Dia dos Pais é data especial para famílias que venceram a Covid
Pais que contraíram coronavírus falam da luta contra a doença e comemoram data entre parentes
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O Dia dos Pais do ano passado foi ofuscado pela triste marca das 100 mil mortes por Covid-19 no Brasil alcançada um dia antes, no sábado 8 de agosto. Neste ano, em num contexto de avanço vacinal e diminuição do número de mortes e hospitalizações, a data será especial para quem venceu a infecção pela Sars-Cov-2.
Aos 67 anos, o metalúrgico aposentado Raimundo Luiz de Carvalho não imaginava que teria de vencer uma batalha muito mais mortífera do que o câncer de próstata, do qual ainda trata. “Ele ficou 20 dias intubado na UTI do hospital estadual de Diadema, com 70% do pulmão comprometido. Não tivemos um Natal festivo, apenas uma passagem de ano com alívio”, recorda a filha Alessandra Luiz de Carvalho, de 39 anos.
O baiano criado em Pernambuco diz que sente até hoje os efeitos da Covid-19. “Perdi muito peso e músculos das pernas. Fiz seis sessões de fisioterapia, mas ainda sinto cansaço.” Morador de Diadema, comemora a imunização com as duas doses da Coronavac e o retorno às atividades em seu pequeno restaurante. “Vou comemorar o Dia dos Pais assando sardinhas na brasa junto com meu pessoal.”
O técnico de enfermagem Wagner Paulo Ferreira, 53 anos, também relembra com emoção dos dois períodos pelos quais ficou internado com Covid-19. Da primeira vez foram 12 dias, em agosto de 2020. Já na segunda vez, oito dias de internação, em janeiro.
Casado há 37 anos, Ferreira relembra que nos dois momentos de internação viu pessoas morrendo ao seu lado, mas se apegou à fé cristã e à corrente de oração feita por amigos e familiares para superá-los. “Venci e passo muita positividade às pessoas que estão internadas na ala que eu trabalho”, conta o técnico de enfermagem.
Imunizado com as duas doses, o pai e profissional de saúde vai comemorar o Dia dos Pais com os filhos. “Vamos organizar um churrasco para comemorar e agradecer por tudo pelo que superei”, finaliza.
Pai curtirá a primeira data junto ao filho
Aos 51 anos, o comerciante Carlos Eduardo Sasaki Teixeira ainda estava a celebrar o nascimento de seu segundo filho quando começou a sentir os primeiros sintomas da infecção pelo novo coronavírus, que o deixou internado por 54 dias. "O Thalles Miguel estava com 21 dias quando fui internado", recordou.
No leito do hospital, Teixeira acumulou notícias ruins sobre sua saúde. "Estava muito debilitado, com máscara de oxigênio, quando comecei a sentir uma febre alta. Após exames, descobriram que eu peguei também uma bactéria. Depois, uma trombose pulmonar", conta.
Após 50 dias de internação, Teixeira começou a se sentar na cama e a caminhar pelo quarto. "Foi a pior coisa do mundo ficar sem os filhos e a namorada, apesar de ter sido muito bem tratado no hospital", relembra, com emoção, o comerciante de Guaianases.
Em casa desde o dia 15 de junho, Teixeira ainda precisa do auxílio de cilindros de oxigênio. O comerciante lembra que perdeu cinco amigos próximos, além de muitos conhecidos. "Vi pessoas morrerem do meu lado. A gente vê que a vida não vale nada. Hoje, dou valor para coisas mínimas, como o ver o Sol e tomar um banho."
E diz que será maravilhoso celebrar o Dia dos Pais, o primeiro com seu bebê. "Rezei muito para ter essa oportunidade de poder brincar, jogar bola, empinar pipa com ele, além de poder ver de novo a Francyelle, minha menininha de 28 anos, que mora nos EUA. Ela virá me ver no Natal." (NH)
É necessário respeitar a dor do outro
Para Leonardo Maggi Gambatto, especialista em Psicologia em Saúde e Coordenador do Núcleo Temático de Psicologia em Emergências e Desastres (NED) da subsede ABC do CRP-SP (Conselho Regional de Psicologia de São Paulo), o elemento comum a todos nesse momento é o sofrimento.
“Nem todos os pais sobreviveram a esse momento. Muitos filhos ainda estão vivenciando o luto, enquanto que outros podem celebrar. São rituais importantes, mas devemos celebrar de uma maneira inclusiva”, pontua o psicólogo.
Psicanalista e doutor em psicologia clínica, o professor do Mackenzie Eduardo Fraga lembra que a pandemia trouxe importantes mudanças nas relações afetivas e no convívio profissional. “No imaginário popular, a morte virou um tabu, ao ponto que não mais velamos nossos mortos em casa, como antigamente. Mas a pandemia nos lembrou de que somos mortais”, afirma.
Ainda de acordo com o psicanalista, o processo de hospitalização faz com que o indivíduo se depare com o que ele não gostaria de conviver. “Mesmo com todos os cuidados preventivos e com a vacinação, a possibilidade da internação ainda assusta muito a todos nós, ainda mais pelo fato da possível experiência da morte”, diz.
A dor e luto exigem um trabalho gradativo de superação, como num processo de cicatrização. “Penso que esse contexto mundial possa gerar algum tipo de solidariedade, com políticas públicas capazes de amenizar o sofrimento pelo qual estamos passando.” (NH)