Dignidade na lama

Todos os anos o Brasil é castigado por uma rotina de catástrofes provocadas por temporais. Essas desgraças revelam o nosso atraso social e econômico e o descaso do poder público.

As chuvas deixam um rastro de mortes, desabrigados e desespero. Na maioria das vezes as vítimas são as classes mais pobres, empurradas para moradias precárias em locais de alto risco.

Desta vez a devastação atingiu a Baixada Santista, até terça-feira (3) com um número incerto de mortos e de famílias prejudicadas. Seja no litoral paulista, na várzea dos rios imundos de São Paulo ou nos morros do Rio de Janeiro, tais tragédias provocam revolta e indignação.

Há sinais claros de que as mudanças climáticas tendem a piorar esse quadro. Mas não é só disso que se trata. É preciso expor também a incompetência de governantes e autoridades em promover políticas habitacionais efetivas e em conter, por meio de alternativas viáveis, a ocupação de áreas de risco.

É espantoso que ainda se ouçam no Brasil tentativas de atribuir a quem vive em condições miseráveis a responsabilidade direta pela situação. Foi o que insinuou, por exemplo, o prefeito do Rio, Marcelo Crivella (Republicanos). "As pessoas gostam de morar ali perto dos talvegues [linha mais baixa de um vale por onde escorre a água da chuva e das nascentes] para gastar menos tubo e colocar cocô e xixi e ficar livre daquilo. Essas áreas são muito perigosas", disse.

O cenário atual exige pronta e e eficaz atuação do poder público para ao menos minimizar os estragos. A mais relevante das medidas, no entanto, parece muito difícil de acontecer: o fim do descaso histórico da elite política para com as populações mais necessitadas.

Bombeiros fazem buscas após deslizamento de terra no morro do Macaco Molhado, no Guarujá (86 km de SP) - Eduardo Anizelli/Folhapress

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.