Não é tarefa simples, sobretudo em períodos sombrios, mas alimentar uma pontinha de esperança parece fundamental para manter a sanidade. Se chega a ser uma alternativa sedutora diante de um cenário desolador, entregar-se à melancolia é também um caminho perigoso.
O poço não tem fundo. Sempre é possível cavar mais um pouco, como tem mostrado o Brasil a cada dia. Assim, convém, vez ou outra, olhar para o alto e acreditar, que seja por um instante, na possibilidade de sair do buraco.
Foi o que fez Luiz Carlos da Vila em 1979. “Um dia, meus olhos ainda hão de ver, na luz do olhar do amanhecer, sorrir o dia de graça”, compôs o genial sambista carioca, sonhando com “o fim de toda opressão, o cantar com emoção”.
Nem era exatamente um sonho dos mais ousados. Embora “o esplendor do preservar a natureza” e o “respeito a todos os artistas” hoje soem como piada no país da boiada e do ódio à cultura, o poeta imaginava apenas “o não chorar e o não sofrer se alastrando”.
Não está fácil, neste momento, fantasiar o mesmo.
As mortes por Covid-19 novamente se aproximam das 1.500 por dia. O Carnaval, que estaria batendo à porta, foi cancelado. E a histórica final da Copa Libertadores, na tarde deste sábado, terá um Maracanã tristemente vazio, com um punhado de convidados.
Nada disso tira de palmeirenses e santistas —nem deveria tirar— a vontade de comemorar. Os torcedores têm todos os motivos para experimentar nervosismo, ansiedade, empolgação, tudo aquilo relacionado a uma grande decisão.
Só é difícil ignorar o fato de que ali mesmo, no complexo do Maracanã, funcionava até outro dia um hospital de campanha onde estiveram milhares de vítimas do novo coronavírus. Esperar um futuro melhor e trabalhar por um dia de graça não significa fechar os olhos ou desrespeitar a dor.
Hoje é dia de festa para Palmeiras ou Santos. Que amanhã possamos celebrar o não chorar e o não sofrer se alastrando.
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