Prefeitura de SP usou veneno vencido contra a dengue, diz sindicato

Agentes de nebulização também relataram que tiveram irritação

São Paulo

Agentes de nebulização da Prefeitura de São Paulo, da gestão Bruno Covas (PSDB), dizem ter usado inseticidas vencidos em maio no combate ao mosquito da dengue, segundo denúncia protocolada pelo Sindsep (Sindicato dos Servidores Municipais de São Paulo) na Secretaria Municipal de Saúde, na terça-feira (24).

Funcionários da prefeitura durante nebulização contra o mosquito da dengue na rua Domingos Marcelino Pereira, na zona norte de São Paulo - Eduardo Anizelli - 2.mai.2019/Folhapress

Funcionários de quatro Uvis (Unidades de Vigilância em Saúde) de três regiões da cidade também relatam que tiveram irritação nos olhos e pele após trabalharem com o veneno, mesmo seguindo procedimentos de segurança.

"Até os moradores reclamaram do cheiro forte do fumacê", disse um agente de uma unidade da zona norte ao Agora, que pediu para não ser identificado.

Fotografias tiradas no último dia 17 por servidores mostram um frasco do inseticida deltametrina, com data de fabricação de maio de 2017. De acordo com a ficha técnica do produto, o prazo de validade é de dois anos --ou seja, o veneno, que continuava em uso, já estava vencido há mais de um mês e meio na data da foto. Segundo o Sindsep, todas as 26 Uvis da capital receberam o lote. 

De três unidades procuradas pela reportagem, duas confirmaram o uso do produto vencido.
Segundo funcionários, a prefeitura começou a distribuir o deltametrina em abril. "Fomos orientados a usar até o fim, mas depois de uma semana do vencimento decidimos devolver o produto, pois sabemos que perde eficácia", disse um agente que atua na zona leste, ressaltando que o material não foi reposto.

Servidores das Uvis afirmam que o problema com material vencido é anterior à distribuição do deltametrina. "Trabalhamos por meses com o malathion (um outro tipo de inseticida) vencido antes de acabarem os estoques, em fevereiro", diz um agente.

Segundo ele, a Covisa (Coordenadoria de Vigilância em Saúde) revalidou o prazo de validade, mas o produto já apresentava sinais de deterioração.

"Além do cheiro, mais forte que o normal, ficou grosso e difícil de diluir. Tivemos várias máquinas com cano entupido e precisaram passar por manutenção", diz.

No início do ano, o Ministério da Saúde solicitou estudos para tentar reaproveitar o inseticida vencido em meio ao avanço da dengue. Depois dos testes, determinou que não estenderia mais o prazo de validade do malathion, pois foram encontrados problemas.

Eficiência

Segundo o supervisor técnico de controle de pragas Osmando Rodrigues, da empresa Protec, o inseticida perde rapidamente a sua eficiência depois do prazo de vencimento. "Usá-lo no fumacê pode não ter efeito nenhum no mosquito," disse Rodrigues.

Desde o início do ano, São Paulo já teve 12.395 confirmações de dengue e 3 mortes pela doença, de acordo com o último boletim epidemiológico da Secretaria Municipal da Saúde, de 18 de junho. Em todo o ano passado, foram somente 586 casos.

Os registros seguem em queda, no entanto - até a data do boletim, foram identificados somente 156 casos em junho, contra 3.561 em maio.

Kits

As UBSs (Unidades Básicas de Saúde) de São Paulo estão sem kits de sorologia, usados para confirmar casos de dengue, há pelo menos 20 dias.

Na tarde desta quarta-feira (26), a reportagem procurou o teste em cinco postos de saúde de diferentes regiões da capital e foi orientada a buscar atendimento em um hospital. Os atendentes informaram que não há previsão de receberem novos materiais.

De acordo com o diretor do Sindsep Alexandre Giannecchini Sallum, isso pode distorcer os números da dengue na cidade e inviabilizar ações de combate ao mosquito transmissor. "Se não há confirmação de novos casos, não são feitas novas nebulizações", disse.

Resposta

Questionada pela reportagem, a Secretaria Municipal da Saúde, sob gestão Bruno Covas (PSDB), afirmou que atendeu todas as normas da Sucen (Superintendência de Controle de Endemias do Estado de São Paulo) ao utilizar os inseticidas deltametrina e malathion, e negou que o primeiro tenha sido usado fora do prazo de validade pelos agentes de nebulização.

A pasta explicou por meio de nota que começou a usar a deltametrina após o Ministério da Saúde interromper o fornecimento do malathion, sem previsão de para restabelecer a distribuição do produto.

"A divisão de Vigilância de Zoonoses optou pela utilização da deltrametrina para não interromper as ações de controle de dengue. O produto é qualificado pelo Ministério da Saúde e OMS (Organização Mundial da Saúde) para controle de Aedes aegypti em ações de saúde pública", afirmou a nota da gestão tucana.

Em relação ao teste rápido para dengue, feito com os kits de sorologia, assessoria de imprensa do órgão afirmou que a Secretaria Municipal da Saúde cumpriu o determinado pelo Plano de Contingência de Arboviroses, oferecendo o material até maio.

O Ministério da Saúde disse que já iniciou processo de substituição de alguns produtos com base nas orientações da OMS, mas não estabeleceu prazos.

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