Muita gente aproveitou o isolamento social da pandemia para aprender uma habilidade nova. Aos 73 anos, o ator Antonio Fagundes, fã de videogame, usou o tempo livre para se dedicar aos jogos eletrônicos.
Um vídeo do ator jogando viralizou na internet durante a última semana e abriu as discussões da paixão pelo videogame, que não é exclusividade do ator nem dos jovens. O pessoal da terceira idade também aproveitou a pandemia para se dedicar aos desafios eletrônicos.
É o caso da servente aposentada Margarida Maria Tesser. Com a mesma idade de Fagundes, 73 anos, Margarida só larga o celular durante os afazeres domésticos e na reza do terço em uma transmissão de TV, diariamente às 18h.
“Eu jogo no celular, mas como não sei muito, me atrapalho um pouco e procuro outro jogo. Quando não consigo mais jogar, procuro outro”, diz Margarida, que prefere os desafios geométricos e de encaixes.
Ela aproveita para jogar quando está estressada ou pensativa. “Distrai muito, acho que faz bem. Parece que cada vez que eu jogo, vou ficando mais esperta. Tinha um que era para estourar bolinhas. Eu ganhava muitos parabéns”, conta a aposentada.
Margarida tem razão. Ela não só está ficando mais esperta como também ganhando estímulos que garantem domínio maior em linguagem, memória, raciocínio lógico e até coordenação motora.
“Os jogos promovem bem-estar, dialogam com a realidade do idoso quando criam o desafio do ‘vou acordar porque preciso terminar ou ganhar o jogo’. Podem estreitar os vínculos com família e amigos quando são online e despertam atenção, interação e aprendizado no dia a dia”, explica o gerontólogo e mestrando em saúde interdisciplinar pela Universidade de São Paulo, Felipe Borges.
O ideal, de acordo ele, é que os desafios sejam variados, como matemáticos, de linguagem e de atenção.
Projeto estimula prática de jogo online
Os cerca de 210 idosos atendidos pelo PAE (Programa de Atenção ao Idoso) do Hospital do Servidor Público Estadual têm aulas de informática por meio das quais aprendem a mexer não só no computador, mas também no celular e são estimulados a desenvolver autonomia para lidar com os equipamentos.
“O PAI entrou na casa dos idosos através dos meios de comunicação como os celulares”, afirma a coordenadora do programa, Gilka Barbosa Nery, ao referir-se à pandemia, quando o projeto continuou a oferecer todas as atividades no formato online.
Gilka acredita que os jogos em geral, não somente os eletrônicos, são importantes para o estímulo da memória.
O gerontólogo Felipe Borges alerta para os jogos estressantes, irritantes ou que não são compatíveis com as capacidades físicas do idoso. “Momentos de ansiedade e tristeza só se agravam nesses casos e, com o isolamento, uma pessoa que já estava sensível, fica pior ainda diante dessas circunstâncias.” Outro cuidado deve ser o de não optar por jogos de azar ou que estimulem o vício.
Aposentado adquire habilidades no celular durante a pandemia
João Batista, 79 anos, sempre foi praticante de palavras-cruzadas e tem um estoque delas em casa. Mas foi com a pandemia que “migrou” com toda força para o celular.
“Há cinco anos, mais ou menos, faço palavras cruzadas, mas foi na pandemia que intensifiquei. Depois das tarefas cumpridas e quando a mulher vai dormir, eu jogo”, diz ele, ao reforçar que prefere o celular porque não daria para praticar o jogo de papel na cama, já que a luz fica apagada.
Ele afirma que gosta do jogo no celular porque exige rapidez de raciocínio e que, com o passar do tempo, vai ficando mais fácil. Batista também conta, orgulhoso, que já aprendeu a procurar novos jogos porque a neta Melanie o ensinou.
Melanie diz que o avô é o “melhor caçador de palavras do Brasil.” Mas ele não fica só nos jogos. João Batista também se diverte com o “tico teco”. “Ele quis dizer tik tok. Não que ele grave vídeos, mas gosta de ficar assistindo”, explica a neta. Tik tok é um aplicativo onde vídeos curtos são criados e compartilhados.
A familiaridade com o celular conquistada principalmente durante a pandemia também garantiu ao quase octogenário habilidades extras para conversar com a família através dos aplicativos de mensagens e até fazer buscas de receitas. “Ele está aqui procurando uma receita de pudim”, denuncia a neta.
Idoso troca TV por cruzadas virtuais
Técnico em mecânica industrial aposentado, Antônio Resendes Pereira, 73 anos, o seu Toninho como é chamado, passou os primeiros seis meses da pandemia completamente isolado em sua casa de Águas de São Pedro, no interior de São Paulo, enquanto a família permaneceu em São Caetano.
Foi no isolamento que aprimorou algo que antes fazia apenas esporadicamente: jogar caça-palavras no celular. Ele diz que costuma jogar quando a programação da TV “está chata”.
Aprimorou tanto a habilidade que já está no nível 1.489 de um jogo que forma palavras. “É uma terapia e aumenta o vocabulário, já que você pode ir tentando formar palavras. Ajuda a não ficar com a mente preguiçosa”, diz.
Aos 58 anos, a cuidadora de idosos Odília Braz de Andrade, encontrou nos jogos eletrônicos uma maneira de ocupar e exercitar a mente. “Percebi um pouco mais agilidade, inclusive e, por incrível que pareça, com a matemática, depois que comecei a jogar”, diz.
Apesar dos resultados matemáticos, ela prefere os jogos e desafios que estimulam a formação e caça de palavras.
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