Redes sociais viram palco para exaltar a vacinação

Com o avanço da aplicação, filhos e netos usam a internet para registrar o momento da imunização

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São Paulo

Na pandemia, a internet teve papel essencial para manter as interações sociais em tempos em que o isolamento se fez necessário. Agora, além das chamadas de vídeo e do uso de aplicativos de mensagem, as redes sociais ganharam nova função com o início da vacinação e tornaram-se palco para exaltar este momento tão aguardado.

Hashtags como #VacinaSim e #VivaOSUS são alimentadas com fotos dos recém vacinados diariamente em redes sociais como Facebook, Instagram e Twitter. Filhos e netos aproveitam para registrar o momento que concede esperança em meio às dificuldades trazidas pela pandemia.

"Ver as pessoas se vacinando e tirar os entes queridos desta zona de risco têm sido um alívio. Cada um que consegue a vacina é quase uma dose de ânimo para todo mundo", comenta Andréa Jotta, psicóloga e professora da PUC-SP.

Para o estudante de direito, Augusto Peres Guatemozim, 21, mais do que um alívio, o momento foi uma conquista. Sua mãe, Alaíde Maria Peres, é biomédica e, aos 60 anos, tomou a primeira dose da Coronavac no dia 17 de março na UBS Carandiru, zona norte da capital paulista.

Segundo Augusto, a mãe estava um pouco receosa com a vacinação, mas foi convencida pela família. “Eu fui atrás do diploma dela, peguei o carro, levei ela tomar e só relaxei quando vi aplicarem a dose nela”, relata o jovem.

No Instagram, o filho postou uma foto de Alaíde segurando o cartão de vacinação. "O que me levou a publicar foi principalmente para divulgar, mostrar que a vacinação realmente está acontecendo. A gente vê só os velhinhos, parece algo distante… Ver a minha mãe vacinada me deu esperança. Eu quis postar para mostrar que vai chegar, que uma hora vai chegar para todos", explica Augusto.

Mulher de cabelos loiros segura cartão de vacinação. Ao seu lado, jovem de cabelo curto e camisa rosa a abraça. Ambos mascarados.
Alaíde Peres, 60, e seu filho Augusto Peres, 21, comemoram a vacinação da mãe, que é biomédica. - Karime Xavier / Folhapress

A psicóloga Andréa Jotta explica que esse fenômeno de exposição da vacinação nas redes sociais faz parte de estímulos psicológicos que caracterizam um comportamento de rebanho. "Lá nos primórdios do ser humano, quando um berrava 'apedreja', outros duzentos vinham apedrejar. Às vezes, sem saber o motivo de estarem fazendo aquilo. Faziam porque todos estavam fazendo", esclarece.

Segundo Jotta, este comportamento ganha força na internet e, no caso da vacinação, uma onda de alívio e esperança vai se replicando com comentários e curtidas.

"Quando você está postando coisas que são felizes e agradáveis para você, a tendência é que as pessoas reforcem isso, o que vai aumentar, de certa forma, seu alívio por aquela situação", complementa a psicóloga.

Foi pensando nessa reverberação que a professora Adriana Schramm, 54, publicou no Facebook as fotos de seus pais recebendo a primeira dose da vacina. "É um incentivo para meus tios, para a família, para as pessoas. É importante a gente divulgar que dá certo, porque eu acredito na ciência", relata.

Seus pais, Isolde Kuipers Schramm, 79, e Orlando Schramm Filho, 78, moram em Blumenau (SC), a mais de 600km de São Paulo, onde Adriana mora. "Vê-los vacinados é uma luz no fim do túnel", diz a filha.

A psicóloga da PUC-SP acrescenta que a onda de postagens está relacionada com o fato das vacinas serem restritas somente a uma parcela da população. "É algo que não está disponível para todo mundo, então cria-se uma expectativa e isso alimenta o ganho quando você recebe", argumenta.

Jotta reforça que os algoritmos das redes sociais estimulam aquilo que é postado a partir do momento que o número de curtidas e comentários cresce. "A força que faz com que as pessoas postem coisas positivas é a mesma força que faz com que postem coisas negativas. Cabe a nós, seres humanos, alimentarmos aquilo que é melhor", defende a profissional.

Comentários positivos não faltam na publicação do Instagram do psicólogo Leonardo Morelli, 55. A foto de sua mãe, Maria de Lourdes Morelli, 89, sendo vacinada gerou mensagens carinhosas de amigos e conhecidos na rede social. "Olha, Dona Maria de Lourdes! Que ótimo que ela foi vacinada! Mande um abraço!", dizia um dos comentários.

Mãe e filho, que moram juntos em Ipatinga (MG), estavam ansiosos pelo momento. "Às 7h da manhã, no dia agendado para a vacinação, ela estava na porta de casa esperando o momento. Foi como uma criança ganhando um presente, então eu registrei a cena", conta Leonardo.

"Teve uma resposta muito positiva das pessoas, felizes por ela ter sido vacinada. Foi bom até para ela perceber que as pessoas se voltaram a ela, sabe? Deram atenção a ela sendo vacinada", comenta Leonardo sobre a recepção da publicação.

"Foi uma das fotos mais curtidas do meu Instagram", comenta o design de interiores Márssey Venturotti, 42. No sábado (27), ele publicou uma foto de sua mãe, Eliana Venturotti, de 72 anos, recebendo a primeira dose da Coronavac no Rio de Janeiro, cidade em que moram.

Na foto, Eliana não esconde o sorriso no rosto, mesmo usando máscara. Com a pandemia, o filho, Márssey, voltou para a casa da mãe, onde ambos ficaram isolados por um ano, saindo só para ir ao mercado.

"Tava todo mundo muito ansioso para essa primeira dose. Eu fui levá-la e foi um momento muito bonito, muito emocionante", conta Márssey, que publicou a foto no Facebook também, onde familiares e amigos puderam deixar comentários exaltando o momento de imunização.

Vacinação de Martinho da Vila viraliza no Twitter do neto

"Canta forte, canta alto. Que a vida vai melhorar!" respondeu um usuário do Twitter a uma postagem com fotos do sambista Martinho da Vila, de 83 anos, sendo vacinado. O tweet de comemoração feito por seu neto, Guido Ventapane, alcançou quase 100 mil likes na rede social.

Guido tem 19 anos, é músico percussionista e se formou em produção audiovisual no fim do ano passado. Seu avô, o também artista Martinho da Vila, recebeu a primeira dose da vacina no dia 16 de fevereiro e a segunda, um mês depois, no dia 16 de março. Ambos os momentos foram registrados na conta do Twitter do neto.

As duas postagens de Guido tiveram, respectivamente, 98,7 mil e 52,7 mil likes no Twitter. "Não achei que ia tomar essa proporção enorme. Postei por causa da felicidade de saber que ele está agora mais protegido do que antes", conta Guido.

Tweet do neto de Martinho da Vila, Guido Ventapane, comemorando a vacinação do avô. - (Foto: guidoventapane no Twitter)

Desde o início da pandemia, o jovem viu o avô uma única vez, durante a gravação de uma live no final do ano passado.

A mãe de Guido, Analimar Ventapane, segunda filha de Martinho, também trabalha com música, como vocalista. Antes da pandemia, a família costumava se reunir com frequência. "Gostamos de fazer um churrasquinho e, em shows, quando eu costumava tocar com ele [o avô], a gente se via bastante também", explica o neto do sambista.

Martinho tem 12 netos, 3 bisnetos e aguarda o nascimento do 4º bisneto. "Tá todo mundo morrendo de saudade. A gente se liga bastante, conversamos sobre a vida e sobre tudo. Ele gosta, porque tá com saudade também", diz Guido.

Mãe vacinada em seu aniversário ganha registro no Instagram

Em 2021, o presente de aniversário da cirurgiã-dentista Isabel Caeiro Silva foi receber a primeira dose da Coronavac. No sábado (20), Isabel completou 55 anos e, no mesmo dia, foi até a UBS Vila Guilherme, na zona norte, para ser imunizada.

Desde o início de março, profissionais de saúde com mais de 55 anos estão inclusos nos grupos de prioridade de vacinação. "Era uma coisa que ela queria muito. Tomar a vacina, para a gente e para ela, foi meio que um sonho se tornando realidade", conta Lívia Caeiro Silva, 20, filha mais velha de Isabel.

No dia da imunização, Lívia postou nos stories do Instagram uma foto da mãe segurando o cartão de vacinação. "E o mais sonhado presente de aniversário finalmente chegou!", escreveu.

Lívia Caeiro Silva, 20, com a mãe Isabel Cristina Caeiro Silva, 55. Isabel é dentista e foi vacinada recentemente na data do aniversário dela. - Rubens Cavallari/Folhapress

"A gente estava contando os dias. Postar, para mim, foi um misto de alívio com a sensação de missão cumprida. Foi um momento bem feliz", explica Lívia ao ser questionada sobre a motivação para compartilhar o momento nas redes sociais.

Na casa da família, somente Isabel está trabalhando presencialmente. O marido, professor universitário, dá aulas online e Lívia e seu irmão mais novo, Pedro, 19, também têm aulas à distância da faculdade. Lívia conta que todos tiveram que se reinventar durante a pandemia.

"Ela [a mãe] vai trabalhar toda paramentada. Usa pijama e avental cirúrgico, máscara N95, face shield... Parece uma astronauta", brinca a jovem. Graças aos cuidados da mãe, nenhum dos quatro foi contaminado pelo coronavírus.

Neta celebra "dose líquida de esperança" da avó de 84 anos

Dois filhos, cinco netos e três bisnetos. Aos 84 anos, Adelaide Navarro Paz tomou a primeira dose da vacina de Oxford/Astrazeneca no dia 28 de fevereiro. Em comemoração, uma de suas netas, a professora Bárbara Paz Trovão, 35, publicou no mesmo dia uma foto da avó no Instagram.

"Dia da primeira dose líquida de esperança na nossa Adelaide", diz a legenda. Nela, Bárbara também agradece "a Deus, ao SUS e à ciência". Na foto, é possível notar que, atrás da máscara, há um sorriso no rosto da idosa, que segurava seu cartão de vacinação.

Segundo Bárbara, os familiares, em resposta à foto, comemoraram a boa notícia. A professora conta que, por dois meses, a avó ficou totalmente isolada em casa. No terceiro mês de quarentena, pediu que Bárbara fosse até sua casa para cortar seu cabelo. O reencontro aconteceu no quintal de Adelaide, espaço aberto e com ambas usando máscaras.

"Assim tem sido até o dia atual. Nos vemos na extrema necessidade e quando nos vemos é com todos os cuidados", explica a neta. Bárbara é mãe de duas meninas, uma de 7 e outra de 9 anos, e mora com o marido em São Bernardo do Campo (ABC).

Adelaide estava ansiosa para a vacinação. "Como é de seu costume, já deixou tudo organizado na noite anterior: documentos, agendamento, roupa, chaves. Me ligou para saber exatamente como as coisas aconteceriam, que horas eu iria buscá-la", conta Bárbara.

Agora, a família aguarda o momento da segunda dose. "A parte mais difícil para mim na pandemia está sendo não poder vê-la com tanta frequência e, quando estou com ela, estar distante. Eu não vejo a hora de dar um abraço de urso", desabafa a neta.

Aos 84 anos, Adelaide Navarro Paz tomou a primeira dose da vacina. - Foto: maybenextwalts no Instagram
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