Precatório do INSS fica sob ameaça de confisco com crise do coronavírus

Tribunais chegaram a comunicar atraso e proposta no Congresso sugere adiamento

São Paulo

A necessidade do governo ter dinheiro em caixa para enfrentar a crise provocada pela pandemia do novo coronavírus tem colocado sob ameaça o pagamento do lote deste ano de precatórios federais, cuja maioria dos beneficiários é composta por aposentados, pensionistas e segurados do INSS.

Rumores sobre o risco de confisco dos cerca de R$ 21 bilhões previstos para o pagamento destas dívidas vêm ganhando corpo nos bastidores do Judiciário desde o final de março.

Na ocasião, sites de TRFs (Tribunais Regionais Federais) disponibilizaram comunicados a credores de precatórios afirmando que o cronograma de pagamentos sofreria alterações devido às ações de combate aos efeitos econômicos da Covid-19. Os informes, porém, foram retirados.

Com poucas exceções, os precatórios federais são tradicionalmente pagos em abril. O prazo oficial para o governo quitar a dívida, porém, acaba ao final de dezembro.

Confira aqui quem tem direito de receber atrasados do INSS em 2020.

A ameaça de retenção das verbas destinadas aos precatórios tomou forma de propostas no Congresso, com destaque para um projeto de decreto legislativo do senador Otto Alencar (PSDB-BA).

Em sua conta no Instagram, o congressista defendeu a necessidade de obter recursos para evitar a “inaceitável” morte “de compatriotas por falta de respiradores.” A reportagem não conseguiu contato com o senador.

A intenção de destinar recursos de precatórios ao combate à crise gerou protestos de advogados que defendem credores da Previdência e motivou uma nota técnica, com críticas ao projeto, assinada pelo presidente da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Felipe Santa Cruz.

O projeto, previsto para ser votado nesta quarta-feira (15) no Senado, acabou sendo retirado da pauta.

“A retirada da proposta não acaba com a ameaça, pois sabemos que há outras visando utilizar esses recursos para enfrentar a pandemia”, afirma o presidente do Ieprev (Instituto de Estudos Previdenciários), Roberto de Carvalhos Santos.

Para o advogado Rômulo Saraiva, o confisco de precatórios abalaria a segurança jurídica do país e a confiança no governo. “Isso só seria comparável ao confisco das poupanças no governo Collor.”

Procurados, o Tesouro e o Conselho da Justiça Federal não responderam até a conclusão deste texto.

No início do mês, o Ministério da Economia havia informado à reportagem que recursos reservados para pagamento de precatórios não estavam sendo considerados no combate aos efeitos da Covid-19 na economia.

Quem pode receber um precatório em 2020

Entra no lote de precatórios de 2020 quem teve o pagamento autorizado entre 2 de julho de 2018 e 1º de julho de 2019.

O cidadão que ganha uma ação judicial contra um órgão público costuma ter direito a valores retroativos, também chamados de atrasados.

Quando a Justiça define qual o valor a ser pago pelo Poder Público, ocorre a emissão de uma ordem para esse pagamento.

Na Justiça Federal, essas ordens de pagamentos recebem os nomes de RPV (Requisição de Pequeno Valor) ou de precatório.

Para ser um precatório, o valor precisa estar acima de 60 salários mínimos. Quando a dívida judicial do governo federal fica abaixo de 60 salários mínimos, ela vira uma RPV.

Diferentemente do precatório, que é pago em um lote anual, as RPVs são liberadas em 12 lotes mensais. Não há, até o momento, registro de atraso nos pagamentos mensais de RPVs.

Nesta quarta-feira (15), o TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região), responsável por pagar credores da União dos estados de São Paulo e Matogrosso do Sul, informou que os processamentos de RPVs estão ocorrendo normalmente durante a quarentena para combate à pandemia.

Precatórios e RPVs são pagos por meio de contas judiciais abertas na Caixa Econômica Federal ou no Banco do Brasil.

Para obter informações sobre o pagamento, o cidadão que tem um ação contra o governo deve manter contato com o seu advogado ou acessar o site do Tribunal Regional Federal, em ações contra a União, responsável pela região onde o processo foi iniciado.

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