Descrição de chapéu Opinião

Caneladas do Vitão: Verde é a cor da saudade

São Paulo

Maria Apparecida era caipira-pirapora. De Brodowski. Tinha orgulho da naturalidade igual à de Portinari. Embora arte, para ela, fosse Portiolli. E Silvio. Sempre no canal 4. Chamava Praia Grande de Santos. Isso quando já era mocinha, mulher do Pepe, mãe da Irene e da Mariazinha e começou a passar as férias no mar. Antes, filha de pai italiano que mal conheceu, a descendente de imigrante trabalhou em plantações de café.

Claudio Oliveira

A tabelinha café e tabaco fez parte da história de Cida. Que, já em São Paulo, trabalhou e aposentou na fábrica da Souza Cruz, no Brás. Carteira assinada, férias, licença-maternidade, aposentadoria, isso era um sucesso que seus netos não verão. E tem operário que hoje defende terceirização, reforma da Previdência... O Brasil é inacreditável!

Cida, como a maior parte dos brasileiros de sua geração, teve uma vida difícil, trabalhadora, mas digna. Não sabia o que era empoderamento nem feminismo, mas exerceu o seu direito de jamais viver na aba do marido, tampouco apenas para cuidar das filhas. Paradoxo em pessoa, roubava descaradamente o marido no baralho jogando buraco, dava as suas pitadas bissestas escondidas no cigarrinho (e empestiava o cheiro do banheiro), mas o seu "portanique" (como chamava porta-níquel, seu termo para carteira) estava sempre aberto para os netos se servirem para comprar doces na mercearia do seu Rufino.

Com terceiro ano primário incompleto e elevado grau de miopia, lia tudo que aparecia. Muito antes de quatro de seus seis netos virarem jornalistas. A libriana passava pelo horóscopo, pulava para fofoca e resumo das novelas e, claro, pelas notícias do "Parmera".

Marido corinthiano, duas filhas são-paulinas, seis netos e sete (conheceu cinco) bisnetos corinthianos, nunca fizeram Cida cogitar abrir mão de sua paixão verde. 

Viveu, pelo rádio e pelo jornal, os anos de ouro da Academia, o jejum, a era Parmalat e as quedas à Série B. Sem nunca ter pisado no Parque Antártica, Cida não só amava, como encarnava e representava o Palmeiras imigrante, migrante, operário, desbocado, apaixonante e apaixonado.

Cida faria 96 anos ontem. Como é bom acreditar que a vida segue e, como a sua Sociedade Esportiva Palmeiras, é eterna.

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