Pais de alunos ouvidos pela reportagem estão preocupados com a possível volta à aulas em setembro e se as medidas propostas pela governo João Doria (PSDB) serão mesmo efetivas.
“Não existe distanciamento social possível entre as crianças”, diz Wellinton Souza, que tem dois filhos na rede municipal de ensino. Ele e cerca de 80 pais, que fazem parte do grupo de WhatsApp da Emei Gabriel Prestes, na Consolação (centro), já estão trocando mensagens sobre o retorno às aulas presenciais.
O plano de retomada das aulas do governo estadual foi anunciado nesta quarta-feira e somente deverá ser colocado em prática se na data prevista, 8 de setembro, todas as regiões de São Paulo estiverem há 28 dias consecutivos na fase amarela de flexibilização da economia. O retorno das aulas presenciais será para rede pública e privada e em todas as etapas escolares, de creches até o ensino médio. Serão três as etapas de retomada: A primeira, com 35% dos alunos, a segunda, com 70%, e a terceira, com 100% dos alunos.
Muitos pais têm dúvidas sobre como os protocolos de higiene e distanciamento de 1,5 metro entre os estudantes funcionarão na prática, e se as crianças vão aguentar ficar de máscara durante quatro horas seguidas.
“Meus dois filhos têm asma, mas acho que para todos será difícil ficar de máscara o tempo inteiro, pois eles precisam tirá-la para almoçar, escovar os dentes, por exemplo, e será que vão higienizar as mãos para isso? Acho que, neste momento, deveria ser discutido o cancelamento do ano letivo, pois temos recordes de infectados e mortos a cada dia em São Paulo", afirma Souza.
A analista de sistema Carolina Borges tem duas filhas estudando em escolas da rede municipal, na zona sul da capital paulista. Ela não está conseguindo conciliar o trabalho, que já realizava em casa antes da pandemia, com o cuidado em tempo integral das crianças. Mas, mesmo assim, tem resistência em mandar as filhas de 4 e 7 anos para a escola novamente, mesmo que daqui a alguns meses.
“Minhas filhas vão para a escola de van e as crianças ficam umas do ladinho das outras. Vai ser difícil manter o distanciamento. Provavelmente, não vou mandar minhas filhas de volta às aulas em setembro, isso porque tenho o privilégio de não precisar sair de casa para trabalhar" diz. "Mas para algumas mães, que têm que trabalhar mesmo neste período e estão precisando pagar alguém para ficar com os filhos, pode ser bom esse retorno”, conta Carolina.
Outro receio dos pais é quanto às escolas que têm salas de aula pequenas e mal ventiladas, com poucos espaços abertos para a recreação. Alguns apontam ainda a impossibilidade de saber em tempo real sobre o estado de saúde dos professores, funcionários e dos coleguinhas, que voltarão a estar em contato com seus filhos todos os dias.
Para a cientista social Maia Gonçalves, mãe de um menino de 7 anos matriculado na Emef Jean Mermoz, na Chácara Inglesa (zona sul), o cronograma de retorno aumenta as disparidades na educação: “Os pais são colocados em um dilema. Essa é mais uma forma de pressão sobre as famílias que já se sentem culpadas quando não têm condições de prover internet para as aulas online ou que precisam trabalhar fora e não têm com quem deixar os filhos. Está sendo ignorado, porém, o fato de que as casas podem ter parentes do grupo de risco, com comorbidades, além da exposição dos professores.”
Ana Santos é mãe de dois meninos, um de 9 anos, que frequenta a Escola Estadual Roque Teophilo, e outro de 12 anos, que estuda na Escola Municipal Antonio Pereira Ignacio, na zona leste de São Paulo. Ana não pretende mandar os filhos de volta às aulas este ano.
“Na rede pública aqui da periferia nem tem água direito, imagine a higienização necessária. Muitos pais não acreditam no vírus nem usam máscaras. O meu filho mais velho tem aulas online e o mais novo está com os livros que mandaram para ele, sendo assim, pretendo ajudar por aqui mesmo. A vida dos deles é mais importante nesse momento; o conhecimento nós vamos atrás e recuperamos”, afirma.
Resposta
A Secretaria Estadual de Educação disse em nota que ainda avalia a manutenção das aulas online durante a primeira etapa do retorno. E que fará um processo de reforço da aprendizagem pra recuperar os estudantes que perderam aulas para que nenhum fique para trás.
Volta às aulas - como deve ser
Cronograma
- Retorno previsto para 8 de setembro
- Válido para escolas públicas e privadas
- Inclui do ensino infantil ao superior
- Atrelado à permanência das regiões na fase amarela do Plano SP (prevê abertura controlada de comércio e serviços a 40% da capacidade, além de bares e salões de beleza)
Fases do retorno
1ª etapa: salas terão ocupação máxima de 35% dos alunos
- Todas as regiões do estado devem estar na fase 3 da reabertura por pelo menos 28 dias
2ª etapa: salas terão ocupação máxima de 70%
- Pelo menos 60% das regiões do estado devem estar na fase 4 de reabertura por pelo menos 14 dias
3ª etapa: salas terão ocupação máxima de 100%
- Pelo menos 80% das regiões do estado devem estar na fase 4 de reabertura por pelo menos 14 dias
Critérios
- Poderá ocorrer revezamento de alunos, se necessário
- Uso obrigatório de máscara
- Distanciamento de 1,5 metro entre os estudantes em sala
- Alunos não poderão entrar na escola fora do dia de seu cronograma
- Qualquer tipo de evento segue suspenso (feiras, palestras, competições esportivas)
- Intervalo deverá ter revezamento de estudantes
- Horários de entrada e saída fora do horário de pico
- Fornecer água potável individualizada
- Manter janelas e portas abertas
- Remover o lixo 3 vezes por dia (mínimo)
- Orientar a família sobre as novas normas
- Medir a temperatura em cada entrada da pessoa na escola
Aulas
- Conteúdo online segue ministrado
- Professores deverão dar aulas presenciais considerando o conteúdo disponibilizado pela internet
- Aulas presenciais poderão ser transmitidas para os outros alunos
- Todos os alunos da rede estadual terão aulas presenciais ao menos 1 dia por semana
- Rede particular poderá definir melhor forma de revezamento de alunos, conforme sua estrutura física
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