O profissional exposto ao risco de contágio pelo novo coronavírus no ambiente de trabalho pode ter direito a benefícios garantidos por lei em casos de doenças ocupacionais, como a estabilidade no emprego e cálculo mais vantajoso para alguns benefícios do INSS.
Mas para ter acesso a esses direitos, o empregado ou seus familiares devem comprovar a negligência do empregador quanto aos cuidados para redução das contaminações durante o exercício profissional.
Em dezembro de 2020, a Secretaria Especial de Previdência e Trabalho publicou uma nota técnica reconhecendo que a Covid-19 pode ser uma doença ocupacional, mas condicionou isso à caracterização do ambiente de trabalho como propício ao contágio.
Com exceção dos profissionais de saúde que estão na linha de frente de combate à doença, cabe ao trabalhador a comprovação de que o exercício profissional gerou a exposição ao novo coronavírus e que seu empregador não adotou as medidas de segurança necessárias, segundo a advogada Monnyse Nunes.
“Ainda não há um posicionamento amplo de juízes, mas o que provavelmente irá ocorrer é que a caracterização da doença ocupacional não ocorrerá se o empregador demonstrar que tomou todos os cuidados”, afirma a advogada.
A categoria que provavelmente agrupa um dos maiores contingentes de trabalhadores expostos ao novo coronavírus é a dos trabalhadores do comércio, principalmente aqueles empregados em setores essenciais, como alimentação e supermercados.
Em São Paulo, um acordo entre empregados e patrões estabeleceu regras que podem servir de orientação para que os trabalhadores avaliem se os seus contratantes podem ou não ser responsabilizados.
“No caso de supermercados e lojas com caixas, exigimos no acordo coletivo a barreira de acrílico entre o caixa e o consumidor, álcool em gel, máscaras fornecidas pela empresas, distanciamento entre os funcionários, marcações no solo e número de pessoas que atenda as normas para evitar aglomeração”, relata Ricardo Patah, presidente do Sindicato dos Comerciários de São Paulo.
Independentemente da comprovação do caráter ocupacional, caso a doença incapacite o profissional por mais de 15 dias, há direito ao auxílio-doença do INSS. Veja abaixo detalhes sobre os direitos do trabalhador infectado pelo novo coronavírus.
COVID-19 | DIREITOS DO TRABALHADOR
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A Covid-19 pode ser considerada uma doença ocupacional, ou seja, relacionada ao exercício profissional para efeitos de concessão de benefícios do INSS
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Ao caracterizar que o contágio ocorreu no ambiente de trabalho, o cidadão passa a contar com um conjunto de proteções legais mais amplas
Exposição
A caracterização da Covid-19 como doença ocupacional é relativamente simples para categorias que estão na linha de frente do combate à pandemia, como enfermeiros, motoristas de ambulância e outros profissionais do setor de saúde.
Para profissionais de outras áreas, demonstrar que o local de trabalho é propício ao contágio requer a observação das condições de trabalho oferecidas pelo empregador aos profissionais obrigados a exercer suas atividades de forma presencial.
Sindicatos das diversas categorias de trabalhadores nestas situações acordaram com o setor patronal algumas normas de segurança que devem ser respeitadas para diminuir o risco de contágio.
Entre os setores em que os trabalhadores estão mais expostos está o comércio, principalmente aqueles considerados essenciais e sujeitos a lidar com públicos muito amplos, como os supermercados.
Em São Paulo, um acordou entre empregados e patrões do comércio traz regras que podem servir de orientação para o trabalhador avaliar se os seus contratantes podem ou não ser responsabilizados. Veja:
- Oferta de máscaras: o empregador deve fornecer máscaras de proteção adequadas e de forma ampla. Não pode faltar máscara!
- Álcool em gel: o produto deve estar disponível e acessível não só para os clientes, mas também para todos os profissionais
- Distanciamento: o distanciamento físico entre os profissionais (uns dos outros) e entre o público deve ser assegurado, inclusive com marcações no solo
- Orientação: a empresa é responsável por orientar quanto às medidas de higiene e de distanciamento para evitar o contágio
- Proteção acrílica: caixas e balcões de atendimento ao público devem estar equipados com barreiras de acrílico para proteger os funcionários
- Controle de público: o estabelecimento deve realizar o controle na entrada para reduzir a circulação de pessoas dentro dos limites estabelecidos pelo governo
Documentação
Em caso de necessidade de afastamento do trabalho devido ao contágio pelo novo coronavírus, a causa do adoecimento deve estar documentada.
A descrição da doença que gera o afastamento do emprego deve estar no CAT (Comunicado de Acidente de Trabalho).
Se o documento não for emitido pelo empregador, algumas medidas podem ser tomadas pelo trabalhador ou por seus dependentes (em caso de morte):
- Solicitar a emissão do CAT ao sindicato da categoria do trabalhador
- Solicitar a emissão do CAT ao Cerest (Centro de Referência em Saúde do Trabalhador)
- Obter fotos, vídeos, emails e testemunhas que comprovem a falta de cuidados sanitários
- Solicitar uma perícia na empresa (determinada pela Justiça ou contratada pelo empregado)
BENEFÍCIOS DEVIDOS AO TRABALHADOR
Remuneração e auxílio-doença
- O trabalhador que recebe diagnóstico de Covid-19 deve ser afastado do trabalho e colocado em isolamento
- As regras para o afastamento e recebimento de auxílio-doença do INSS mudam conforme o perfil do trabalhador
a) Empregado formal
- Ao se afastar da sua atividade profissional por Covid-19, o trabalhador que tem carteira assinada recebe o salário da empresa por até 15 dias
- Se a infecção persistir por mais de 15 dias, o empregado receberá o auxílio-doença pago pelo INSS (Instituto Nacional do Seguro Social)
b) Trabalhador autônomo
- Quem trabalha por conta própria e contribui com o INSS pode receber o auxílio-doença devido à infecção pelo novo coronavírus
- Para ter o benefício, porém, é necessário cumprir as regras de carência de 12 contribuições mensais ou, caso tenha voltado a contribuir, de 6 contribuições
Estabilidade no trabalho
- Em caso de caracterização como doença ocupacional, o afastamento do trabalho (independentemente do período) permite ao empregado exigir estabilidade de 12 meses após o fim do auxílio-doença
Aposentadoria por invalidez
- Para a incapacidade gerada por questões ocupacionais, o benefício é de 100% da média salarial do trabalhador
- Se a invalidez não for relacionada ao trabalho, o benefício é de 60% da média salarial para quem contribuiu por 20 anos ou menos, acrescido de 2% para cada ano a mais de recolhimento
Pensão por morte
- A morte que não resulta de acidente de trabalho pode gerar uma pensão que será paga por apenas quatro meses no caso de beneficiários que realizaram menos de 18 contribuições ao INSS ou se o casamento ou a união estável teve início há menos de dois anos da morte
- Em caso de doença ocupacional, a pensão é paga aos dependentes por um período mínimo de três anos e pode ser vitalícia, a depender da idade do beneficiário
AFASTAMENTOS POR COVID-19
- Os afastamentos do trabalho com pagamento de auxílio-doença pelo INSS por doenças respiratórias aumentaram 166% em 2020
- Os benefícios concedidos com base nas CIDs da família J, relacionada a problemas respiratórios, saltaram de 19,3 mil, em 2019, para 51,3 mil, no ano passado
- A Covid-19 é a principal causa do aumento; doença respondeu por quase 40 mil concessões de auxílio-doença em 2020
- As CIDs B34.2 e B97.2, que correspondem à infecção pelo coronavírus, foram as vice-campeãs de geradoras de auxílio-doença
- A doença perde apenas para problemas no disco lombar, que lideram o ranking com 45,7 mil benefícios por incapacidade temporária concedidos
Fontes: INSS (Instituto Nacional do Seguro Social), Secretaria de Previdência e Trabalho, do Ministério da Economia, IBDP (Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário), Sindicato dos Comerciários de São Paulo, Súmula 378 do TST (Tribunal Superior do Trabalho) e advogada Monnyse Nunes
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