Voltaire de Souza: Duas botas de cano alto

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Voltaire de Souza

Frio. Vento. Garoa.
O inverno chega com tudo.
As paulistanas já sabem.
Tempo de enfiar a calça no cano da botinha.
Sentado na calçada, Fergusson apreciava o movimento.
—Festival da elegância…
O morador da rua era sensível aos encantos femininos.
—A brasileira não tem igual.
Ainda havia aguardente na garrafa.
—Isso aqui dura até amanhã.
O comércio ia encerrando suas atividades.
—Opa. Não quero perder o jogo de vôlei de praia.
A vitrine de uma loja apresentava excelentes modelos de televisor.
—Feminino, é claro.
Fergusson tinha claras preferências.
—Não estou aqui para ver sovaco peludo.
É o Brasil em Tóquio.
—Talento total.
Mas as adversárias eram respeitáveis.
—Da Letônia. Gatíssimas. Altas pra caramba.
Chegou a noite.
Veio um calor estranho.
—Ué… parece verão.
O rapaz se sentiu transportado para Tóquio.
Uma figura gigantesca apareceu.
—Caramba… é a jogadora da Letônia?
O vulto chegou mais perto.
Botas. Barba preta. Pegando fogo.
Era a estátua do Borba Gato.
—Sai, capeta. Que eu quero mulher.
Os sonhos são olímpicos.
Mas a tocha, por vezes, está mais perto.

Estátua de Borba Gato, em Santo Amaro (zona sul de São Paulo), após ser incendiada - Danilo Verpa/Folhapress

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