Vovôs do esporte encontram forma de driblar sedentarismo

Distanciamento social durante a pandemia limita, mas não tira os idosos da rotina de treinos

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São Paulo

A pandemia trouxe um dilema para idosos que têm na atividade física regular um estilo de vida e que se viram, nos últimos meses, ameaçados pelo novo coronavírus. Mesmo diante das limitações impostas pela Covid-19, muitos “vovôs do esporte” fazem questão de manter viva a rotina de exercícios na esperança de seguirem saudáveis por muitos anos.

O advogado Luiz Heitor Mayer, aos 71 anos, pedala, faz caminhadas e mergulho para manter uma boa forma física
O advogado Luiz Heitor Mayer, aos 71 anos, pedala, faz caminhadas e mergulho para manter uma boa forma física - William Cardoso/Folhapress

Cercados de cuidados, mas na ativa. Máscara, álcool em gel e evitando os grupos e aglomerações, as pessoas acima de 60 anos que são viciadas em esporte dizem que não conseguem parar por nada. O administrador de empresas Paulo Henrique Possebon, 73, é um exemplo. Ele frequenta o parque da Aclimação (zona sul) três a quatro vezes por semana e, mesmo quando os portões estavam fechados pela prefeitura, seguiu intercalando corridas e caminhadas. “Andei no entorno do parque. Nunca deixei de fazer meu exercício diário”, afirma. “Mas continuo na minha quarentena. Tomo o maior cuidado. Como todo mundo, sigo na expectativa dessa reabertura controlada”, fala.

Possebon diz que sempre praticou esportes na vida, do futebol ao basquete, e que, ao lado da mulher, sempre procurou se manter saudável. “É triste quando você vê uma pessoa de certa idade prostrada.”

Adaptação

“Não tenho nada contra, mas não pretendo passar a minha aposentadoria jogando gamão. Prefiro um esporte de aventura, viajar para mergulhar, andar de bicicleta”, afirma o advogado Luiz Heitor Mayer, 71.
A paixão pelas pedaladas veio depois que a artrose de quadril e joelho o tirou das quadras de tênis. No parque Ibirapuera (zona sul) ou no condomínio onde tem casa em Boituva (121 km de SP), a bicicleta é uma boa companhia. “A gente tem que se adaptar aos poucos às deficiências do próprio físico.”

Adaptação que o leva a se manter ativo até debaixo d’água. Em 2019, fez duas viagens internacionais de mergulho. Além dos esportes, Mayer conta que se dedica a outra atividade intensa e feliz: ajudar a cuidar dos três netos. “É a melhor coisa que existe!”

Idosos chamam a atenção pela resistência física e boa forma

Quem frequenta o parque da Aclimação (zona sul) já deve ter cruzado com duas pessoas que, embora façam parte da melhor idade, chamam a atenção pela resistência e preparo físico. São atletas que parecem desconhecer a passagem do tempo.

O médico Chen Jen Shan, 66, é um deles. “Quando o parque esteve fechado, eu corria na rua, mas evitando cruzar com outras pessoas. Se parar, enferruja, principalmente depois dos 40 anos”, conta. Além da corrida, Chen faz barras, alteres e elástico em casa. Críticas, ele guarda para quem não respeita distanciamento e uso de máscara no parque. ”É a maior segurança”, diz.

O aposentado Atsuo Kochi, 72, é capaz de dar 20 piques seguidos em uma subida íngreme de 100 metros no parque. Fruto da dedicação à corrida, dos 800 metros à maratona, desde os 28 anos, quando abandonou o alpinismo. “Era muito perigoso”, diz.

Com o parque fechado, correu na vizinha avenida Pedra Azul. “É bom para a cabeça, raciocínio. Meu objetivo é correr até os 100 anos. Japonês tem costume de fazer atividade até morrer”, diz. Kochi conta que ninguém na família seguiu o seu exemplo. “A minha única esperança é o meu neto, de 6 anos. Ele gosta de correr e tem resistência.”)

Gestor afirma que se livrou de infartos com a rotina de corridas

O gestor de investimentos Odair Senra, 73 anos, carrega consigo pontes de safena e mamárias. Leva também uma rotina de mais de 30 km de corrida por semana. “Por causa da corrida, eu me salvei de sofrer infartos”, contou, nesta semana, enquanto se exercitava no parque Ibirapuera.

Viúvo, Senra tinha a mulher como parceira em corridas de revezamento. Hoje, desperta o cuidado dos filhos. “Com essa pandemia, meus filhos quase me trancaram em casa. O mais velho colocou uma esteira, então passei a fazer 15 km por semana, com isolamento total. Agora, estou voltando”, diz. “Faz bem para o corpo e para a alma”, disse.

Parceiro de corrida de Senra no Ibirapuera, o empresário Alberto Banach, 63, tem 51 maratonas no currículo e não conseguiu ficar trancado, mesmo no período mais crítico da pandemia. “Fui para Juqueí correr na praia. Quando retornei a São Paulo, seguindo todos protocolos, continuei correndo todos os dias.”

A rotina de Banach o leva a correr de 12 km a 15 km diariamente. O empresário contou que faz isso pela saúde. “Não vou a restaurante, não encontro pessoas, mas tenho mantido a atividade física. Faz bem para a minha cabeça”, afirma.

Enfermeira segue ativa com média de 50km semanais

A enfermeira aposentada Maria José da Silva, 64 anos, também se manteve ativa durante o período da pandemia. Primeiro, correndo dentro do próprio apartamento, na Vila Mariana (zona sul). “São 12 metros da sala até o quarto. Cheguei a fazer 12 km de uma só vez”, diz Maria José.

O espaço era pequeno demais para ela, que tem no currículo ultramaratonas como a Comrades, famosa prova de 89 km de distância que reúne corredores do mundo inteiro na África do Sul, concluída por ela em 2012 em pouco mais de 11h34. Desde então, só não voltou para lá em 2015, por causa do surto de ebola, e agora, devido ao coronavírus. Também já correu a maratona de Nova York (EUA) e na Grande Muralha, na China, entre tantas. “A atividade física é tudo na vida da pessoa. É onde ela se distrai, esquece dos problemas, chega aonde jamais imaginou que fosse chegar”, afirma.

Firme e forte, a enfermeira aposentada mantém hoje rotina de cerca de 50 km de corrida por semana. “Preciso fazer alguma coisa para queimar a energia”, diz. (WC)

Infectologista recomenda cautela aos idosos

O infectologista Hélio Bacha recomenda cautela para os idosos que desejam praticar atividades físicas durante o atual período, seguindo as recomendações médicas. O especialista explica que há duas situações conflitantes em jogo, que é o risco pela exposição ao vírus e a manutenção do condicionamento físico.

“Apesar do bom condicionamento físico, a pessoa tem tantas condições de se infectar quanto os demais”, diz o infectologista. “Mesmo com a boa condição física, a pessoa deve procurar fazer exercício sem contato com outras pessoas e usando máscara. Deve também evitar ambientes como academias”, afirma.

Educador sugere horário tranquilo

Educador físico e sócio da assessoria esportiva MPR, Cesar de Oliveira diz que alunos na melhor idade estão retornando aos treinos cardiorrespiratórios, seguindo algumas recomendações. “Vir nos horários mais tranquilos do parque, bem cedo. Usar máscara e álcool em gel”, diz.

Oliveira explica que a socialização é importante para pessoas acima dos 60 anos, mas que é preciso manter o distanciamento. “Não dá para juntar um grupo de 20 pessoas para fazer a caminhada.”

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