Descrição de chapéu Opinião

Caneladas do Vitão: Toquinho de saudade da infância à portuguesa

São Paulo

O Tejo não é o rio que corre na minha aldeia e deságua na minha memória. A minha Portugal é a Vila Maria. Onde fui pré-concebido, quiçá, planejado.

Tudo começou no pátio, na hora do recreio, ou talvez na saída do “grupão” Paulo Egydio. Foi lá que o transmontano Viriato deu os primeiros beijos na filha de espanhol Maria Dolores. Relatos garantem que foi no “ginásio”, pós-admissão. A versão oficial, no entanto, é a de que os malhos rolaram já no “científico”, o “colegial” da época.

Futebol é outra história. Xavantes e Benfica, conta meu pai, eram os grandes times da várzea. Completavam com Flamengo e Vila Maria o quarteto de ferro do bairro.

charge da coluna caneladas do vitão de 15/8
Cláudio Oliveira

Pulemos os anos 60, passemos pelos 70 e cheguemos aos 80. Nasci e cresci do outro lado do Tietê. Sábado, antes ou depois de jogar bola, era dia de visitar a casa do vô Damião e da vó Adélia com meu pai. Não chegávamos nunca. De Corcel, Del Rey ou Monza, o translado era sempre mais demorado. A visita durava uma, duas, três cervejas.

Ah, Vila Maria. Cá em baixo, na praça Santo Eduardo, rangávamos no Dizzy. Lá em cima, na Cosmorama, meu pai bronzeava o pulmão, curtia as batidas e enchia o latão, ainda em garrafas retornáveis de vidro. Com tremoços. Tudo no saudoso Pirilo.

Tínhamos o cuidado de chegar no vô com um espaço na barriga para a linguiça portuguesa. Colocada sempre no mesmo prato, sobre a mesma toalha, na mesma mesa. Quando tinha jogo, o radinho, fixado no prego da parede do quintal, estava sempre ligado na Portuguesa. Quando não tinha jogo, o som, sempre a mesmíssima fita do Roberto Leal, vinha da sala.

O Santuário de Fátima do bairro era, ainda é, a Candelária. Quando meus avós não atendiam, meu pai nem pestanejava: estão na igreja. Sempre acertava. E a gente esperava. Outra para o santo. No Pirilo.

Voltemos à Portuguesa. Lembro de um gol ou outro do Toninho, do Edu, do Esquerdinha, mas quase sempre, quando estava no vô e saía gol, batata, era gol do Toquinho. Na minha memória afetiva, o ponta direita fez mais gols que Futre, Eusébio, Figo e Cristiano Ronaldo somados.

Que saudade, Portuguesa!

Viva a Lusa!

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Do escritor português Fernando Pessoa: “Pode ser que nos guie uma ilusão; a consciência, porém, é que nos não guia”.

Vitor Guedes
Vitor Guedes

43 anos, é ZL, jornalista formado e pós-graduado pela Universidade Metodista de São Paulo, comentarista esportivo, equilibrado e pai do Basílio

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