Vacinados, mas com cuidados, idosos começam a voltar à ativa

Protocolos como a máscara, o uso de álcool em gel e o distanciamento ainda são indispensáveis

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São Paulo

Depois de um longo período de incertezas e, em alguns casos, verdadeiro enclausuramento, a vacina deu mais segurança para que muitos idosos retomassem suas atividades nos últimos meses, como em cursos ou no convívio em grupos da mesma idade. Embora mais protegidos, aqueles que já foram imunizados devem manter cuidados, segundo especialistas.

Na manhã da última quinta-feira (22), o Centro Dia da Penha, em Artur Alvim (zona leste), inaugurado em junho, foi o local de encontro de dez idosos que, já vacinados, puderam participar de uma oficina de musicoterapia, sob o sol de inverno, em um pátio aberto.

A unidade é uma das 19 da capital paulista que recebem as pessoas da melhor idade somente durante o dia para as mais diversas atividades —diferentemente de um asilo, elas retornam para suas casas. Para participar, a família ou o próprio idoso devem procurar o Creas (Centro de Referência Especializado de Assistência Social) de sua região.

Idosos voltam às atividades presenciais do CDI de Artur Alvim - Ronny Santos/Folhapress


“Tomei a primeira [dose], a segunda, não deu reação, não deu nada. Acabou o medo de pensar assim ‘vou ficar doente’. Estou reforçada”, diz a dona de casa Adelita José dos Santos Souza, 96 anos. Sobre as atividades no CDI, é das mais entusiasmadas. “Fui a primeira a entrar aqui. É um pedacinho do céu”, completa.

O “pedacinho do céu” de Adelita é dividido com outras pessoas na zona leste. É o caso do pintor e eletricista Edélcio Aparecido dos Passos, 71, que perdeu dois conhecidos para a Covid-19. Um “andante” que passava a noite na rua e chegava só pela manhã, ele teve que se recolher durante a pandemia. Agora, já tem mais confiança. “Podendo conversar com as outras pessoas, ter a liberdade”, diz.

Cuidados

Porta-voz da área técnica de Saúde da Pessoa Idosa da prefeitura, Lilian de Fátima Costa Faria afirma que a vacina não evita que a pessoa seja contaminada ou que transmita o vírus, por isso é importante que mantenha o uso de máscara, álcool em gel e distanciamento. “Não adiantou nada? Adiantou sim, porque impede que vá a óbito ou precise de um leito de UTI em um hospital. Pode circular? Um pouco mais, mas com o cuidado de manter máscara, higienização frequente das mãos. Precisa continuar se protegendo”, diz.

Medo de contaminação ainda é grande


Coordenadora de Grupos da Maturidade da FMUSP e mestre em Gerontologia, Dorli Kamkhagi afirma que a retomada tem sido muito lenta e que muitas pessoas ainda se sentem inseguras, depois de mais de um ano de pandemia. “Os mais idosos ainda não se sentem tão seguros. Querem ver o que vai acontecer”, diz.

Segundo a especialista, as pessoas estão reaprendo a viver socialmente. “É um aprendizado, porque se ficou tanto tempo afastado que, muitas vezes, vê o outro como aquele que vai trazer uma doença”, diz.

Aumento do uso de drogas e de álcool foram algumas das consequências do isolamento prolongado. “Danos emocionais, funcionais e psicológicos. As pessoas se sentiram afastadas, muito sozinhas, sem ter com quem trocar, achando que era um jeito de preservar a vida. Tem uma falta dos estímulos ativos e vivos”, afirma.

O receio atinge até a manutenção dos cuidados médicos no dia a dia, segundo a geriatra Maysa Seabra Cendoroglo. “Mesmo imunizados, eles têm tido muito receio da contaminação. Têm evitado sair e, mesmo para ir a consultas, procuram retardar ao máximo. Alguns, inclusive se recusam”, diz.A geriatra também viu os danos se multiplicarem. “O isolamento trouxe uma impossibilidade de interações afetivas e isso acaba sendo um fator que pode piorar ou desencadear quadros depressivos”, diz. (WC)

Retomada exige atenção especial aos sintomas


A vacina também tem significado mais segurança no contato com a arte para muitas pessoas que já passaram dos 60 anos. Elas já se permitem algum nível de contato social, com mais tranquilidade. Professora de educação física e já aposentada, Paula Aglae do Amaral, 63 anos, procurou no ano passado a Braapa Escola de Atores, que tem uma turma voltada para a população de mais idade.

“Tinha feito duas aulas, mas eles fecharam”, afirma. Em agosto, com novos protocolos de segurança, se sentiu à vontade para participar do curso novamente. A vacina, porém, trouxe uma sensação de mais liberdade. “Principalmente, a parte social. De poder encontrar as pessoas, voltar a frequentar um restaurante”, diz. Apesar disso, faz ressalvas. “Parece que acabou, mas aí falam morreu um tio, um primo. Não acabou ainda.”

Diretor e professor da escola, o ator André Bravo Valente diz que os protocolos são seguidos à risca, fora as recomendações para os alunos. “Você sentiu qualquer coisa, não venha para a escola e faça o exame. O pessoal tem respeitado”, diz.

Professora de aquarela, Serena Garcia, 79, deixou de dar aulas presenciais na pandemia, mas já ensaia uma retomada. “Dava aula aqui em casa para 12, e hoje voltei a receber uma”, conta.Serena diz que os primeiros meses de pandemia foram de um “pavor súbito”.

“Comecei a sair só para o carro não perder a bateria”, diz. Ela continuou a ver os netos no período crítico, mas separadamente. A vacina trouxe mais afeto ao dia a dia. “Depois da vacina comecei a ver os quatro netos juntos, tenho ido ao shopping com amiga. Faço todo dia musculação na minha casa, com professor.” (WC)

‘Dá uma esperança’, afirma atriz da Globo


A atriz Lu Grimaldi, 67 anos, tomou a vacina, já está gravando a nova novela das seis da TV Globo, mas diz que a preocupação ainda é grande. Durante a pandemia, chegou a participar das filmagens de um longa-metragem, seguindo protocolos de segurança. Agora, ela já faz a leitura de um monólogo à espera de que as coisas melhorem com o avanço da imunização.

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A atriz Lu Grimaldi na pré-estreia do filme "Divórcio" no shopping Iguatemi na zona oeste de São Paulo - Zé Carlos Barretta/Folhapress


“Quando você toma a vacina, dá uma esperança. Demorou, mas chegamos a esse lugar”, afirma. O coração de mãe, porém, ainda aperta, diante da lentidão com que avança a imunização no Brasil. “A preocupação continua grande. Enquanto meu filho não tomar, e ele tem que sair para trabalhar, não dá para comemorar”, diz. “Perdi amigos, pessoas que poderiam ter tomado a vacina [se houvesse anteriormente].”

Assim como grande parte da população, a atriz deposita nas duas doses para todos a esperança de dias melhores. “Depois que mais pessoas tomarem a vacina, vai ficar mais fácil essa retomada. Após um ano e meio vivendo quase como aposentada, e sem aposentadoria, temos que seguir”, afirma Lu.

Coral faz ação única em ônibus

A saudade era grande, da mesma forma que a vontade de voltar a se apresentar para o público. Já vacinados, 18 integrantes do coral Vida Nova Eniac, de Guarulhos (Grande SP), com pessoas acima dos 60 anos, subiram em um ônibus no início do mês e fizeram um recital itinerante. As atividades, porém, seguem suspensas temporariamente.

“Vendo a tristeza deles, a falta que sentem do coral, resolvi inovar e fazer no ônibus”, afirma o regente Rafael Monteiro.

A apresentação foi pontual, porque ainda não há consenso sobre um espaço seguro onde o grupo possa ensaiar. Ao longo da pandemia, uma coralista morreu de Covid-19. Há seis anos no coral, o policial militar reformado Oswaldo Andrade, 79, sente falta do convívio. “É um tempo em que a gente procura desestressar um pouco”, diz.

“Não vejo a hora. Estou muito ansiosa”, diz Lydia Magalhães, 86, sobre a vontade voltar aos ensaios.

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