Descrição de chapéu Grande SP

Prefeitura diz que 11 pessoas morreram à espera de leitos de UTI em Taboão da Serra

Secretaria municipal afirma que pediu transferências ao governo estadual e não foi atendida

São Paulo

A Prefeitura de Taboão da Serra (Grande SP) afirmou, nesta terça-feira (9), que 11 pessoas internadas por Covid-19 morreram no município à espera de leitos de UTI (Unidade de Terapia Intensiva). E ainda há uma fila com 12 pacientes esperando transferência na cidade.

Segundo a secretária-adjunta da Saúde de Taboão da Serra, Thamires May, desde o dia 3 de março a cidade solicitou a transferência desses 11 pacientes graves ao governo estadual por meio do Cross (Central de Regulação e Oferta de Serviços de Saúde). Esse setor é quem analisa as vagas disponíveis, os pedidos feitos e determina para onde o paciente deve ser encaminhado.

Thamires diz ter recebido sucessivas negativas ao informar o estado de saúde dos pacientes. A falta de leitos de UTI para transferência e o agravamento dos sintomas desses pacientes internados levou a morte de quatro pessoas no dia 5 de março, última sexta-feira, dois dias depois da negativa dos pedidos: duas mulheres (76 anos e 73 a nos) e dois homens (75 a nos e 58 anos), todos internados na UPA (Unidade de Pronto Atendimento) de Taboão da Serra.

“A relação com o sistema Cross sempre foi muito boa e nunca houve demora superior a 30 horas para liberação do leito. O colapso no Cross era um problema que não achávamos que iríamos enfrentar”, afirmou Thamires.

Procurada, a Secretaria Estadual de Saúde diz ser errado creditar as 11 mortes a problemas no Cross (leia mais abaixo).

Série de mortes

O que aumentou o desespero dos profissionais de saúde da UPA de Taboão da Serra, que centraliza o atendimento a casos de Covid no município, é que as mortes continuaram nos dias seguintes. No sábado (6), foram três óbitos: duas mulheres, de 95 e 74 anos, e um homem, de 46. No domingo (7), foi registrada a morte de um homem de 52 anos. Na segunda-feira (8) mais três mortes:, dois homens, de 62 e 75 anos, e uma mulher, de 71.

Essa mulher de 71 anos era Dinéia Martins Firmino. Ela foi internada na quarta-feira (3) na UPA de Taboão da Serra. Na quinta-feira (4), seu marido, José Firmino, de 76 anos, também precisou ser internado com sintomas de Covid-19. Seu quadro de saúde agravou e ele precisou ser intubado. Firmino é um dos 12 que aguardam na fila de transferência para um leito de UTI e, até o início da tarde desta terça-feira (9) ainda não havia sido informado da morte da mulher.

Um dos filhos dele, Samuel Firmino, de 49 anos, que cuidou do enterro da mãe e da internação do pai, precisou ser internado nesta terça-feira, logo após enterrar o corpo de dona Dinéia. Um exame de raio-X mostra que seus pulmões estão parcialmente comprometidos e, até por volta das 14h desta terça-feira, ele aguardava por uma vaga de um leito de enfermaria para começar o seu tratamento contra a Covid-19.

Ao sair da rápida cerimônia de enterro da avó, nesta terça, Pamela Rivitti, 30 anos, estava inconformada. “Não vejo ninguém fazendo nada, nenhuma autoridade”, afirma.

Ela disse que foi informada que seu avô seria transferido para um leito de UTI. Porém, até a publicação desse texto, a Secretaria Estadual da Saúde, gestão João Doria (PSDB), não havia confirmado a transferência.

Cuidados

A secretária-adjunta de Saúde de Taboão da Serra afirmou que nenhum dos 11 pacientes mortos ficaram sem oxigênio, e todos foram intubados. Porém, por não ser competência do município manter serviço de alta complexidade, entre eles a UTI, Thamires diz que não pode oferecer tratamentos tais como o da hemodiálise, necessária para atender aqueles que têm complicações nos rins, já que a insuficiência renal pode ser um dos complicadores.

“Um hospital de alta complexidade consegue fazer, já que possui estrutura de UTI, com quadro maior de enfermagem e toda condição clínica”, disse.

Entre os 12 que ainda aguardam atendimento está um homem de 31 anos, sem comorbidades. Questionada sobre a gravidade dos pacientes, Thamires disse que, se não houver atendimento, o pior pode acontecer. “Podem evoluir a óbito”, disse.

Mais cedo, um outro jovem, de 28 anos, que também estava internado vítima de Covid-19 na UPA, teve parada cardiorrespiratória e foi transferido, assim como outros três pacientes, para o Hospital das Clínicas de São Paulo.

Segundo a Prefeitura de Taboão da Serra, não é competência do município manter leitos de UTI. O que oferece são e leitos de suporte ventilatório (onde é possível fazer a intubação, por exemplo) e enfermaria. Para atender a crescente demanda por internações em decorrência da Covid-19, criará, até o final de semana, mais 30 leitos de enfermaria, o que aumentará a capacidade de atendimento em 75%, totalizando 70 leitos exclusivos para Covid-19.

Corredor

Na última sexta-feira (5), o secretário estadual da Saúde, Jean Gorinchteyn, afirmou que, se necessário, colocaria pacientes até em corredores para serem atendidos. “Nem que a gente coloque em qualquer local cilindro de oxigênio, distribua as pessoas até mesmo nos corredores, mas nós vamos garantir assistência”, disse.

Jean Gorinchteyn, secretário da Saúde do Estado de São Paulo - Foto: Governo do Estado de São Paulo

Também presente à entrevista coletiva, o governador João Doria (PSDB) disse que não queria atender ninguém em corredores. “Queremos atender em quartos e de forma digna”, disse.

Já reconhecendo a saturação no sistema, Gorinchteyn pediu que profissionais da saúde, como médicos, enfermeiros e fisioterapeutas, se voluntariem para trabalhar no cuidado de pacientes com Covid-19 em São Paulo.

O secretário afirmou que essas equipes da linha de frente iriam trabalhar como em uma "operação de guerra" em hospitais, colocando pacientes de extrema gravidade em UTIs e verificando quem pode ficar em outras áreas das unidades.

A cada dois minutos, três pacientes no estado de São Paulo são internados em média, seja em uma UTI ou em uma enfermaria.​

Resposta

Segundo a Secretaria Estadual da Saúde, gestão João Doria (PSDB), é errada a informação de que a Cross negou vagas para Taboão da Serra. "Desde 3 de março, houve 144 regulações de diversos perfis de pacientes, incluindo 14 suspeitos ou confirmados de Covid-19. Portanto, a Cross mantém o auxílio em todos esses dias", afirmou, em nota.

Essa informação é contestada pela secretária-adjunta de Saúde de Taboão da Serra, Thamires May. Ela diz que desde o dia 3 de março nenhuma ambulância saiu da UPA (Unidade de Pronto Atendimento) transportando pacientes de Covid-19, já que não há liberação de vagas pelo Cross. A secretaria estadual foi novamente procurada, porém, até a conclusão desse texto, não respondeu ao pedido de esclarecimentos da reportagem.

A secretaria estadual diz que consta na Cross informação de óbito de oito pacientes de Taboão da Serra desde o dia 28 de fevereiro até esta segunda (8). As idades variavam entre 53 e 82 anos, sendo idosos ou pessoas com comorbidades, com pedidos registrados em média 24 horas antes do óbito. "Nessas situações, o falecimento ocorreu não por ausência de medidas pelo estado, mas pela gravidade clínica dos pacientes. Outros dez pedidos registrados no período ficaram sem atualização por parte do município em período superior a 48 horas, o que inviabiliza o trabalho dos médicos da Cross", disse.

A secretaria afirmou que o papel da central não é criar leitos, mas sim auxiliar na identificação de uma vaga no serviço mais próximo do paciente e apto a cuidar de seu caso. "O município conta com dois hospitais estaduais de referência para coronavírus: o Regional de Cotia, com 36 leitos de enfermaria e 30 de UTI, e o Geral de Itapecerica da Serra, com 10 de enfermaria e 31 de UTI. Além disso, os cidadãos podem ser atendidos em outros locais, como na Grande São Paulo, que possui mais de 2,7 mil leitos de UTI no SUS", afirmou a secretaria.

Também ressaltou que o estado atua de forma regionalizada e a criação de leitos não é prerrogativa desta única esfera, cabendo também ao município e governo federal.

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