Factoide nos combustíveis

Por mais maluca que seja, a fala de um presidente sempre terá enorme capacidade de pautar o noticiário e o debate público. Jair Bolsonaro testa os limites desse poder todos os dias.

O último factoide foi uma espécie de desafio aos governadores pelo fim da tributação dos combustíveis. "Eu zero o [imposto] federal se eles zerarem o ICMS", soltou o presidente na quarta (5), como se estivesse em uma mesa de bar.

Trata-se de um absurdo completo. Eliminar o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços na gasolina e no óleo diesel teria um impacto na arrecadação perto dos R$ 90 bilhões ao ano.

Justiça seja feita: a confusão já havia começado quando 22 dos 27 governadores assinaram uma carta, na segunda (3), defendendo o corte de tributos federais sobre os combustíveis --o que representaria uma perda também assustadora de cerca de R$ 28 bilhões anuais.

Nos dois casos, abrir mão de toda essa grana seria uma irresponsabilidade suicida para o já sofrido setor público. 

Sabe-se que impostos e contribuições sociais respondem por 44% do preço da gasolina --um percentual alto, sem dúvida. Mas não é um caso isolado: nosso sistema tributário pega pesado com o consumo de bens e serviços, o que prejudica principalmente os mais pobres.

É fundamental reduzir o peso dos impostos sobre o custo das mercadorias, mas medidas assim precisam ser compensadas com aumento de outras receitas ou cortes de despesas. Uma saída seria taxar mais os que ganham mais.

A presepada de Bolsonaro, que talvez agrade a seus aliados caminhoneiros ou ajude a desviar a atenção sobre problemas de Brasília, só atrapalha o já confuso debate tributário no seu governo.

O presidente Jair Bolsonaro, durante entrevista coletiva para falar sobre o coronavírus, no Palácio da Alvorada - Pedro Ladeira - 31.jan.20/Folhapress

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