Santa Marina consegue liminar na Justiça para continuar com campo de várzea em SP

Ministério Público defende que área na zona oeste da capital tem valor histórico-cultural em ação contra multinacional

Continue lendo com acesso ilimitado.
Aproveite esta oferta especial:

Oferta Exclusiva

6 meses por R$ 1,90/mês

SOMENTE ESSA SEMANA

ASSINE A FOLHA

Cancele quando quiser

Notícias no momento em que acontecem, newsletters exclusivas e mais de 200 colunas e blogs.
Apoie o jornalismo profissional.

São Paulo

O Santa Marina Atlético Clube, tradicional clube da várzea paulistana na região da Água Branca (zona oeste de São Paulo), conseguiu uma liminar na Justiça para continuar com o campo de futebol onde atua há mais de 100 anos. A ação foi por meio da Promotoria de Justiça do Meio Ambiente do Ministério Público de São Paulo.

A área, que também conta com sala de equipamentos, troféus e vestiários, estipulada em 9.232 m² e avaliada em R$ 86 milhões no número 833, da avenida Santa Marina, na Água Branca, pertence à empresa Saint-Gobain Participações, multinacional que entrou com ação de reintegração de posse em 2020.

Com a liminar, a empresa fica obrigada a preservar instalações físicas, acervo e atividades do clube até que seja decidido sobre a determinação de seu valor histórico, cultural e social, a fim de se evitar risco de perda e deterioração do patrimônio existente. Cabe recurso na ação.

A multinacional diz estar empenhada em uma solução para o impasse e que ainda não foi formalmente citada.

“A preservação de patrimônio é matéria de relevo à sociedade: representa conhecimento e domínio sobre o passado, para que seja apresentado ao futuro”, diz a juíza Camila Rodrigues Borges de Azevedo, da 19ª Vara Cível Central de São Paulo, na liminar.

A juíza deu um prazo de 15 dias úteis para a empresa contestar a decisão. “A ausência de contestação implicará revelia e presunção de veracidade da matéria fática apresentada na petição inicial”, escreve.

Sala de retratos com as fotos dos esquadrões do Santa Marina, centenário clube de várzea da zona oeste de São Paulo - Danilo Verpa/Folhapress

O promotor de Justiça Geraldo Rangel de França Neto afirma na petição inicial que o clube Santa Marina possui importante valor histórico-cultural, pois sua formação remonta ao ano de 1913, com trabalhadores da vila operária da extinta vidraria de mesmo nome.

Apesar disso, a Saint-Gobin, segundo o promotor, não possui projeto para manutenção do patrimônio, pretendendo destinar a área para outras finalidades, o que coloca em risco todo o patrimônio histórico e cultural representado pelo acervo e pelas instalações do clube.

“O direito busca preservar a história, de modo a garantir às presentes e às futuras gerações o conhecimento e a vivência dessa história”, diz França Neto.

Presidente do clube, Francisco Ingegnere disse que já estava embalando os troféus e pensando para onde poderia ir. Isso porque na primeira notificação, ele deveria ter desocupado o terreno até o último dia 7 de agosto. Ação que a liminar barrou.

“Eu estava em choque e perdido porque não tinha para onde ir. Já estava embalando tudo. Ainda bem que conseguimos segurar essa reintegração, já traz um grande alívio. Não queremos sair daqui”, afirma.

Francisco Ingegnere, 67 anos, presidente do Santa Marina Atlético Clube - Danilo Verpa/Folhapress

“Nós não invadimos esse lugar. Eu e muitas outras pessoas nascemos aqui e são 108 anos de história. Só queremos o nosso direito”, completa o presidente.

Caio Marcelo Dias, do escritório Dias Advocacia, que defende o Santa Marina, lembra que a "ordem liminar concedida mantém a continuidade do clube". "Por ora, estamos mantidos na posse da área”, afirma.

História

O Santa Marina Atlético Clube foi fundado no ano de 1913 por trabalhadores da Companhia Vidraria Santa Marina. Naquela época as empresas tinham o costume de oferecer aos seus empregados trabalho, moradia e também era comum ceder espaço para fundação de clubes.

Foi assim que o Santa Marina se criou no local. Sem nenhum documento, utilizava a área com base em sua história. A Companhia Vidraria Santa Marina, contudo, após passar por problemas financeiros, se associou com a Saint-Gobain durante a década de 1960.

A sala de troféus mostra a história campeã do Santa Marina, tradicional clube de Várzea da cidade da zona oeste de São Paulo - Danilo Verpa/Folhapress

Resposta

Em nota à reportagem, a Saint-Gobain diz que sempre esteve disponível e aberta ao diálogo com o Santa Marina Atlético Clube a fim de encontrarem, em comum acordo, a melhor solução para ambas as partes em relação ao terreno. A empresa ainda diz que o contrato de comodato utilizado pelo clube expirou em 2019.

“Ao longo desses anos, a empresa sempre atuou de maneira transparente junto às lideranças do Clube para buscar alternativas na resolução do tema”, afirma.

Sobre a ação civil pública do Ministério Público, a empresa diz que não foi formalmente citada pelo órgão até o presente momento.

“O Grupo Saint-Gobain reitera seu empenho na solução desta questão da melhor forma possível”, destaca a nota.

Notícias relacionadas