Comércios não essenciais buscam alternativas para se manter na fase vermelha do plano SP

Alguns estabelecimentos também descumpriram medidas restritivas ao servir almoço e permitir que roupas fossem provadas nas lojas

Alfredo Henrique Gabriela Bonin
São Paulo

Comerciantes de serviços não essenciais da capital paulista buscam alternativas para manter suas atividades durante a fase vermelha do Plano São Paulo, a mais restritiva para evitar eventuais contaminações pelo novo coronavírus. Somente a retirada de produtos, como roupas e calçados, previamente negociados, foi uma das formas encontradas para manter lojas abertas.

Alguns comerciantes, porém, também foram vistos na manhã desta quarta-feira (10) desrespeitando as medidas, ao oferecer e servir almoço em uma padaria, na zona leste, ou ainda permitindo que clientes provassem roupas em uma loja, na região central.

O governo de São Paulo, gestão (PSDB), colocou todo o estado na fase vermelha desde a 0h de sábado (6). A medida valerá até o próximo dia 19 para tentar barrar a evolução da curva de infecções, óbitos e internações devido ao novo coronavírus.

Por volta das 11h40, a rua 25 de Março, famosa via de comércio popular, estava basicamente ocupada por policiais militares, vendedores ambulantes e "puxadores" — representantes de lojas que abordam clientes nas calçadas, indicando a entrada de comércios, onde são geralmente oferecidos calçados, roupas e itens de tabacaria.

A reportagem foi insistentemente abordada pelos puxadores. Um deles chegou a sacar um bolo de cartões, nos quais havia vários tipos de produtos. "O que o senhor quiser, eu posso oferecer, patrão", afirmou, sem saber que falava com a reportagem. Alguns dos puxadores chegaram a entrar na frente de possíveis clientes, que no fim da manhã desta quarta eram raros na rua de comércio popular.

Ainda na 25 de Março, ambulantes comercializavam roupas íntimas, bijuterias e miudezas, perto de alguns comércios, principalmente de roupas e calçados, que mantinham as portas abertas totalmente, ou até a metade, atendendo quem os solicitasse. De forma geral, porém, a maioria dos estabelecimentos estava fechada.

Poucas pessoas circulavam pela rua 25 de Março, famosa via de comércio popular, na manhã desta quarta-feira (10). Os raros clientes que passavam pelo local eram abordados por "puxadores", pessoas que indicam comércios em funcionamento, de forma irregular, na região. - Eduardo Knapp/Folhapress

Na rua General Carneiro, lojas de roupa também atendiam clientes com esquema semelhante ao da 25 de Março. Algumas não permitiam a entrada nos locais, fazendo com que clientes aguardassem para pegar produtos e irem embora em seguida. Já outras lojas, permitiam a entrada de pessoas, deixando-as livres para escolher produtos e, inclusive, os provar.

Assim que a reportagem adentrou ao comércio, a porta foi fechada e uma vendedora ofereceu álcool em gel para higienização. O gerente do estabelecimento mostrou opções de calças.

O gerente afirmou atender um cliente por vez, acrescentando fazer isso para pagar o aluguel do lugar. "Nosso rendimento caiu mais de 50%. O lucro que temos aqui é só para garantir nosso ponto. Todos meus gastos pessoais estou bancando com dinheiro que guardei para emergências", explicou.

Evangélico, o comerciante afirmou não ir aos cultos de sua igreja, na qual ocorrem aglomerações. "O governo deveria proibir os cultos, e olha que quem está falando isso é uma pessoa evangélica", destacou. Apesar de o estado estar na fase vermelha, cultos religiosos estão permitidos, desde que respeitem medidas de prevenção à Covid-19.

Já outros estabelecimentos, na mesma via, tinham menos pudor e vendiam com portas abertas roupas, calçadas e artigos para celular.

Mais adiante, na rua Direita, comércios vendiam produtos com as portas fechadas. Para os identificar, bastou observar se havia alguma pessoa em frente às portas, controlando o acesso de clientes.

Rua José Paulino, na região do Bom Retiro (centro de SP), estava vazia nesta quarta-feira (10). Alguns comércios, porém, atendiam irregularmente clientes, descumprindo a fase vermelha do plano São Paulo, a mais restritiva, decretada pelo governo estadual na tentativa de brecar o aumento de casos e mortes decorrentes da Covid-19 - Eduardo Knapp/Folhapress

Segundo a Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico, gestão João Doria (PSDB), comércios não essenciais podem atender clientes, até permitindo a entrada deles nos locais, desde que as pessoas vão aos estabelecimentos somente para retirar produtos, permanecendo o mínimo tempo possível dentro das lojas. O sistema delivery também está liberado.

A reportagem avistou alguns fiscais circulando pelo centro, mas isso não inibiu as atividades irregulares.

Lojas de departamento também funcionavam na região, mas aparentemente sem controlar o fluxo de clientes. Na rua 25 de março, um destes estabelecimentos estava cheio de clientes, se aglomerando em corredores estreitos e em um imóvel sem ventilação.

Zona leste

Na zona leste da cidade a reportagem flagrou comércios de móveis e colchões atendendo clientes, além de uma padaria, onde almoços eram servidos no local, o que atualmente é proibido por causa da fase vermelha do Plano São Paulo.

Parte dos estabelecimentos não permitia a entrada dos clientes. Uma mesa ou fita de segurança bloqueava a entrada e o funcionário ficava na porta realizando as vendas. Em outros, a entrada e saída de pessoas estava liberada, assim como a permanência dentro da loja.

“Estamos abertos desde sábado e vamos continuar normalmente essa semana, se ninguém aparecer para fechar”, afirmou uma vendedora, que preferiu não se identificar. A loja de roupas em que trabalha tinha clientes nos provadores experimentando itens. “Não é só a gente. Também tem outras lojas de roupa, lojas de bolsa [atendendo clientes]", acrescentou.

Na avenida Rio das Pedras, logo após o meio-dia, uma padaria servia o almoço de clientes, dentro do estabelecimento. Cerca de dez pessoas comiam no local, enquanto funcionários serviam as mesas, que estavam próximas umas das outras.

“A movimentação está menor aqui na avenida”, conta Raimundo Francisco do Nascimento, 77, que trabalha como vendedor ambulante próximo ao shopping Aricanduva. Em seu carrinho, ele vende salgadinhos, água, refrigerantes, e doces em geral. “Tudo industrializado, embalado, por causa da higiene e porque o prazo de validade é maior”, explicou.

Já com a primeira dose da Coronavac tomada, Raimundo continua trabalhando normalmente desde sábado (6), início da fase vermelha, mesmo tendo receio de ser contaminado pela Covid-19. “Tenho medo, mas tenho contas para pagar”, justificou.

Resposta

A Vigilância Sanitária estadual, gestão João Doria (PSDB), afirmou ter autuado 19 estabelecimentos na capital paulista que descumpriram as regras do Plano São Paulo, entre as noites de sexta-feira (5) e domingo (7).

No trabalho de campo, acrescentou a vigilância, equipes verificam tanto o cumprimento do Plano São Paulo e do "toque de restrição" quanto a obrigatoriedade do uso de máscaras. "Estabelecimentos com aglomerações podem ser autuados e até interditados", diz trecho de nota. O descumprimento da regras pode gerar multa de até R$ 290 mil.

A Secretaria Estadual de Desenvolvimento Econômico afirmou que comércios não essenciais até podem manter as portas abertas, porém para que clientes retirem produtos nos locais, previamente comprados, como pela internet, por exemplo. Está proibida, porém, a permanência de pessoas em estabelecimentos, incluindo essenciais, como padarias.

A Prefeitura de São Paulo, gestão Bruno Covas (PSDB), não havia se manifestado até a publicação desta reportagem.

Em nota enviada sábado (6), após questionamento do Agora sobre descumprimento de comércios na região central, no primeiro dia da fase vermelha, a gestão afirmou que segue as regras do Plano São Paulo e que agentes municipais apoiam a fiscalização do governo do estado.

"A prefeitura esclarece que a atribuição legal para fazer a fiscalização das definições estabelecidas pelo decreto estadual é da polícia", afirmou na ocasião.

A Polícia Militar também diz que realiza ações de fiscalização para evitar aglomerações junto com as Vigilâncias Sanitárias e agentes de fiscalização dos municípios.

​O governo estadual, assim como o municipal, não se manifestou sobre os casos mencionados nesta reportagem.

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