Desemprego faz procura por telecentros voltar a aumentar em SP

Após 2 anos de queda, pontos de acesso a computadores e internet têm alta

São Paulo

Puxado pelo desemprego, o número de usuários dos telecentros de São Paulo subiu 47% nos cinco meses de 2019, em relação ao mesmo período de 2108. A alta vem após dois anos de quedas, segundo dados da prefeitura obtidos via Lei de Acesso à Informação.

Telecentro da biblioteca Affonso Taunay, na Mooca (zona leste) - Rubens Cavallari/Folhapress

O levantamento mostra que os acessos despencaram cerca de 44% de 2017 para 2018, passando de 2,2 milhões para 1,2 milhão. Neste ano, entretanto, a demanda pelo serviço voltou a subir entre janeiro a maio, passando de 394 mil no ano passado para 586 mil. Telecentros são pontos para acesso a computadores e à internet.

Segundo especialistas e a própria gestão municipal, a alta pode estar associada ao desemprego --muitas pessoas recorrem ao serviço grátis para elaboração e envio de currículos.

Atualmente, a taxa de desemprego na capital é de 15,9%, segundo pesquisa da Fundação Seade e Dieese.
O crescimento nos acessos também coincide com o lançamento do DigiLab pela prefeitura, projeto de modernização dos telecentros. A cidade já tem quatro unidades em funcionamento.

"São espaços de inclusão digital bem mais versáteis e modernos, com novos equipamentos e programação de cursos voltados ao aprendizado tecnológico", diz o secretário municipal de Inovação e Tecnologia Daniel Annenberg.

Números relativos a maio indicam que em seu primeiro mês de funcionamento, o DigiLab da biblioteca Affonso Taunay, na Mooca (zona leste), teve cerca de 110 acessos por dia, enquanto no restante da rede a média foi de 32.

Nesta quinta-feira (27), por volta das 11h, o local já estava lotado. A maioria dos usuários chegava para acompanhar candidaturas a vagas de emprego.

"Como estou sem trabalho, não consigo pagar internet", diz Evandro Vaz, 42 anos, que vive em um albergue há dois meses. "Já enviei muitos currículos nesta semana, espero conseguir algo logo", afirma.

Periferia

Os dados obtidos pela reportagem indicam que o programa Telecentro continua a ter demanda sobretudo nas regiões periféricas da cidade. As unidades mais frequentadas em maio de 2019 ficam todas em bairros afastados da capital, como Cidade Tiradentes (zona leste) e Parque Santo Antônio (zona sul).

O campeão de acessos, a unidade do CEU Azul da Cor do Mar, na região de Itaquera (zona leste), teve cerca de 110 acessos por dia. Lá, a maioria dos usuários é estudante, e chega até o espaço para realizar atividades escolares e lazer.

"Muitas crianças não tem computadores em casa e vêm para assistir vídeos e acessar redes sociais", afirma um funcionário.

Segundo o secretário Daniel Annenberg, a prefeitura planeja requalificar todos os 132 telecentros da cidade, que têm equipamentos defasados e conexão lenta. 

"Só oferecer acesso à internet não funciona mais como inclusão. Estamos revendo o conceito para adequar a rede ao novo hábito digital da população", diz. Segundo Annenberg, os DigiLabs tetão programação de cursos voltados às demandas de cada região.

Na biblioteca Affonso Taunay, o motorista Jorge Rebouças, 47 anos, disse que recebeu orientações sobre a elaboração do seu currículo. "Estou há quatro meses na cidade vivendo de bico. Consegui marcar uma entrevista para hoje [nesta quinta, 27]", afirma.

Desemprego

Para o professor do curso de Políticas Públicas da UFABC, Cláudio Penteado, o aumento nos acessos em telecentros pode ser explicado pela taxa de desemprego. "Os números sugerem que muitas pessoas perderam o acesso à internet nesse tempo", disse.

Segundo o especialista, o modelo de inclusão digital foi importante na sua época de implantação, mas hoje é defasado e o natural seria a queda nos acessos. Para ele, o aumento dos smartphones, criação de programas como o Wi-Fi Livre e conexão em outros locais explicam a diminuição no número de usuários.

"Depois de anos de crise, um modelo defasado volta a fazer sentido, o que é preocupante", avalia Penteado, que classifica o movimento como regressão no uso da internet. "Numa época em que não havia acesso, esse modelo de lan-house era legal, mas hoje já não traz mais inclusão social. A internet precisa ser pensada de maneira criativa enquanto política pública", disse o professor.

Wi-Fi Livre

A Prefeitura de São Paulo, sob gestão Bruno Covas (PSDB), atribuiu a queda brusca no número de usuários dos telecentros entre 2017 e 2018 à implementação do programa Wi-Fi Livre e a popularização dos smartphones.

Segundo a administração municipal, algumas unidades foram fechadas por mudanças no modelo de contratação do serviço no ano retrasado, o que pode ter contribuído para a retração nos acessos.
Quanto à retomada do crescimento, a prefeitura sugere o desemprego como responsável.

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