Testes de DNA viram febre e permitem encontrar familiares
Com a redução dos preços, exame é procurado por quem deseja descobrir mais sobre sua origem
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Descobrir sobre os antepassados ou até mesmo de predisposições a doenças genéticas por meio de teste de DNA era impensável há 15 anos por causa do custo elevado. Com a redução significativa dos preços, os kits de ancestralidade e de saúde, há tempos populares nos Estados Unidos, ficaram mais acessíveis no Brasil e viraram febre.
Foram essas as razões que atraíram a cantora Nathalia Valentini Lissa, a Nathy MC, 36 anos, a fazer o teste de DNA. Adotada, ela afirma que foi abandonada em um hospital no Paraná logo ao nascer e hoje, morando em São Paulo, deseja saber mais sobre si.
“Amo meus pais adotivos, mas com o teste quero saber de onde vim, entender algumas atitudes. O autoconhecimento é muito importante. Suspeito que tenha origem italiana”, conta a artista que fez o teste ni início do mês e aguarda os resultados.
A partir de R$ 199, é possível descobrir sobre a origem de no mínimo cinco gerações, encontrar parentes e detectar predisposição para doenças como trombofilias, câncer de mama, mal de Alzheimer e Parkinson.
Mas as histórias de descoberta da ancestralidade são as que mais atraem os clientes da Genera, empresa que tem uma clientela mais expressiva na faixa entre 20 e 60 anos. O teste já proporcionou diversos encontros, segundo Ricardo di Lazzaro, médico e sócio-fundador da Genera. “Temos histórias emocionantes de encontros inéditos de pessoas muito próximas.”
O que me levou a analista de marketing digital Nathalia Nóbrega e Silva, 22 anos, a fazer o exame de DNA foi para descobrir sua ancestralidade. Nascida na Itália, ela é filha de brasileiros que na época foram trabalhar na Europa, mas com um ano ela já passou a viver no Brasil. Nathalia conta que quando lhe perguntavam de onde vinha sua família, ela não sabia responder.
“Isso começou a me incomodar”, diz. “Aí vi essa tendência de descobrir a ancestralidade pelos influenciadores que eu seguia nas redes sociais. E como ninguém da minha família sabia muita coisa, decidi fazer.”
Antes do teste, ela acreditava ter ascendência italiana, mas descobriu que essa era a menor porcentagem de seu mapa genético. “Meus antecedentes são, em maioria, portugueses e espanhóis. E outra pequena parte asiática. Foi muito legal descobrir, valeu a pena.”
A professora universitária Luciana Rossi Cotrim, 60 anos, fez o teste um pouco antes da pandemia, porque tinha curiosidade em descobrir mais sobre seus antepassados, tentava fazer a árvore genealógica da família, e sobre questões de saúde.
Ela descobriu, como já desconfiava, que tinha parentes italianos e portugueses, mas se surpreendeu ao encontrar primos nos Estados Unidos e na Bahia. “Mantenho contato com eles até hoje.”
Luciana conta que encontrou até parentesco com os Matarazzo na Itália, em uma cidade chamada Castellabate. Ela, que escreve artigos sobre a origem imigrante da cidade de São Paulo, passou a montar sua própria história familiar. “É fundamental sabermos de onde viemos. Foi ótimo saber dos antepassados.”
Irmãs se encontram após 55 anos de separação
A bacharel em turismo Silvana Filomena Palumbo, 55 anos, descobriu uma família que nem fazia ideia que existia. Há dez anos, quando ficou sabendo que era adotada, começou sua busca pelos parentes sanguíneos.
Em 2014, ouviu falar do teste do kit DNA por uma amiga e fez, esperando encontrar alguém com código genético combatível, mas não houve "match". Cinco anos depois, em 2019, ela recebeu uma notificação da empresa de DNA Genera avisando que haviam encontrado um primo dela de segundo grau na Austrália, que também tinha feito o mesmo teste.
Ela enviou email a ele, já que este dado fica disponível se o cliente assim desejar, mas não teve resposta. No ano passado, um ano depois, ele respondeu. Silvana contou sua história, e o primo perguntou na família. Ele descobriu que sua tia-avó, Helena, que morreu em 2013, tinha dado uma das filhas para adoção (e a irmã mais velha sabia da existência da outra).
O primo, então, mandou um teste de DNA para Ivone Conti, 60 anos, a suposta irmã. O resultado confirmou as suspeitas: elas são meio-irmãs. “Foi emocionante”, diz Silvana. Agora, juntas, as duas começaram uma nova busca, desta vez por seus pais biológicos.
Todas as informações a seguir foram relatadas às duas por parentes, membros da família biológica.
Silvana descobriu com a nova família que sua mãe, Helena, estava em estado avançado de gravidez quando avisou ao pai, Sebastião, de sua condição. Segundo o relato familiar, o rapaz não quis reconhecer e negou ser dele a criança.
Na época, Helena tinha 36 anos e ele, que é pernambucano, 18. A última informação que a família tem é que esse rapaz trabalhava como garçom na Lapa (zona oeste de SP), desde a década de 1960, em um lugar chamado Bar do Ceará, que não existe mais.
Já Ivone descobriu que a mãe, Helena, teve um relacionamento com um caminhoneiro de Caxias do Sul, que passou por São Paulo. Ela sabe apenas que se chamava Armando, deve ter 92 anos atualmente e que tinha olhos azuis, como os dela.
Por volta das décadas de 1960 e 1970, ele morava em Pirituba (zona norte de SP), ele mas foi embora antes de saber da gravidez. Oito anos depois, ele voltou à capital paulista, perguntou de Helena (a mãe dela) para um amigo em comum e descobriu sobre a criança. Segundo ela soube por parentes, o caminhoneiro quis reconhecer, mas a família dela não deixou, o que a deixa bastante chateada, afirma. Ele tinha família e 3 filhos, e a mulher dele descobriu a tentativa dele de assumir a menina.
Ivone diz que gostaria muito de poder encontrar seu pai com vida e até mesmo possíveis irmãos e outros parentes. Ela diz ser muito grata à Genera, laboratório que lhe permitiu encontrar sua irmã Silvana, de quem ela diz não desgrudar mais. "Graças ao teste, preenchi um vazio no meu coração ao encontrar minha irmã. Espero ter o mesmo final feliz com meu pai."
Teste detecta doenças genéticas, mas especialistas aconselham cautela
De acordo com os dados mais recentes da MIT Technology Review, revista do Instituto de Tecnologia de Massachusetts, 26 milhões de pessoas fizeram testes com kits DNA no mundo todo até 2019. A expectativa da Genera é que esse número tenha ultrapassado 30 milhões.
O psicólogo Yuri Busin, diretor do Centro de Atenção à Saúde Mental - Equilíbrio, afirma que indivíduos, em um geral, têm muita curiosidade em saber de onde elas vêm. “Isso pode ser positivo, mas esse não pode ser um fator determinante para o futuro da pessoa.”
A médica geneticista Iscia Lopes Cendes, professora titular de genética médica e medicina genômica da Faculdade de Ciências Medicas da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), concorda. Ela cita, mais especificamente, os testes com objetivo de detectar propensões a doenças genéticas.
“É aconselhável fazer exames desse tipo apenas com indicação médica, pois as informações genéticas são complexas. Tudo isso para evitar despertar pânicos desnecessários”.
Já Rogeria M. Ventura, professora do curso de Biomedicina do Centro Universitário FMU, acredita que os testes do kit DNA podem servir como um pré-diagnóstico para doenças herdadas dos pais e, ainda, ajudar o paciente a ter mais precisão no tratamento e no tipo de exames que terá que fazer ao longo da vida.
“São confiáveis porque são encabeçados por cientistas, médicos desse meio. É possível, sim, detectar risco de doenças genéticas, especialmente àquelas pessoas que têm histórico familiar. E, ainda, ajudam a parentes desconhecidos.”
Banco de dados
O banco de dados para conectar parentes por meio desses exames com kits DNA não é grande, ainda. Para um parente ser encontrado, é preciso que as duas partes tenham feito o exame pela mesma empresa. Do contrário, pode não haver “match”.
“O banco de dados cresce a cada dia. E a tecnologia é capaz de entregar conteúdos valiosos, em especial relacionados a doenças”, explica o médico e geneticista David Schlselinger, CEO do meuDNA, outra empresa que vende kits DNA.
O CEO destaca o exame “bochechinha”, feito para detectar doenças genéticas em crianças. Ele conta que na empresa meuDNA há diagnósticos infantis quase todos os dias. “Nosso teste rastreia mais de 300 doenças graves em bebês, mas que podem ser tratáveis se descobertas a tempo. O teste do pezinho tradicional abrange um número bem menor de enfermidades.”