Sem grana, Vai-Vai conta com doações para dar a volta por cima

Tradicional escola vai desfilar pelo Grupo de Acesso, sem verba da prefeitura e sem patrocínio

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São Paulo

A Vai-Vai, uma das mais tradicionais escolas de samba de São Paulo, conta com a força de seus componentes para voltar ao Grupo Especial do Carnaval de São Paulo. Pela primeira vez em 90 anos de história, a Saracura, que foi 15 vezes campeã do Grupo Especial, vai desfilar neste ano no Grupo de Acesso.

Com contas bloqueadas, dívidas, sem a grana da Prefeitura de São Paulo e sem patrocínio, a Vai-Vai contou com a doação de amigos e vaquinhas virtuais para colocar a escola na avenida.

Presidente de honra, Thobias da Vai-Vai disse que a comunidade reconheceu a queda, mas que vai dar a volta por cima. “Nosso Carnaval será muito bonito, mas adaptado ao Grupo de Acesso”, disse.

O carnavalesco Chico Spinosa, campeão com a Vai-Vai em três anos, no barracão da escola de samba do Bexiga; tradicional agremiação vai disputar Grupo de Acesso em meio a dívidas e crise interna
O carnavalesco Chico Spinosa, campeão com a Vai-Vai em três anos, no barracão da escola de samba do Bexiga; tradicional agremiação vai disputar Grupo de Acesso em meio a dívidas e crise interna - Rubens Cavallari/Folhapress

Neste ano, o desfile será com 1.800 componentes em 20 alas e quatro alegorias, com duração de até 60 minutos. No Grupo Especial, a escola desfilava com mais de 3.000 pessoas, até 32 alas e cinco carros-alegóricos em até 65 minutos.

“Reduzimos o número de componentes e de alegorias, mas em nenhum momento será um Carnaval menor”, afirmou o carnavalesco Chico Spinosa, que foi o responsável por três dos 15 títulos da Vai-Vai. É uma aposta da Saracura de pacificar a comunidade e voltar ao Grupo Especial.

Após amargar a última colocação no Carnaval do ano passado, a Vai-Vai foi para o Grupo de Acesso pela primeira vez. A queda foi o ápice de um racha interno que começou bem antes, com suspeitas de irregularidades nas contas da escola e no uso da grana enviada pela Prefeitura de São Paulo. A briga resultou no afastamento do então presidente Darly Silva, o Neguitão, em julho do ano passado, e na abertura de um inquérito civil no Ministério Público Estadual para investigar possíveis irregularidades no caixa da escola. 

Segundo Thobias, a Vai-Vai tem dívidas trabalhistas e com fornecedores, que já somaram R$ 2,5 milhões. Por isso, a escola está com as contas bloqueadas judicialmente e não recebeu nenhum valor da prefeitura.

“Essas dívidas são antigas e estouraram agora. Hoje já não sabemos quanto devemos, pois toda semana um oficial de Justiça aparece cobrando uma nova”, afirmou Thobias.

Apesar das questões jurídicas e das dívidas, Thobias acredita na força da comunidade para voltar ao Grupo Especial. “Nosso sucesso depende dos nossos componentes. Não vamos desanimar”, afirmou.

Enredo vai lembrar os 15 títulos

Os 90 anos da Vai-Vai foram a inspiração para o samba-enredo do Carnaval deste ano. “Será uma cronologia da história da escola que vamos apresentar na avenida”, diz o carnavalesco Chico Spinosa.

Com o samba-enredo “De Corpo e Álamo”, a Saracura vai lembrar dos 15 campeonatos em suas alas e alegorias. Até a letra do samba é um convite à esperança de dias melhores. “Que um novo dia vai raiar /Pra iluminar os filhos seus / A música venceu / E além do tempo eu hei de ver / O álamo do samba florescer”, diz a letra.

Para o desfile, Spinosa vai lembrar no carro abre-alas o início da escola, quando ainda era um cordão e desfilava pelas ruas da Bela Vista, na região central. 
A bateria nota 10 da Vai-Vai também será homenageada em uma das alegorias. “Até porque não existe Carnaval sem a bateria da Vai-Vai.”

Segundo Spinosa, os problemas dos últimos anos foram importantes para trazer de volta a comunidade que estava afastada. 

Promotoria abriu inquérito contra escola

As suspeitas de irregularidades na administração das contas da Vai-Vai se transformaram em um inquérito civil aberto em novembro de 2018 pelo MP (Ministério Público Estadual).

O inquérito apura eventual malversação das verbas públicas repassadas à Vai-Vai e a não prestação de contas por parte da escola, que recebeu cerca de R$ 1,2 milhão da Prefeitura de São Paulo em 2018.

Além da Vai-Vai, são alvos da investigação o presidente afastado da escola, Darly Silva, o Neguitão, e a prefeitura. Segundo o promotor Paulo Destro, da Promotoria do Patrimônio Público, responsável pelo inquérito, a prefeitura disse que não encontrou irregularidades no repasse de verbas à Liga das Escolas de Samba, que é quem distribui a grana para as escolas. Sobre a prestação de contas, ainda não se manifestou, segundo o promotor.

Já a Liga, que não é investigada, disse no inquérito que não tem poder para fiscalizar o repasse da verba.
Neguitão não foi localizado pela Promotoria para prestar esclarecimentos sobre o caso. 

Resposta

A reportagem procurou o presidente afastado da Vai-Vai, Darly Silva, o Neguitão, por telefone e deixou recado em suas páginas nas redes sociais, mas não conseguiu localizá-lo para comentar o inquérito aberto pelo Ministério Público. 

A presidente do conselho gestor da agremiação, Anna Maria Murari, disse que está repassando os documentos solicitados pela Promotoria e que está colaborando com a investigação. “Queremos saber se houve erros ou falhas e quem as cometeu”, afirmou.

Segundo Anna Maria, o rebaixamento da Vai-Vai no ano passado foi injusto, mas a comunidade está trabalhando para fazer uma grande apresentação. “Vamos voltar para o lugar de onde nunca deveríamos ter saído”, disse.

A Prefeitura de São Paulo foi procurada na tarde de sexta-feira (7) para se posicionar sobre a investigação, mas afirmou que ainda apurava o caso.

 
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