Redução no limite de precatórios preocupa advogados e servidores

Limite da OPV (Obrigação de Pequeno Valor) deve passar de R$ 30.119,20 para R$ 11.678,90

Conteúdo restrito a assinantes e cadastrados Você atingiu o limite de
por mês.

Tenha acesso ilimitado: Assine ou Já é assinante? Faça login

São Paulo

Na noite da última terça-feira (5), os deputados da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo) aprovaram, por 41 votos a favor e 40 contra, o projeto de lei da gestão Doria que diminui o valor da OPV (Obrigação de Pequeno Valor) estadual.

O texto seguiu para o Executivo, onde deve ser sancionado pelo governador dentro de sete dias a partir de seu recebimento.

A falta de clareza sobre como vai valer o novo teto de R$ 11.678,90 para OPVs em andamento preocupa especialistas. 

"Quem já tem OPV com ordem de pagamento expedida, mesmo que seja acima desse novo limite, ou seja, até R$ 30.119,20, tem direito a receber normalmente, dentro do prazo de 60 dias. Qualquer mudança na chamada 'coisa julgada' seria inconstitucional", diz Antonio Roberto Sandoval Filho, presidente da Comissão de Precatórios da OAB-SP. 

Questionado, o Estado não esclareceu qual será a regra de pagamentos para quem já tem a OPV emitida, mas ainda está na fila de pagamento.

Sandoval Filho defende ainda que a mudança no limite de pagamento das OPVs só pode passe a valer para credores que derem entrada depois da sanção da lei pelo governador João Doria (PSDB).

"O dinheiro para pagamento das OPVs sai direto do caixa do governo e respeita o prazo de 60 dias. Já os precatórios, que são valores maiores, precisam ser aprovados em Orçamento e, para serem quitados, são usados os depósitos judiciais. O orçamento estadual de 2020 foi concluído em julho, logo, tudo o que for relativo a precatório a partir de então vai ser tratado no orçamento de 2021", diz o advogado.

O presidente da Comissão de Precatórios lembra que, atualmente, segundo a OAB-SP, o estado está pagando ações de precatório referente ao orçamento de 2002.

"A tendência é prolongar ainda mais o tempo de espera dessa fila, uma vez que entrarão credores com valores a receber entre R$ 11.678,90 e R$ 30.119,20."

Para o advogado Márcio Calheiros, do CPP (Centro do Professorado Paulista), a aprovação da lei é uma forma do governo gastar menos com OPVs, "jogando" credores para uma fila de espera maior, a dos precatórios (pagos com os depósitos judiciais, atualmente avaliados em R$ 7 bilhões disponíveis, segundo a OAB-SP).

"Pela Constituição, o valor da OPV a ser pago tem que ser avaliado por estado, de acordo com a sua capacidade econômica. Como que no estado mais rico da nação pode haver uma redução de mais de 60% no teto da OPV?", diz Calheiros.

O governo de São Paulo diz que ainda não recebeu o projeto de lei aprovado na terça-feira (5) e que, quando isso ocorrer, seguirá para análise.

"A proposta é mais uma medida para conter o déficit de R$ 10,5 bilhões do orçamento por causa de receitas da administração anterior. Nesse sentido, reduzir o valor das obrigações permitirá o pagamento mais rápido das Obrigações de Pequeno Valor (OPVs), sem trazer mais riscos à situação fiscal do Estado", diz em nota.

De acordo com o estado, mesmo com a redução proposta, serão atendidas cerca de 40 mil pessoas a mais do que em 2018, e o valor pago será aumentado em aproximadamente R$ 240 milhões.

"No ano anterior foram pagos 87.790 credores via OPVs e quase todos foram servidores púbicos. Quanto aos precatórios cabem aos próprios tribunais, responsáveis pelos pagamentos, já que o Estado realiza apenas o repasse dos recursos."

Como funcionam as OPVs

A OPV é um precatório do governo do estado que sai mais rapidamente. Em geral, a grana é liberada em até 60 dias depois da autorização judicial de pagamento.

Hoje, o limite para que uma ação seja paga como ordem de pequeno valor é de R$ 30.119,20. Com a aprovação, esse teto cairá para R$ 11.678,90. O valor proposto pelo governo equivale ao dobro do teto do INSS, atualmente em R$ 5.839,45.

Sistemas de pagamento

Precatórios são dívidas dos governos, em sua maioria com seus servidores que vão à Justiça pedir revisões, incorporações e aumentos.

As ações de servidores saem por dois sistemas de pagamento. Os menores, de até R$ 30.119,20, são depositados cerca de dois meses após a ordem de pagamento ser feita pela Justiça. Já os valores maiores viram precatórios e são pagos por duas filas, organizadas pelo Tribunal de Justiça.

Uma das filas, que tem os credores prioritários, como idosos, está em dia. A outra, que paga os valores por ordem cronológica de liberação, ainda está quitando os precatórios de 2002.

No projeto, enviado para a Alesp em agosto, o estado fala em risco de “colapso” relacionado à queda em sua arrecadação tributária em 2018 e ao aumento das despesas com requisições de pequeno valor. 

Polêmicas

O projeto 899 gerou polêmica. “Com os R$ 7 bilhões disponíveis em depósitos judiciais públicos e privados, a fila de ações que paga os valores por ordem cronológica de liberação sairia de 2002 e chegaria a 2010”, afirma Messias Falleiros, da Comissão de Precatórios da OAB-SP. 

Agora, explica ele, essa fila —que já está congestionada— vai ficar ainda mais carregada com a chegada das ações entre R$ 11.678,90 (novo teto) e R$ 30.119,20 (antigo teto). 

“É um valor que não seria tirado do cofre do Tesouro Estadual, não infringe lei de responsabilidade fiscal, não estoura teto de gastos e que o governo não vai poder usar para nada”, explica.
Para o advogado Márcio Calheiros, do CPP (Centro do Professorado Paulista), a medida traz elementos inconstitucionais.

“A lei vai entrar em vigor imediatamente, afetando decisões judiciais já finalizadas. Depois de sancionada, quem estava recebendo vai ter corte de mais de 60% nos pagamentos”, diz.

Em nota de 13 de outubro, a Fazenda estadual afirmou que a proposta “visa equilibrar valores constitucionais fundamentais”, especialmente no caso das condenações menores.

A pasta diz ainda que "mesmo com a redução proposta, serão atendidas cerca de 40 mil pessoas a mais do que em 2018, e o valor pago será aumentado em aproximadamente R$ 240 milhões".

Dívidas do estado | Como é hoje

O pagamento das ações ganhas por servidores do estado varia conforme o valor dos atrasados a que eles têm direito.

1. Ação de até R$ 30.119,20

  • Se o pedido é considerado de pequeno valor, ela sai por meio de OPV (Obrigação de Pequeno Valor), que tem a liberação em até dois meses após a emissão da autorização 

  • Todos os meses, a PGE (Procuradoria-Geral do Estado) divulga as listas com os pagamentos, no site https://www.precatorios.pge.sp.gov.br:8443/ppr/inicio.do

2. Processo acima de R$ 30.119,20

  • Se a ação é maior, ela se torna um precatório, que tem duas filas:

a) A de prioridades, que tem idosos a partir de 60 anos, doentes graves e portadores de deficiência tem o pagamento em dia

b) A fila por ordem cronológica, que considera a data de emissão, está pagando ações de 2002, ou seja, de 17 anos

  • O pagamento é feito pelo Tribunal de Justiça de SP, no site www.tjsp.jus.br/precatorios

Notícias relacionadas