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'Status da vacina' é divisor de águas na paquera pelas redes sociais

Jovens utilizam vacinação como critério para ir a encontros ou iniciar relações

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São Paulo

Em tempos de máscara, álcool em gel e distanciamento social, a dinâmica da paquera e do flerte virtual está diferente. Novos critérios de relacionamento surgem para garantir que a pessoa do outro lado da tela também toma os devidos cuidados em relação à pandemia de Covid-19.

A vacinação se tornou não só um importante tópico de conversa, mas também um divisor de águas nas relações interpessoais online. "Percebi é que a carterinha de vacinação é o novo nude", divertiu-se a apresentadora Titi Müller em entrevista ao UOL na última semana.

Foi pensando nisso que o acadêmico de direito Diego Henrique Gomes, 23, colocou sua foto com o comprovante de vacinação em seu perfil de um aplicativo de relacionamentos há algumas semanas, logo após ter tomado a primeira dose.

"De certa forma, ao ver meu perfil, você já sabe que eu não sou negacionista. E eu também já consigo saber que a pessoa em que estou dando like não é negacionista também", explica.

Ele esclarece que não tem vontade de se envolver com pessoas que negam fatos sobre a pandemia ou que acham que a doença é uma bobagem. Por isso, sinalizar em seu perfil que acredita na vacinação é uma maneira de filtrar as relações.

Diego Henrique Gomes, 23, usa sua foto com o comprovante de vacinação em seu perfil do Tinder. - Ronny Santos/Folhapress

Segundo Gomes, a estratégia também gera conteúdo para conversar. "Dá para mandar um emoji de jacaré, um meme ou uma cantada referente à vacina", conta rindo. "Tudo vira assunto. Falar sobre a situação, perguntar se teve efeitos colaterais da vacina ou se pegou a doença em algum momento."

Desde quando começou a utilizar aplicativos de relacionamento, ele não marcou encontros presenciais e diz que só pretende fazê-lo após tomar a segunda dose da vacina. "Não só para me proteger, mas por uma questão de responsabilidade, mesmo", esclarece.

A estudante de medicina Carolina Ribeiro, 22, usa aplicativos de relacionamento desde novembro de 2020. "Parei de usar por um tempo, quando atingimos marcas exorbitantes de mortes. Agora, que estou completamente vacinada, voltei a usar e ir a encontros", relata. Por ser da área de saúde, vacinou-se em maio e tomou a segunda dose no fim de julho.

Ela conta que, em agosto, começou a ver muita gente colocando o "status da vacinação" no perfil dos aplicativos de relacionamento, o que fez com que ela adicionasse "100% vacinada" na descrição do seu. "Acredito que acaba juntando um perfil de pessoas que se importam com a saúde pública e com como a pandemia se encontra", diz.

Para Carolina, é mais interessante ter encontros assim. "São pessoas que querem sair, mas querem sair a lugares que sigam os cuidados, tenham distanciamento... Isso gera confiança entre ambas, já que não se conhecem", argumenta.

A estudante relembra a vez em que "desfez o match", ou seja, tirou sua confirmação de interesse em alguém que pensava diferente sobre a vacinação. "Uma pessoa falou que não queria tomar, porque achava que era uma questão individual e eu não concordava. Vacina é questão de saúde pública", defende.

Mesmo em busca de paquera, algumas pessoas preferem preservar a saúde, explica Sofia Menegon, consultora e especialista em relacionamentos. Para a profissional, as mudanças trazidas pela pandemia vêm para ficar, seja em relação aos critérios de interesse ou no formato do flerte virtual.

“Diante de um momento em que todo mundo está mais vulnerável, a gente teve a oportunidade de aprender bastante sobre o que não queremos para nós mesmos. Uma parcela da população vai ficar bastante criteriosa em relação aos relacionamentos e eu acho isso bastante positivo”, argumenta Menegon.

Encontros só depois da 2ª dose

Em meio à pandemia, os encontros presenciais trazem um risco de contaminação que nem todos estão dispostos a correr. É o que conta o analista financeiro Vinicius Dragone, 26, usuário de aplicativos de relacionamento.

Após dois dias conversando com uma menina virtualmente, ele a convidou para um encontro. "Ela quis saber se eu já tinha sido vacinado e com qual vacina. Quando eu respondi que tinha tomado a segunda dose, ela deu 15 dias para a gente poder marcar de sair", relata.

Agora, ele espera o período de 15 dias, tempo médio para o corpo produzir anticorpos após a vacinação, para poder encontrá-la.

"Teve outra menina que, quando nos encontramos, começou a falar que não ligava para a pandemia, que não tomou vacina", diz Dragone. Segundo ele, isso fez com que ele cortasse as relações virtuais com ela e nunca mais marcasse outros encontros.

As doses da vacina também são ponto importante para a estudante de ciências sociais Aleixa Gomes, 23. No Tinder, ela deu "match" com um menino que estuda na mesma faculdade que ela, a Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro.

"Começamos a conversar, mas não sabia se ele ia querer fazer algo, se estava saindo de casa ou como estava com essa questão da pandemia", conta. Assim, os dois falaram sobre vacinação e descobriram que estavam tomando medidas e cuidados semelhantes. Ela conta que o encontro está confirmado para depois da segunda dose de ambos.

Para Aleixa, é preciso considerar essas questões para se relacionar com alguém neste momento. "Desde o início da pandemia, eu não estava saindo, vendo pessoas e, consequentemente, não estava saindo com outras pessoas. Ficamos meio receosos por não saber como o outro está levando, principalmente nesse contexto de negacionismo", explica.

Aplicativos tomaram iniciativa

Além dos usuários adotarem critérios de interesse virtual, as próprias plataformas de relacionamento criaram maneiras de incentivar a imunização contra Covid-19 no Brasil.

O Tinder, o aplicativo de relacionamentos com mais downloads do mundo, criou adesivos para os membros divulgarem e estimularem a intenção de se vacinar. Os adesivos são adicionados no perfil e contam com frases como "Vacinas Salvam Vidas", "Dose 1 ok", "Vou Tomar a Vacina" e "Imunização".

Também há banners educativos e, na área denominada "Central de Vacinação", os usuários podem ser direcionados às páginas dos sites dos governos estaduais para obterem informações oficiais sobre as datas e locais para imunização mais próximos.

Segundo o Tinder, em julho de 2021, à medida que a vacinação avançava no país, as menções nas biografias dos perfis a “vacinado” cresceram seis vezes, e a “vacinada”, cinco vezes. Já em agosto, as menções a “imunizado” nas bios do Tinder cresceram 300%, e o uso de imunizada foi 280% maior.

Outro aplicativo de relacionamento, o Bumble, também adotou novas ferramentas com a pandemia. Na ferramenta, há um campo de “Preferências sobre a COVID-19”, no qual o usuário pode informar se prefere ter encontros virtuais ou presenciais e se quer por chamada de vídeo ou áudio.

Desde julho, conta com o selo de vacinação, que é inserido no perfil para que os usuários possam mostrar quando estiverem imunizados. "Todas essas ações fazem parte do objetivo de apoiar e incentivar nossa comunidade a se vacinar, para que em breve possam voltar a se encontrar pessoalmente", informa o Bumble.

Vacina demonstra valores e identidade

Para especialistas, a vacinação e o cuidado em relação à pandemia se tornaram critérios importantes nas relações interpessoais.

O psicólogo Ricardo Milito cita a polarização de opiniões como fator nesse contexto. "A vacina se tornou algo muito além de uma forma de proteção e, hoje, ela é vista como um ato político", explica.

Segundo ele, o comportamento dos jovens contribui para criar dois extremos, que preferem se relacionar apenas com aqueles que pensam da mesma forma. "De um lado, jovens fazendo festas, indo para as ruas e não respeitando as normas do isolamento, e, do outro, jovens respeitando bastante o isolamento, preocupados e lutando pela vacina", diz.

Milito argumenta que há uma questão de valores e identidade envolvida no ato de expor a vacinação em aplicativos de relacionamento ou redes sociais, para além da saúde. "Isso está sendo verbalizado e exposto através das fotos, deixando claro: 'eu sou vacinado e só saio com quem já tomou vacina'", complementa.

A psicóloga Osmarina Vyel faz uma analogia aos anos 1980 e 1990. "É assim como aconteceu na época do auge da Aids, em que as pessoas só saiam quando a outra apresentava um exame negativo para o vírus", relata.

"É uma maneira de expor para não ter que lidar com aquilo ao iniciar um relacionamento mais íntimo. Inconscientemente, as pessoas fazem isso para deixar claro algo como: 'se você optou por não tomar vacina, não precisa nem chegar perto, porque eu não quero'", argumenta a profissional.

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