Unidades Básicas de Saúde da cidade de São Paulo estão há oito meses sem receber o DIU (dispositivo intrauterino) de cobre, segundo funcionários.
A reportagem do Agora entrou em contato com 40 UBSs de todas as regiões da cidade e 36 não possuíam o dispositivo ou os materiais necessários para colocá-lo —as outras quatro unidades não passaram a informação por telefone. A cidade de São Paulo conta ao todo com 468 Unidades Básicas de Saúde.
O DIU de cobre é um método contraceptivo oferecido gratuitamente pelo SUS (Sistema Único de Saúde), após realização de planejamento familiar, também nos postos de saúde.
Segundo os atendentes, desde o início de março o dispositivo deixou de ser entregue pela prefeitura, mesmo com a demanda crescente pelo método.
Algumas UBSs, no entanto, receberam dispositivos no último mês, porém o lote tinha menos de dez unidades —número desproporcional à quantidade de pacientes na fila de espera.
Na UBS Jardim Sinhá, em Sapopemba (zona leste), por exemplo, foram entregues quatro unidades em outubro, pela prefeitura, porém há 28 mulheres na fila.
O mesmo aconteceu nas unidades Vila Arriete (Campo Grande), Veleiros (Socorro), Parque Santo Antônio (Jardim São Luís) e Vila das Belezas (Jardim São Luís), todas na zona sul.
Em outras unidades, como Chácara Santo Antônio e Campo Grande, além da falta de DIU, não há espéculo (instrumento) para colocá-lo nas pacientes.
Já nas UBSs Vila Nova Jaguaré, Arrastão, Jardim Figueira Grande e Jardim Miriam também não há ginecologista para realizar o procedimento. Nestes casos, se a falta do profissional é temporária (por motivos de férias ou licença), as mulheres seguem na fila de espera. Porém, se ele deixar a definitivamente da unidade e não houver substituto, as pacientes são transferidas a outra UBS e os exames devem ser refeitos, devido ao prazo de validade, segundo as funcionárias.
Em nenhuma das unidades contatadas foi informada a previsão de chegada de novos dispositivos.
A vigilante Viviane Abraão Santos, 27 anos, fez o planejamento familiar e os exames necessários para receber o DIU no início deste ano, na UBS Jardim Figueira Grande, na zona sul E desde maio, ela está na fila de espera para receber o dispositivo de cobre.
Com os exames concluídos e após cerca de três na meses na fila, tentou procurar outras unidades da região que pudessem oferecer o dispositivo, mas isso não foi possível por conta de seu endereço.
“Mesmo com o DIU em falta e sem nenhum prazo de chegada, não pude mudar de UBS. Até sugeri comprar o dispositivo e levar para colocarem, mas não permitiram”, afirmou.
Neste mês, Viviane foi informada pelos funcionários que a ginecologista deixou de atender na unidade e, por isso, seu caso seria transferido para a UBS Vila das Belezas, onde terá que refazer todos os seus exames devido à data de validade vencida. “Não tenho nenhuma previsão de quando vou receber o dispositivo”, afirma.
Sem DIU e sem ginecologista em sua unidade, Viviane está comprando pílula anticoncepcional na rede privada, pois diz não ter receita para retirar o medicamento no SUS.
Dificuldade de acesso
Para a ginecologista e vice-presidente da Comissão Nacional de Anticoncepção da Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia, Ilza Maria Monteiro, a dificuldade de acesso ao DIU sempre foi um problema no Sistema Único de Saúde.
Segundo ela, mesmo quando o dispositivo está disponível nas unidades, poucos profissionais são capacitados para colocá-lo.
“Imagino que pela dificuldade de colocar, os administradores podem ter deixado de comprar o material. É necessário rever essa logística, afinal o DIU de cobre não é um produto caro”, diz —nas farmácias, o dispositivo custa a partir de R$ 100.
A ginecologista reforça a necessidade de a mulher criar um vínculo com os profissionais de saúde para se sentir segura. “Ela não deveria ter que trocar de ginecologista toda hora”, diz.
“O DIU é muito mais barato para o estado do que uma gravidez indesejada. Ele é um dos métodos de maior eficiência”, diz.
Resposta
Em nota, a Secretaria Municipal da Saúde afirma que providencia a compra de 13 mil unidades de DIU (dispositivo intrauterino) para o reabastecimento das unidades até dezembro deste ano. "Os dispositivos são enviados pelo Ministério da Saúde, e neste ano, a SMS não recebeu o material", diz a nota. A pasta afirma ainda que recebeu doação da Secretaria de Estado da Saúde, que foi absorvida pela rede.
A secretaria diz também que tem ampliado o modelo Estratégia de Saúde da Família, cuja responsabilidade pelo atendimento à mulher é por médicos generalistas, capacitados para inserção do DIU e prescrição do anticoncepcional na rotina de atendimento.
"Além da consulta na Estratégia de Saúde da Família, as pacientes poderão participar dos grupos de planejamento familiar nas Unidades Básicas de Saúde, momento em que suas necessidades serão esclarecidas e serão oferecidos os métodos disponíveis como o preservativos masculino, feminino e o diafragma, que não necessitam de receita médica", diz.
As unidades da zona Sul mencionadas na reportagem (UBSs Arrastão e Jardim Miriam 2) são do modelo PSF (Programa Saúde da Família), explica a pasta, com suporte das equipes ESF (Estratégia Saúde da Família), com médicos generalistas. "Caso haja necessidade, os pacientes são encaminhados para suas UBS de referências. Em Campo Limpo, são encaminhados para as unidades Jardim Marcelo e Parque Maria Helena e em Santo Amaro/Cidade Adhemar [SACA], para o Ambulatório de Especialidades [AE] Alto da Boa Vista e Assistência Médica Ambulatorial Especialidades [AMAE] Vila Constância", afirma.
Procurado, o Ministério da Saúde não respondeu até a conclusão desta reportagem.
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