Bordões eternizam os grandes locutores esportivos do rádio

Concorrência das transmissões televisivas nos anos 1950 criou geração de narradores -e bordões- lembrados até hoje

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São Paulo

"Abrem-se as cortinas e começa o espetáculo." "Sai daí que o jacaré te abraça, garotinho." "O que que eu vou dizer lá em casa?" "Cruel, muito cruel." "Mandou mal, lá na geral, que nem perna de pau."

Muito antes da chegada dos vídeos sob demanda, dos podcasts e até dos canais fechados de TV, a transmissão esportiva no rádio, especialmente do futebol, fazia sucesso nos rádios por vozes imponentes e bordões eternizados por grandes narradores.

Os irmãos e locutores esportivos Oscar Ulisses (à esquerda), 62 anos, e Osmar Santos, 70 anos, são duas das vozes marcantes nas transmissões esportivas do rádio brasileiro e influenciam as novas gerações
Os irmãos e locutores esportivos Oscar Ulisses (à esquerda), 62 anos, e Osmar Santos, 70 anos, são duas das vozes marcantes nas transmissões esportivas do rádio brasileiro e influenciam as novas gerações - Eduardo Knapp/Folhapress

Embora a primeira narração de um jogo no Brasil tenha ocorrido em 1932, na voz do locutor Nicolau Tuma, seguido por nomes como Ari Barroso, Luiz Mendes e Gagliano Neto, foi na década de 1950, com a concorrência da TV, que Fiori Gigliotti uniu a narrativa informativa e dramática nas rádios Bandeirantes, Pan-Americana, Tupi e Record, inaugurando a era romântica das locuções esportivas.

"O Fiori Gigliotti fez parte daquela linha de ataque em que você tem Pedro Luiz Paoliello, Edson Leite, Fiori Gigliotti, Osmar Santos e José Silvério. Talvez os cinco grandes nomes do rádio paulista, para não dizer brasileiro. São geniais! Cada um com seu estilo, com sua categoria e com uma longevidade impressionante de todos", afirma o jornalista Mauro Beting, autor de um livro recém-lançado sobre o mestre da locução.

"O Fiori tinha uma transmissão personalíssima. Fazia com que os ouvintes fossem obrigados a imaginar um cenário todo diferente daquilo que os outros davam a entender. Poético, transmissão lenta, mas precisa de onde estava a bola. Essa sua característica o diferenciava", lembra Silvio Luiz, 85 anos —e na ativa pela rádio Transamérica—, que seguiu os passos de Fiori e imprimiu a irreverência e bordões clássicos como "olho no lance" e "pelo amor dos meus filhinhos" em suas narrações.

 

Dono de diversos bordões ("Tiroliroli, tirolirolá!"; "no caroço do abacate") e um dos principais nomes do meio, Osmar "pimba na gorduchinha" Santos, 70 anos, criou uma verdadeira legião de fãs e deixa saudade até hoje desde que parou de narrar, devido a um acidente automobilístico, em 1994, que afetou sua fala.

"Falar do Osmar é chover no molhado. É um sujeito que me ensinou tudo e que foi um divisor de águas. Esse jeito mais nervoso de contar a história dos jogos é um pouco do estilo do Osmar. O linguajar dele foi muito moderno para época, os bordões que ele criou, e isso porque está há mais de 20 anos fora da mídia", destaca o irmão do Pai da Matéria e também narrador Oscar Ulisses, 62 anos, da rádio CBN/Globo.

Com ou sem bordões, craques do microfone como Pedro Luiz Paoliello, Edson Leite, Jorge Curi, Oduvaldo Cozzi, José Silvério, Garotinho, Waldir Amaral, José Carlos Araújo, Luciano do Valle, Milton Neves, Nilson Cesar, Galvão Bueno e uma seleção de grandes narradores mexeram e ainda mexem com o imaginário de milhões de brasileiros e seguem influenciando uma gerações de narradores.

Carisma e criatividade são os legados de Fiori

Apesar de ter vivido seu auge na década de 1960, Fiori Gigliotti (1928-2006) influencia até os dias de hoje narradores de futebol.

"É uma referência para todos nós porque ele trouxe um método de narração muito diferente. Era poético, muito genuíno, sutil, belo. Ele transformava um gol em um soneto", destaca Marcelo do Ó, 40 anos, narrador das rádios CBN/Globo e da plataforma DAZN.

O locutor esportivo Fiori Gigliotti se prepara para narrar jogo, em 1983, no Morumbi
O locutor esportivo Fiori Gigliotti se prepara para narrar jogo, em 1983, no Morumbi - Evanir R. Silveira - 14.dez.83/Folhapress

"Ele teve um jeito único de transmitir jogos de futebol, era uma transmissão um pouco cantada, que não rebuscava palavras", comenta Oscar Ulisses.

Para Paulo Andrade, 40, da ESPN, o legado do narrador passa pela forma de se relacionar com os ouvintes.

"Um locutor precisa agregar a parte técnica, que eu entendo como fundamental, à parte lúdica. O esporte mexe com o coração das pessoas", diz. "A minha geração tende a ser muito técnica, o passar dos anos cobra isso. Quem nos assiste é bem informado e exige que sejamos também."

Há 38 anos na rádio Jovem Pan, o locutor e amigo Nilson Cesar, 58, enfatiza o estilo único de Fiori.
"Ele despertou uma geração, foi espelho de muita gente, não só na carreira profissional, mas na pessoal também. Sempre foi um cara com uma conduta pessoal extraordinária e profissionalmente genial.

Com tamanha importância no rádio brasileiro, o narrador ganhou a biografia "Fiori Gigliotti - O locutor da torcida brasileira", escrita pelos jornalistas Mauro Beting e Paulo Rogério.

"Ele transbordava no romantismo e é natural para quem se chama Fiori, que seria 'flores', em italiano. Ele fazia de qualquer pelada um espetáculo", destaca Mauro Beting.

Era de Ouro - Bordões dos craques do rádio

 

Silvio Luiz
"Pelas barbas do profeta"
"Acerte o seu aí, que eu arredondo o meu aqui"
"Pelo amor dos meus filhinhos"

Osmar Santos
"Ripa na chulipa e pimba na gorduchinha"
"Tiroliroli, tirolirolá!"
"No caroço do abacate"
"Direto pro barbante"
"E que gooool!"
"Parou por quê, por que parou?"

Galvão Bueno
"Haja coração!"
"É teste pra cardíaco"
"Vai que é sua, Taffarel!"

Januário de Oliveira
"Tá lá um corpo estendido no chão"
"É disso, é disso que o povo gosta"
"Taí o que você queria!"
"Cruel, muito cruel!"

José Carlos Lopes de Araújo, o Garotinho
"Vai mais, vai mais, garotinho"

José Silvério
"E... que golaço!"
"Agora, eu vou soltar a minha voz"

Fiori Gigliotti
"Abrem-se as cortinas e começa o espetáculo"
"O tempo passa"

Oscar Ulisses
"Pro goooollll!"

Roberto Avallone
"No pique!"
"Que golaço! Exclamação!"

Juarez Soares
"Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa"

Erramos: o texto foi alterado

Na versão anterior deste texto, na galeria de fotos dos locutores, foi publicado incorretamente o ano de falecimento de Luciano do Valle. Ele morreu em 2014, aos 66 anos. Esta versão está atualizada

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