insuficientes para que a filha consiga aprender da melhor forma. Júlia, 9, está no terceiro ano do ensino fundamental na escola estadual Presidente Tancredo Neves, em Heliópolis (zona sul).
“As aulas para ela acontecem das 10h30 ao meio-dia. São só 30 minutos de um conteúdo paralelo e o restante, desenho. Era para ser algo mais avançado”, afirma Fernanda, que lembra, ainda, que a internet na comunidade é de baixa qualidade e não são todos os pontos que pegam a rede de dados por celular.
A mãe da estudante diz também que o esclarecimento de dúvidas não funciona da forma adequada. “O chat demora de três a cinco dias para dar resposta”, diz.
Segundo Fernanda, a sua situação ainda é melhor do que a de outras moradoras. “A maioria da comunidade não tem impressora para imprimir as atividades. Aqui, em casa, já imprimi para outras três ou quatro mães”, afirma.
Ensino é prejudicado sem convívio
O professor de pedagogia da Universidade Presbiteriana Mackenzie Paulo Fraga da Silva afirma que o contexto atual deve ser usado para minimizar os danos de tanto tempo sem aulas. "A gente tem que partir do pressuposto de que haverá prejuízo. O contexto da relação do aluno com colegas e professores se perde com o distanciamento", diz.
Silva afirma que vê até com boa vontade as iniciativas de estado e município para manter alunos e professores mobilizados, mas diz que é fundamental que gestores resolvam alguns problemas como a dificuldade de conexão.
Sindicato quer mais recursos para alunos
Presidente do Sinpeem (Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo), Claudio Fonseca afirma que, em primeiro lugar, é necessário manter o isolamento social para manter a saúde alunos e professores. Explica, também, que vivemos um período fora do comum em decorrência do coronavírus e que estão sendo exigidos da prefeitura todos os meios e recursos para garantir o direito universal à educação.
“Quem não tem meios para ter conteúdo não pode ser prejudicado. O próprio professor que não consegue acessar as plataformas não pode ter desconto do ponto, por exemplo”, afirma.
Segundo Fonseca, 40% dos alunos da rede municipal não têm acesso à internet ou a equipamento adequado para a aprendizagem online. O presidente do Sinpeem diz que o sindicato defende o ensino presencial, mas que, diante das limitações, esse período deve ser usado para se manter o contato entre a escola e os alunos, até para evitar desistências no futuro.
“O sistema de ensino pode ser reorganizar para fazer o que é relevante após esse período.”
Resposta
A Secretaria Municipal da Educação, sob a gestão Bruno Covas (PSDB), afirma que já entregou mais de 1 milhão de materiais impressos via Correios, nas casas dos estudantes desde 13 de abril. “O material enviado traz explicações de como os pais podem organizar uma rotina de estudo para crianças, e também foca no material impresso atendendo assim as famílias que não têm como disponibilizar computadores, celulares e acesso à internet”, afirma, em nota.
Segundo a secretaria, os envios que não forem finalizados pelo Correio serão entregues nas escolas e as famílias serão comunicadas. A prefeitura diz que fará avaliação no retorno das aulas presenciais para definir estratégias.
O subsecretário estadual da Educação, Henrique Pimentel, afirma que a avaliação de meio de processo serve para ver como está a aprendizagem ao longo do ano.
“Não é obrigatória e nem vai contar como reprovação ou não. A gente enviou para a casa para terem como um exercício”, diz.
Segundo Pimentel, mais de 1,6 milhão de alunos acessam diariamente os centros de mídia, mais de 400 mil o Youtube e mais de 300 mil em redes sociais, além da TV aberta.