Idosos que já tomaram a terceira dose se permitem sair para dançar e viajar

Especialistas, no entanto, indicam bom senso para aqueles que estão retomando as atividades

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São Paulo

Frequentar restaurantes, ir a bailes, dirigir, frequentar aulas presenciais de pintura e, se possível, até um “binguinho”.

Essas são algumas das atividades que pessoas acima de 70 anos estão retomando após a terceira dose da vacina contra a Covid-19. Segundo dizem à reportagem, a dose de reforço dá mais coragem e segurança para começar a realizar atividades que estavam paralisadas devido à pandemia do novo coronavírus.

Alunas do ateliê da artista plástica Ivani Ranieri voltaram às aulas de pintura presenciais - Rivaldo Gomes/Folhapress

Pela primeira vez em um ano e meio, Edair Borborema, 89 anos, saiu nesta quinta-feira (30) para ir ao barbeiro aparar as madeixas que ele mesmo cortava durante a pandemia. “Agora estamos um pouco mais tranquilos, até já cumprimentei alguns amigos e conhecidos da época em que eu era vereador em Osasco. Fui muito popular por lá”, afirma.

Edair é uma das 133.932 pessoas com 70 anos ou mais que já tomaram a dose de reforço na cidade de São Paulo, 76,9% do total previsto, de 174.198 pessoas. Segundo os números da própria prefeitura, mais de 40 mil pessoas nessa faixa etária e que já poderiam ter tomado a dose de reforço ainda não apareceram.

O ex-vice presidente da Câmara Municipal de Osasco e que hoje mora no Alto de Pinheiros (zona oeste de SP), diz que corta o cabelo há 43 anos no mesmo barbeiro. Ele já tomou a dose de reforço há mais de 15 dias, o que lhe deu a coragem para pegar o carro, sair de casa e rever o amigo de décadas.

Farmacóloga e ex-reitora da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo), Soraya Smaili, afirma que o momento é de transição. “Entendo que nós estamos num momento em que você não pode dizer nem sim e nem não. Ainda não dá pra dizer, ‘vai, tenha vida normal’, e não é o caso também de dizer ‘fique trancado em casa’. É preciso ter bom senso e discernimento”, afirma a também coordenadora dos centros de Saúde Global e do Centro Sou Ciência.

Bom senso é a palavra de ordem para a mulher de Edair, Filomena, 75. Esperançosa para tomar a sua dose de reforço, na próxima terça-feira (5), ela diz que os dois vêm mantendo todos os protocolos necessários mas que têm planos assim que estiver imunizada. “Vamos fazer uma viagem de carro no final do ano”, diz. Com Edair ao volante, lógico.

Alguns, embora se mostrem esperançosos, ainda não estão totalmente tranquilos a ponto de mudar a rotina. É o caso de Maria Helena Auliciano, 86, de Santos (Baixada Santista). Já imunizada com a dose de reforço, ela afirma que continua vigilante e mantém todos os protocolos.

“Como eu sei que ainda tem as outras cepas, fico sempre prevenida”, afirma.

O máximo que se permitiu foi chamar um Uber para ir ao médico nesta semana. “Nem os meus próprios filhos estão vindo em casa, não estamos nos reunindo e estamos precavidos. Estava há muito tempo sem usar o Uber”, diz.

“É preciso lembrar que para toda e qualquer vacina a imunização não é imediata. E não há cobertura de 100%, independentemente da idade. A população acima de 60 anos pode e deve voltar desde que com cautela. Isso quer dizer que máscara, higienização das mãos e distanciamento precisam ser mantidos”, afirma a gerontologista Rachel Cardoso.

Já sabendo que tomaria a terceira dose da vacina contra a Covid-19 nesta quinta-feira (30), Maura Sebastiana Ferreira de Melo, 79, moradora de Ibirá (410 km de SP), arriscou antes e decidiu fazer uma viagem curta para Serra da Canastra, em Minas. Diz que pretende realizar novas viagens e, como gosta de balanço, não vê a hora de sair de casa para brincar e se reunir com as amigas para um bingo. “Aqui em Ibirá não começou nada ainda. Eu gostaria demais, eu adoro, a gente distrai a cabeça. É bom demais ver amigos para distrair um pouco”, disse.

Em São Paulo, o Creci (Centro de Referência da Cidadania do Idoso), localizado no centro da capital, vem retomando as suas atividades gradativamente desde julho. Dos 400 idosos atendidos ali, 200 já retomaram as atividades presencialmente nas oficinas que buscam estimular a participação social dessa faixa etária, segundo a Smads (Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social). Os demais são atendidos de forma remota.

Cautela

Corintiano roxo, João Inocentini, presidente do Sindnapi (Sindicato Nacional dos Aposentados, Pensionistas e Idosos), já retomou as viagens de trabalho. Apesar de já estar imunizado com a terceira dose da vacina contra a Covid-19, ele diz que não pretende tão cedo voltar a frequentar os jogos do Timão.

“Estou louco para o meu Coringão ganhar na Arena. Mas ainda não é o momento e precisamos evitar o máximo possível. Voltei a viajar para fazer as assembleias do sindicato, com todas as regras estabelecidas como pouca gente, máscara, distanciamento. Ainda não é tempo de relaxar”, diz.

Aluna de pintura do Ateliê Ivani Ranieri, Yara Martha Finkelstein, 79, moradora de Higienópolis (centro), afirma que já vinha se permitindo ter aulas presenciais de pintura, o que irá reforçar agora após ter tomado a terceira dose.

“Pretendo vir em mais aulas [presenciais], voltar a fazer fisioterapia, que eu diminuí muito, e o trabalho voluntário. Ainda não dá para dizer que voltei ao normal, mas agora tenho mais coragem para retomar algumas atividades”, afirma.

Ivani, a dona do ateliê, afirma que continua a exigir todos os protocolos, sobretudo o uso de máscaras. “Atendo sempre poucos alunos, só é permitido cumprimentos entre elas com os cotovelos e sempre estão de máscara e usam álcool em gel”, afirma.

Máscara

Segundo a gerontologista Rachel Cardoso, o isolamento social se transformou em distanciamento afetivo e isso pode trazer graves consequências para essa população.

“A socialização do idoso é um dos pilares da longevidade ativa, que preconiza os aspectos biopsicossocial para o bem-estar e qualidade de vida dessas pessoas. Isso porque atividades sociais, culturais e educacionais mantêm o idoso ativo e geram sentimento positivo, o que evita a depressão”, afirma.

Soraya Smaili, farmacóloga e ex-reitora da Unifesp, afirma que o item principal é a máscara. E de preferência duas, sendo uma delas a cirúrgica, descartável, preferencialmente debaixo de uma outra, que pode ser de tecido.

“É fundamental, não podemos nem pensar em retirar. Se a pessoa entrar em um ambiente e perceber que alguém está com máscara mas com o nariz descoberto, pode e deve chamar a atenção. Eu mesma já ouvi coisas do tipo ‘mas eu já estou vacinado’, e sabemos que nenhuma vacina é 100%”, diz.

Smaili reforça a necessidade de todos aqueles que estão com a segunda dose da vacina contra a Covid-19 em atraso que se imunizem o quanto antes.

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