Gesto da família de Gugu pode impulsionar doação de órgãos pelo país
Repercussão favorável sobre doadores na mídia sensibiliza a população, dizem especialistas
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O gesto de amor ao próximo da família de Gugu Liberato, ao permitir a doação dos órgãos do apresentador, que teve morte encefálica em decorrência de um acidente doméstico, nos Estados Unidos, pode impulsionar a doação de órgãos e tecidos espontânea no Brasil.
A fila de espera por um transplante no país, até 29 de novembro, tinha 38.338 pessoas. Deste total, 16.206 pacientes inscritos no sistema estadual de São Paulo à espera de um órgão.
O rim continua sendo o órgão que demanda mais procura por transplante. Somente no estado, são 12.441 pacientes (em média, 77% dos casos). As córneas são os tecidos mais esperados --2.665 pessoas que aguardam numa fila única do território nacional.
Segundo profissionais da saúde, quando o transplante envolve alguém famoso, a situação acaba resultando em um incentivo à doação.
O médico e coordenador da Central Estadual de Transplantes, Francisco de Assis Salomão Monteiro, 56 anos, afirma que, normalmente, a repercussão de situações de intensa comoção, como a protagonizada por Gugu, gera diminuição da recusa familiar, ainda o principal entrave na doação dos órgãos do parente com morte cerebral. "As pessoas acabam sendo mais favoráveis à doação a partir desses casos", diz.
No estado, segundo afirma o coordenador, em torno de 25% das pessoas negam a doação dos órgãos de um ente querido.
No caso de Gugu, o apresentador demonstrou ainda em vida a vontade de ser um doador. Exatamente o que outra vítima anônima proporcionou ao segurança alagoano Cícero Martins dos Santos, 50 anos, do Campo Limpo (zona sul), ao receber um fígado há menos de dez dias, após uma fila de um ano e um mês.
Santos está se recuperando no Hospital Estadual de Transplantes, onde recebe visitas da filha Sheila Freire Martins, 28 anos, e da mulher Zenaide Freire Santos, 54 anos.
Após tragédia, família doou órgãos de Eloá
A família de Eloá Cristina Pereira Pimentel, estudante assassinada aos 15 anos pelo ex-namorado 11 anos atrás em Santo André (ABC), na época, doou sete órgãos da adolescente que protagonizaria o cárcere privado mais longo do estado exibido em rede nacional.
Mãe de Eloá, Ana Cristina diz que quando tudo aconteceu ela era leiga no assunto. "Não sabia da importância da doação de órgãos nem que existiam pessoas em fila de espera", afirma.
A decisão, no entanto, viria quase 12 horas depois da morte cerebral atestada pela equipe do CHM (Centro Hospitalar Municipal), de Santo André.
Coração, fígado, pulmões, rins e pâncreas da adolescente foram doados para outros pacientes que aguardavam no cadastro técnico único. As córneas também foram retiradas.
'Um dia o telefone tocará, pode ser hoje ou qualquer dia
O coordenador de manutenção predial e elétrica Paulo Jacinto, 54 anos, atualmente afastado do trabalho por problema crônico de saúde e residente em Santo André (ABC), é um dos cerca de 12,4 mil pacientes do estado que aguardam por um transplante de rim.
Apesar da fila extensa e das três sessões semanais de hemodiálise com quatro horas de duração, Paulão, como é mais conhecido pelos amigos e familiares, se mostra confiante.
"Uma hora o telefone tocará. Pode ser hoje, amanhã ou um dia qualquer", diz Paulão, ao revelar que a espera causa angústia, mas não desanima.
Católico, o paciente demonstra sua fé: "A Mãe Aparecida me ajudará", confia, ao mesmo tempo em que acredita na conscientização das pessoas na importância do ato de doar um órgão.
Ao lado da companheira de todas as horas, a mulher e recepcionista Maria Rosa Meira, além dos sete filhos e 12 netos, o palmeirense faz questão de contar, com orgulho de avô coruja, do meia Kauã Jacinto, 17 anos.
"Ele [neto] é um dos destaques do Mirassol", afirma, referindo-se ao time do interior paulista que estreará na Copa São Paulo de Futebol Júnior, a Copinha, dia 3 de janeiro de 2020, contra o Linhares (Espírito Santo).
Enquanto Paulão espera pelo rim, outros transplantados de fígado se preparam para uma festa de confraternização no próximo dia 13, para compartilharem suas histórias de superação e gratidão.
Empresário descobre qualidade de vida após ter novo coração
Tudo começou com um infarte aos 31 anos em janeiro de 2013, três meses depois, duas paradas cardíacas e um AVC (acidente vascular cerebral) com 14 dias de coma. Desenganado pelos médicos, um padre foi chamado pela família para dar a extrema-unção no jovem comerciante de Lages (SC), quando o inexplicável aconteceu: Hugo Cesar Arruda voltou.
"Só pode ser Deus. Meu caso era irreversível, segundo os médicos", diz Arruda, hoje com 38 anos. Apesar do renascimento e da recuperação das sequelas do AVC com fisioterapia, o jovem mal sabia ainda o que viria pela frente tempos depois.
Novas complicações coronárias implicariam a colocação de marca-passo no hospital de Florianópolis (SC), o que ainda não seria o suficiente e o trouxe para São Paulo, a fim de passar com outros especialistas.
Entre idas e vindas de um estado para outro, Arruda perderia o chão em agosto de 2014. "O médico me falou que só um transplante de coração me salvaria. Fiquei desesperado", conta.
Ali, o comerciante entrava no 27º lugar da fila por um coração. No caminho da espera, vieram ainda uma embolia pulmonar e outro infarte.
Com a gravidade do quadro, seu caso virou prioridade na fila de transplantes.
A poucos dias do Natal de 2015, um jovem de 24 anos morria em acidente de motocicleta em Santo André (ABC). A família doaria os órgãos, entre eles, o coração, que desde então continua a bater, mas no peito de Hugo, que passou a levar a vida com mais qualidade depois de tantos sustos que tomou.