Descrição de chapéu Opinião

A bola é um detalhe: Um ótimo retranqueiro

Abel Ferreira mostra capacidade impressionante para o contragolpe; para o golpe, nem tanto

São Paulo

Vanderlei Luxemburgo foi demitido do Palmeiras, no ano passado, quatro dias depois de ter dito: "Tem que ver se tenho time para jogar bonito". Ganhar o Campeonato Paulista sobre o arquirrival e acumular 20 partidas seguidas de invencibilidade não foi suficiente para o treinador, que ficou desempregado apenas três jogos após essa sequência.

A frase, sem dúvida, foi infeliz. Criticar publicamente a qualidade do elenco raramente é uma boa ideia. O fluminense pagou o preço em seguida: os atletas, com uma disposição macunaímica, tiveram atuação caricatamente displicente contra o Coritiba, e a diretoria se viu em busca de um novo comandante.

O espanhol Miguel Ángel Ramírez, adepto da posse de bola, ouviu o convite e disse não. O português Abel Ferreira, que tem asco da posse de bola, disse sim.

O que se viu na sequência está na história. Com a consistência defensiva e a velocidade propostas por Ferreira, o Palmeiras conquistou sua segunda Copa Libertadores e levou também a Copa do Brasil de 2020.

O português Abel Ferreira sucedeu Vanderlei Luxemburgo no Palmeiras apostando em um jogo eficiente de marcação firme e contra-ataque - Cesar Greco/Palmeiras/Divulgação

Na festa dos títulos, ninguém perguntou se o jogo era "bonito", como se cobrava de Luxemburgo. Nos fracassos —que já se acumulam—, a questão começa timidamente a aparecer.

A beleza, a bem da verdade, não é exatamente o ponto em discussão. Pode-se ver grande beleza nos contragolpes alviverdes, e nesse tipo de jogada realmente impressiona a capacidade do time, excepcionalmente bem treinado para resolver os lances com agilidade e precisão.

No entanto, jogar bonito, como exigem os palmeirenses, ou de maneira bonita, como pede a língua portuguesa, inclui envolver o adversário com a bola no pé. E, sempre que precisou controlar a bola, o Palmeiras do português fracassou.

Quando o adversário não oferece o contra-ataque, a equipe sofre. Crespo entendeu isso e levou o São Paulo ao título paulista diante de um rival alviverde que quase nada criou em 180 minutos.

Abel é um retranqueiro. Um ótimo retranqueiro. Mas um retranqueiro.

Marcos Guedes
Marcos Guedes

33 anos, é jornalista formado pela Faculdade Cásper Líbero e, como o homenageado deste espaço, Nelson Rodrigues, acha que há muito mais no jogo do que a bola, "um ínfimo, um ridículo detalhe". E-mail: marcos.guedes@grupofolha.com.br

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