Caneladas do Vitão: O pandemônico país do futebol
Diálogos surreais, irreais, quase reais
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— Tem que continuar isso aí. Vamos repetir que o futebol é seguro e quem é contra é a oposição política que joga contra o futebol do país.
— Mas não vai colar? Como a gente vai dizer que é seguro se os clubes enfrentam surto de covid e os hospitais do país colapsaram?
— E daí? Futebol não é coveiro.
— Mas se acontecer algo em campo? Se der ruim, toc, toc, toc, tem cidade que não vai dar nem para levar jogador para hospital porque não tem vaga.
— Tem que enfrentar isso, mas sem mimimi nem frescura! Todo mundo vai morrer um dia!
— Mas como os prefeitos e os governadores vão justificar que fica uma ambulância parada no estádio para cumprir a lei enquanto a população morre sem acesso a oxigênio, sem leito?
— Isso é fácil. Deixa eu ver. Boa: é só falar que nossa preocupação não é com a gente, em cumprir nosso contrato. Vamos falar que a preocupação é com os pequenos, com a maioria que não tem condição de se manter?
— Ué, mas como a gente vai falar isso se a briga é justamente para não parar os campeonatos de elite, com contratos de transmissão? Se a preocupação é com o preparador físico do time do interior, porque não há preocupação com o preparador do sub-11, do sub-13, do sub-15? Eles também precisam comer!
— Você também é comunista e contra a gente, não estou entendendo? Que raio de pergunta é essa? Vai para Cuba!
— Claro que não. Eu quero que se lixe todos eles e os preparadores físicos, seguranças, motoristas de todas as categorias. Só estou lembrando que o nosso discurso não para em pé e alguém vai questionar isso, chefe?
— Nada. O público acredita no que quiser: terra plana, cloroquina, tratamento precoce e, se a gente falar direitinho vai acreditar também no nosso protocolo e que o objetivo é salvar os mais humildes que vivem do futebol.
— É arriscado, mas não custa tentar, é capaz de engolirem.
— Mas é isso mesmo. Não morreu ninguém em campo!
— Não morreu jogador. E funcionários, parentes, treinadores, massagistas? E quem teve contato com os jogadores, chefe?
— E daí? O futebol tem que salvar a sua economia.
Esta é uma obra de ficção: o colunista não tem provas, mas convicção que, se forem vazados os áudios das reuniões à Vaza Jato, as conversas, possivelmente com um tom mais chulo, seriam parecidas... E você?
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