As queixas por falhas na cobrança da conta de luz por parte da Enel São Paulo dispararam no Procon-SP. Em julho, o órgão recebeu 40 mil reclamações, quando, em meses normais, a média é de 600 queixas.
Diante da explosão de casos, o MP-SP (Ministério Público de São Paulo) está investigando, por meio de inquérito civil, supostas práticas abusivas adotadas pela empresa na cobrança da conta de energia elétrica dos clientes da capital e região metropolitana nos meses de junho e julho.
O inquérito foi aberto pelo promotor Marcelo Orlando Mendes após solicitação feita pelo Procon-SP.
O aumento nas contas está relacionado à pandemia de Covid-19. Entre março e o início de junho, a Enel havia suspendido o trabalho de leitura nos medidores dos clientes. A medida foi tomada para proteger clientes e funcionários da contaminação pelo novo coronavírus.
Neste período, uma das soluções encontradas pela empresa foi cobrar dos consumidores o valor referente à média de consumo dos últimos 12 meses no caso de quem não fazia a autoleitura, prática indicada pela concessionária e pela Aneel (agência federal de energia).
Os valores, que em alguns casos chegam a triplicar, têm sido motivo de queixas dos consumidores, que enfrentam longas filas e aglomerações, em meio à pandemia de coronavírus, para tentar uma solução por parte da empresa de energia.
Sem conseguir atendimento a distância para resolver a situação, eles têm se aglomerado em frente à sede da empresa para buscar solução, com risco de contaminação pelo novo coronavírus.
As contas de julho em diante contêm mais um fator que pesa no bolso do consumidor: no dia 4 de julho, entrou em vigor um reajuste médio de 4,23%. Para os consumidores residenciais, alta da tarifa foi de 3,61%. Com isso, os clientes foram cobrados com a tarifa nova por um consumo feito antes do reajuste da energia.
As faturas que vieram aumentadas em razão do consumo registrado de março a maio podem conter ainda mais um item encarecedor: o ICMS. Pela lei estadual, a alíquota do imposto cobrado na conta de luz varia por faixas: clientes residenciais que consomem até 90 kWh (quilovatts-hora)por mês ficam isentos; entre 91 e 200 kWh, a alíquota é de 12%. Acima de 201 kWh, o imposto é de 25%.
Enel reconhece valores maiores
O serviço de medição foi reiniciado em junho, segundo explica o diretor de Mercado da Enel Distribuição São Paulo, André Oswaldo Santos. "Com a retomada, a gente verificou com a leitura real que muitos clientes tiveram aumento da conta, porque tinha uma diferença do valor que foi cobrado pela média nesse período em que não teve leitura", diz.
Ele afirma que há casos em que os clientes pagaram mais durante os meses sem medição, como nos de comércios que ficaram fechados durante a pandemia. Nessas situações, Santos garante que foi dado crédito para ressarcimento na fatura seguinte.
Segundo ele, a autoleitura, procedimento em que o cliente fotografa seu medidor e envia para a Enel, foi feita por 1,3 milhão, o que equivale a aproximadamente 8% da base de clientes da empresa.
Para o Procon, houve erro da empresa
O secretário especial de Defesa do Consumidor do estado, Fernando Capez, responsável pelo Procon-SP, considera que a Enel "errou ao se recusar a proceder a leitura" dos medidores. "Isso provocou um acúmulo na cobrança do mês de julho", aponta.
Capez diz que o órgão exigiu da Enel que parcelasse em 12 vezes as faturas com diferença de valores. "A Enel disse que só parcelaria para quem pedisse. Aí ela dificulta o acesso de quem quer fazer o pedido", diz.
Na visão do secretário, a postura da concessionária nesse caso fere o Código de Defesa do Consumidor. Por esse motivo, a empresa está sendo multada pelo Procon-SP em R$ 10,2 milhões.
Sobre o ICMS maior, a Secretaria de Estado da Fazenda diz, por meio de nota, que não pode rever as alíquotas de ICMS que incidem sobre a conta de energia elétrica. "Isso exigiria uma mudança na legislação, feita por meio de projeto de lei aprovado na Assembleia Legislativa."
Mesmo viajando, aposentada teve tarifa aumentada
A aposentada Elizabete Silva da Rocha, 70, foi uma das clientes que tiveram problemas com a correção dos valores na conta de luz.
Ela relata que, no início de maio, foi para a casa de uma irmã no litoral paulista, onde ficou até junho. "Pensei que a conta viria zerada, mas em junho, veio a fatura de R$ 107", revela. Segundo Elizabete, a média paga por ela em meses normais varia entre R$ 30 e R$ 40.
Para corrigir o problema, ela diz ter tentado entrar em contato com a Enel pelo telefone, mas não conseguiu. Foi então que a aposentada resolveu ir a uma loja da concessionária, na zona leste de São Paulo. "Fiquei mais de uma hora na fila e o funcionário disse que estava certo", lamenta.
Problema semelhante foi enfrentado pela jornalista Mariana Riscala do Lago, 37. Em março, a conta dela veio no valor de R$ 92, por um consumo de 132 kWh. Entre abril e junho, pagou R$ 78 e, segundo a fatura, consumiu 115 kWh. Porém, em julho, a fatura cobrada foi de R$ 270,54, por 367 kWh.
Entenda o caso
- A Enel SP suspendeu a leitura da luz nos meses de março, abril e maio
- A medida ocorreu por causa da pandemia de coronavírus e seguiu orientações da Aneel (agência de energia elétrica)
Autoleitura
- No período, a empresa indicou que o consumidor fizesse a autoleitura da luz
- Quem não fez pagou a conta pela média
Retomada
- Em junho, a leitura presencial foi retomada
- Quem pagou menos do que o consumido teve a diferença cobrada em julho e agosto
- Também começou a valer reajuste de 3,61% na conta de luz residencial
- Com isso, a energia foi cobrada com tarifa maior e, em alguns casos, o ICMS subiu para 25%
7 milhões
é o total de unidades consumidoras atendidas pela Enel
24 municípios
são cobertos pela empresa
4,23%
é o aumento médio cobrado na conta de luz de clientes de baixa e alta tensão
Fontes: Enel e reportagem
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