Voltaire de Souza: Duro de roer

  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Voltaire de Souza

Crise. Miséria. Desespero.
Brasil, 2021.
Carcaças de boi são procuradas pela população carente.
Na caçamba do caminhão, ossos são disputados a tapa.
E, com o preço do gás, o país volta ao fogo de lenha.
João Eulálio era um jovem liberal.
—Bem. Tudo isso tem explicação.
Ele preparava um texto no computador.
Serviços de consultoria econômica são requisitados nestes tempos incertos.
—Tudo é uma questão de alocação de recursos.
O vocabulário de João Eulálio era técnico e preciso.
—Veja o caso dos ossos de boi, por exemplo.
Ele tomou um gole de chá.
—Antes, eram moídos e serviam para ração de gatos e cachorros.
A bolachinha amanteigada acompanhava o raciocínio.
—O que vocês preferem? Alimentar um pet ou um ser humano?
A resposta era clara.
—Melhor usar o osso para melhorar a mesa do pobre.
Mas será que é o momento de comer o osso cru?
—A questão da lenha precisa ser posta no contexto.
João Eulálio falava com firmeza.
—Tem pouco gás. Mas tem floresta à vontade.
Ele suspirou.
—O chato é eu ter de ficar aqui explicando o óbvio.
É o ofício de um economista.
Os ossos, por vezes, são duros de roer.

Fogão à lenha
Nos tempos do fogão à lenha - Pexels
  • Salvar artigos

    Recurso exclusivo para assinantes

    assine ou faça login

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.