Alterações aprovadas pela Câmara dos Deputados na reforma da Previdência criaram a possibilidade de aposentadoria com valor acima de 100% da média salarial para segurados do INSS que se aposentarem pelas regras de transição.
A proposta original levada ao Congresso pelo governo Jair Bolsonaro restringia os benefícios maiores do que a média salarial aos casos de aposentadorias do serviço público, benefícios especiais por insalubridade ou pela regra permanente, que exigirá idade mínima de 62 anos (mulheres) e 65 anos (homens).
A mudança deve beneficiar trabalhadores do setor privado que hoje estão na casa dos 50 anos de idade e que já poderiam se aposentar por possuírem períodos de contribuição acima de 30 anos (mulheres) e 35 anos (homens), mas teriam a renda mensal significativamente reduzida pelo fator previdenciário.
O substitutivo do relator do texto na Câmara, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), unificou a regra. Desta forma, todos os trabalhadores que contribuírem por mais de 40 anos (homens) e 35 anos (mulheres) terão essa opção para “ficar mais tempo no mercado de trabalho, sempre respeitando o teto do Regime Geral da Previdência Social”, informou a consultoria legislativa da Câmara.
O sistema da reforma também permite que segurados alcancem o benefício acima da média salarial mais rápido do que com a aplicação do atual fator previdenciário, conforme simulações realizadas com a ajuda do Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários).
Mas as regras atuais ainda são mais vantajosas porque antecipam a aposentadoria integral por meio da fórmula 86/96 progressiva e, além disso, melhoram a média salarial do trabalhador ao retirar do cálculo os 20% menores salários.
Para Luiz Felipe Veríssimo, do Ieprev, adiar a aposentadoria para obter um benefício maior com a nova regra pode compensar somente nos casos em o segurado já possui elevado tempo de contribuição, mas não conseguirá a pontuação 86/96 neste ano.
“A decisão é caso a caso porque o segurado deixará de ter a renda por alguns anos”, diz Veríssimo.
REFORMA DA PREVIDÊNCIA | ESPERA PODE COMPENSAR
O trabalhador que já tem direito à aposentadoria, mas será prejudicado pelo fator previdenciário, pode considerar pedir o benefício após a reforma.
Em alguns casos, com alguns anos de espera pelo benefício, o segurado garantirá uma aposentadoria integral ou ainda maior pelo resto da vida.
Pode ter vantagem quem acumula os seguintes requisitos;
- É empregado e tem média salarial maior do que o salário mínimo
- Está na casa dos 50 anos e tem mais de 30 anos de contribuição
- Não conseguirá ter aposentadoria integral pela regra 86/96
- Terá um desconto alto do fator (cerca de 30% do benefício)
CÂMARA ALIVIOU REGRAS
A reforma da Previdência aprovada na primeira votação da Câmara traz vantagens ao trabalhador na comparação com o projeto original do governo Jair Bolsonaro.
O texto aprovado pelos deputados permite a concessão de benefícios com mais de 100% da média salarial, o que só era possível em alguns casos na proposta do Planalto.
Proposta original
A aposentadoria com mais de 100% seria possível nos seguintes casos:
- Aposentadoria com idade mínima pela regra permanente do INSS
- Aposentadoria especial
- Aposentadoria de regimes próprios de servidores públicos
Proposta da Câmara
Todos os aposentados pelo INSS podem ter renda acima de 100% se contribuírem por:
- 41 anos ou mais, se homem
- 36 anos ou mais, se mulher
Regra válida hoje no INSS
Aposentados por idade e por tempo de contribuição podem receber acima de 100% da média salarial.
Isso é possível nos casos em que o fator previdenciário do segurado é calculado com valor acima de 1(um).
OUTRAS VANTAGENS
A Câmara ainda criou outras facilidades, em relação à proposta original, no cálculo e no acesso ao benefício. As mudanças também dão vantagem para o cinquentão que começou a contribuir cedo. Veja:
- Mulheres poderão ter renda integral com 35 anos de contribuição e não mais só com 40 anos
- Uma regra de transição permitirá a aposentadoria para quem completar 57 anos (mulher) e 60 anos (homem). Para ter acesso é preciso contribuir pelo dobro do tempo que, na data da promulgação da reforma, estiver faltando para a aposentadoria por tempo de contribuição
CÁLCULO ANTES E DEPOIS DA REFORMA
As fórmulas abaixo consideram aposentadorias básicas de trabalhadores do setor privado
Como é o cálculo atual
- A base para o cálculo do valor da aposentadoria é a média salarial do segurado
- Essa média é feita sobre as 80% maiores contribuições realizadas após julho de 1994
- O valor da média salarial é multiplicado por um índice, que é o fator previdenciário
- O fator tanto pode reduzir como também pode aumentar o valor da aposentadoria
O fator previdenciário para cada segurado é calculado com base em três informações:
- Idade do segurado ao pedir a aposentadoria
- Tempo de contribuição do trabalhador
- Expectativa de sobrevida da população
O fator previdenciário não pode ser aplicado par
Como será o novo cálculo
- A média salarial do segurado passará a ser calculada com 100% dos salários desde julho de 1994
- A mulher que se aposentar com 15 anos de contribuição receberá 60% da média salarial
- O homem que tiver de 15 a 20 anos de contribuição também se aposenta com 60% da média
- Cada ano de contribuição a mais acrescentará 2% da média ao valor do benefício
PERDAS E GANHOS
Com a ajuda do Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários), a reportagem aplicou as fórmulas atuais e as novas aos perfis de três leitores. Veja:
Exemplo 1
Uma mulher tem 54 anos e 2 meses de idade e 31 anos e 4 meses de contribuição;
Ela sempre contribuiu pelo teto e tem uma média salarial de R$ 5.562.
Aposentadoria hoje:
- O benefício seria de R$ 3.809 (68,5% da média salarial dela)
Benefício após a reforma
- A segurada poderá ter renda integral (R$ 5.562) se esperar três anos e oito meses
- Nesse intervalo, ela deixará de receber R$ 256,2 mil, considerando os abonos
- Se esperar quatro anos e oito meses, ela receberá R$ 5.673 (102% da média salarial)
Comparação
- Se a reforma não acabasse com a regra 86/96, ela teria a renda integral em três meses
- Ela poderia ganhar 107% da média salarial com o fator, mas teria de trabalhar mais sete anos
Exemplo 2
Um homem de 55 anos e sete meses de idade e 37 anos de contribuição;
A média salarial das contribuições dele desde 1994 é de R$ 2.500.
Aposentadoria hoje:
- O segurado pode se aposentar com renda de R$ 1.815 (72,6% da média salarial)
Benefício após a reforma:
- O trabalhador vai ter que esperar três anos e dois meses para ter renda integral de R$ 2.500
- Enquanto espera para ter o benefício integral, o segurado vai deixar de receber R$ 76.209
- Caso espere um ano a mais, ou seja, espera de quatro anos e dois meses, a renda sobe para R$ 2.250 (102%)
Comparação
Na regra atual, o trabalhador contribuiria por mais dois anos e três meses para ter renda integral, com 97 pontos
O segurado conseguiria cerca de 107% da média salarial com o fator se trabalhasse por mais seis anos
Exemplo 3
Um homem tem 53 anos e oito meses de idade e 37 anos e cinco meses de contribuição;
Ele sempre recolheu pelo teto e isso gerou uma média salarial de R$ 5.562.
Aposentadoria hoje
O benefício com o fator previdenciário seria de R$ 3.807 (68,4% da média salarial)
Benefício após a reforma
O segurado precisará esperar mais quatro anos e 11 meses para se aposentar e ter renda integral de R$ 5.562
Durante a espera pelo benefício integral, o trabalhador deixou de receber R$ 163,7 mil
Para ganhar R$ 5.673 (102%) ele precisa contribuir por mais um ano, ou seja, a espera toral seria de cinco anos e 11 meses
Comparação
Para ter renda integral com a regra de hoje, ele precisaria esperar três anos para atingir 97 pontos
Se trabalhasse por mais sete anos, ele teria um fator positivo e receberia 106% da sua média salarial
CONCLUSÃO
As comparações dos casos permitem fazer as seguintes afirmações:
- As mudanças feitas na Câmara trouxeram vantagem ao trabalhador
- Mas essas mudanças não compensam o fim da regra 86/96 progressiva
- Após a reforma, o segurado vai trabalhar mais tempo para ter renda integral
- A reforma ainda traz mais um redutor ao não descartar 20% das menores contribuições
- A regra proposta, porém, pode ter vantagens em relação ao fator previdenciário
- A espera para ganhar acima de 100% da média salarial pode ser menor após a reforma
- Em alguns casos, é melhor ter renda integral com a regra da reforma do que se aposentar agora, com o fator
REGRAS DE ACESSO AOS BENEFÍCIOS APÓS A REFORMA
A reforma da Previdência também muda a forma de acesso ao benefício. Trabalhadores do setor privado deverão se aposentar com idades mínimas de:
- 62 anos - Mulheres
- 65 anos - Homens
Transições
Haverá cinco regras básicas de transição (sem considerar regras especiais e do funcionalismo):
1) Sistema de pontos
O trabalhador terá direito à aposentadoria se a soma da idade ao tempo de contribuição atingir:
- 86 pontos, para mulheres
- 96 pontos, para homens
Progressão
A pontuação exigida aumenta a cada ano, até chegar a:
- 100 pontos, para mulheres
- 105 pontos, para homens
2) Idade mínima progressiva
Será possível se aposentar se atingir a idade mínima progressiva, que aumentará meio ponto por ano. A exigência começa em:
- 56 anos, para mulheres
- 61 anos, para homens
Também é obrigatório completar o tempo mínimo de contribuição de:
- 30 anos, para mulheres
- 35 anos, para homens
3) Pedágio
Para quem está a dois anos de se aposentar, o benefício por tempo de contribuição continuará valendo. Será preciso pagar pedágio de 50% sobre o tempo que falta para se aposentar.
4) Pedágio com idade mínima
O segurado terá que trabalhar o dobro do que falta para se aposentar pela regra atual. Além disso, precisará ter a idade mínima de:
- 57 anos, para mulheres
- 60 anos, para homens
5) Idade
- A idade de aposentadoria da mulher vai subir seis meses por ano, até 62 anos
- A idade mínima de aposentadoria para os homens será mantida em 65 anos
Fontes: Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários) e PEC (proposta de emenda à Constituição) 6/2019
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