De tempos em tempos, brota no futebol uma palavra ou expressão usada de maneira a desafiar lexicógrafos, linguistas em geral e a própria lógica.
A esta altura, o leitor provavelmente já está habituado ao "saber sofrer", clichê adotado por boleiros e treinadores até quando seus times ganham de goleada. Agora, se acompanha as transmissões da televisão, certamente tem ouvido com frequência o adjetivo "ajustado".
Começou com os comentaristas de arbitragem, o que leva a crer que se trate de um jargão do meio do apito, mas já há uma espécie de metástase. A coluna presenciou nesta semana uma animada discussão no metrô, na qual dois passageiros debatiam um gol anulado do Flamengo contra o Grêmio, no confronto válido pelas semifinais da Taça Libertadores: "Era bem ajustado mesmo, cara".
Ajustado, pelo que se pode deduzir, é o impedimento duvidoso. Se a revisão do lance não resolve imediatamente a questão, prepare-se para ouvir do ex-árbitro na TV: "É um lance muito ajustado, Cleber".
Tão ajustado que só a tecnologia resolve. Ou não resolve. Mas vivemos a era da cegueira coletiva: se a máquina disse que foi, foi.
A Conmebol divulgou a conversa do juiz de campo com o juiz de vídeo sobre o lance discutido no metrô, um suposto impedimento milimétrico do rubro-negro Gabigol. A análise do papo, cheio de ruídos, e das imagens, com evidentes ruídos visuais, falha na tentativa de comprovar a irregularidade.
Algo semelhante ocorreu com o gol invalidado do Vasco contra o Corinthians no último domingo, em Itaquera, no Campeonato Brasileiro. A CBF vazou uma imagem com o intuito de provar o impedimento de Werley e acabou mostrando que a bola colocada na rede pelo zagueiro deveria ter feito diferença no placar.
Eis o resumo do que é a experiência do árbitro de vídeo: pagamos com o fim do grito de gol, abafado na incerteza que provoca a protocolar revisão da jogada, precisa ou não; recebemos nada em troca.
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