Descrição de chapéu Zona Leste

Paciente levado de ambulância é recusado em hospital na zona leste de SP

Homem com suspeita de Covid-19 foi transferido para unidade da Vila Alpina após passar por UPA

São Paulo

“Eu não sei mais o que fazer”, diz a auxiliar de limpeza Sirlene Gomes, 39. O desabafo é sobre a situação do marido, Marco Aurélio Panacho, 34, que, segundo ela, chegou ao Hospital Estadual Vila Alpina (zona leste), mas não conseguiu a vaga nesta quarta-feira (3).

O aposentado foi levado ao hospital de ambulância, transferido da UPA Ermelino Matarazzo, onde estava desde a noite de terça (2). Com falta de ar e dor no peito, a suspeita era de Covid-19 —o resultado do teste não havia saído, mas a internação foi negada.

Segundo a Secretaria Municipal da Saúde, o o encaminhamento só foi feito porque o hospital aceitou a internação. A pasta estadual, porém, disse que avaliação médica não indicou necessidade de se internar.

“O paciente tem histórico de comorbidades e tentou, inclusive, evadir antes da liberação médica. A família foi orientada no momento da alta e todas as orientações para tratamento regular sobre outras patologias também foram prestadas”, disse a secretaria estadual sobre o paciente.

O hospital da Vila Alpina é uma das quatro unidades estaduais da capital que restringiu, desde segunda-feira (1º), o atendimento a pacientes graves encaminhados de outras unidades —o modelo “porta fechada”.

A medida tem gerado protestos, como no Itaim Paulista, também na zona leste.

Outras unidades estaduais que também passaram a atender somente casos graves desde a última segunda são no Grajaú e na Pedreira, ambos na zona sul.

Mas nem todos os pacientes sabiam. Febre, dor de garganta e dor de barriga eram os sintomas da pequena Julia, 3. A mãe dela, Joana Maria Miranda, 26, diz que a criança já havia recebido atendimento no Hospital Infantil Cândido Fontoura e que a suspeita era de Covid-19. Em nenhuma das unidades, contudo, ela conseguiu fazer o teste.

“Estou voltando para casa sem saber. Aqui [Vila Alpina] disseram que não tinha como fazer o teste.”
Com dor de ouvido, a estudante Camille Oliveira, 17, teve que dar meia-volta da porta do pronto-socorro. “Estou morrendo de dor, não consigo nem mexer a cabeça”, afirmou. Ela chegou ao Vila Alpina após ter dito buscar atendimento num posto de saúde, que ela não citou o nome.

“Vamos ter que gastar de novo com a condução para descobrir onde ela poderá ser atendida”, afirmou a irmã Jeniffer Oliveira, 20.

Fluxo correto

A porta de entrada para pacientes com sintomas leves da Covid-19 tem que ser a unidade de atenção primária, seja uma AMA ou uma UBS, segundo Gonzalo Vecina Neto, professor de saúde pública da Faculdade de Medicina da USP (Universidade de São Paulo).

“Essa cultura [de procurar um hospital com queixas leves] está errada, temos que mudar. Mas para mudar, tem que ter uma rede básica funcionando adequadamente. O ruim é o paciente chegar no centro de saúde e ouvir que não vai ser atendido”, diz o especialista.

O correto, afirma o professor, é que os hospitais de alta complexidade só recebam pacientes encaminhados de outros serviços.

Segundo ele, mesmo com a pandemia e o aumento de atendimentos pela Covid-19, o momento é o adequado para a reformulação do fluxo do atendimento.

“Se deixar para o tempo de bonança, não vai fazer. Agora os prontos-socorros estão lotados, então temos que diminuir a ida aos hospitais”, afirma.

Protestos

A restrição do atendimento nas unidades estaduais tem gerado insatisfação. Na manhã desta quarta-feira (3), houve protesto no Hospital Geral do Itaim Paulista (zona leste), contra a medida. Na frente do hospital Vila Alpina, uma faixa pedia que a restrição fosse revista.

Eriosvaldo Lima, 58 anos, membro do conselho gestor da UBS Vila Itaim, afirma que a medida vai ser uma “perda grande” para os moradores da região.

“O único hospital próximo da nossa região é esse [Itaim Paulista]. Sem ele, para onde uma emergência vai?”, questiona ele.

Outra reclamação é que a decisão do fechamento do pronto-socorro não foi acordada com a população. “Fomos pegos de surpresa.”

Numa carta aberta distribuída na manifestação, o Movimento Popular de Saúde da Zona Leste afirma que “o fechamento do PS é uma tragédia anunciada.”

Na sexta-feira (5), outra manifestação deve acontecer na unidade.

Resposta

A Secretaria Estadual da Saúde, gestão João Doria (PSDB), diz que a restrição do pronto-socorro “objetiva priorizar o atendimento a casos graves e gravíssimos nestes hospitais.”

A nota afirma que, por 90 dias, será realizada orientação dos pacientes para que busquem outras unidades, mas que mesmo quadros leves estão sendo atendidos.

A Secretaria Municipal da Saúde, gestão Bruno Covas (PSDB), afirma que as unidades de saúde municipais seguem atendendo “normalmente” e que realiza monitoramento diário para acompanhar o aumento na demanda pela mudança nos hospitais estaduais.

A pasta estadual diz que Marco Aurélio Panacho passou por avaliação médica no hospital da Vila Alpina e que não havia indicação de internação. A secretaria municipal afirma que o paciente foi encaminhado porque o hospital aceitou.

Sobre o atendimento da menina Julia, a secretaria estadual afirma que ela foi avaliada pelo médico e não havia indicação de coleta de exame de Covid-19.

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