De longe, é possível de qualquer lugar do bairro ver o espigão que cresce no miolo do Tatuapé. O Figueira Altos, edifício de 52 andares, previsto para ficar pronto em fevereiro de 2021, se transformou em atração na zona leste —atualmente, a obra está no 47º andar.
Corretores no stand de vendas disseram à reportagem que o prédio terá cerca de 170 metros de altura —a incorporadora Porter não quis passar detalhes do empreendimento de luxo.
Segundo cálculos de José Augusto Fernandes Aly, professor de arquitetura e urbanismo da Universidade Presbiteriana Mackenzie, a altura do prédio ficará em torno de 160 metros, o que o torna, segundo ele, o condomínio residencial mais alto do município.
O Mirante do Vale, no Anhangabaú (centro), com 51 andares, tem 170 metros de altura, mas é comercial.
O gigante
Curiosos, motoristas chegam a parar e sair do carro, impressionados com o tamanho do empreendimento. Um adolescente fez uma selfie na manhã de quinta-feira (31), quando a reportagem visitava o local.
A rua Itapeti, onde a obra está localizada, há apenas alguns comércios de bairro. Quase não se vê prédios no quarteirão e os edifícios existentes ali aparentam ser duas ou três vezes menores que o novo vizinho.
O condomínio terá ao todo 47 apartamentos de 337 m², mais uma cobertura duplex com quase 600 m². As unidades custam a partir de R$ 5 milhões —o preço do metro quadrado sai por cerca de R$ 15 mil, quase o dobro do valor médio de apartamentos no bairro.
Entre os luxos do local há, por exemplo, elevadores com biometria e sistema de aspiração de pó instalado em todo o apartamento.
Alguns vizinhos se preocupam com o impacto do arranha-céu. “As ruas [do bairro] já não comportam tantos carros e terão muitos outros aqui”, afirma o publicitário Claudinei Sampaio, 43, que mora na rua ao lado. Ele reclama da sujeira da construção. “É muito alto e a poeira vem toda para baixo. Tem que limpar minha casa todo dia.”
Sombra
Um prédio tão alto causa muitos impactos e, logo de cara, o que muda é a paisagem, segundo diz Maurílio Ribeiro Chiaretti, presidente do Sindicato dos Arquitetos no Estado de São Paulo.
“Ele rompe com a homogeneidade de um local com predominância de habitações de perfil baixo. Isso prejudica as características e a identidade do bairro”, conta. “Outro ponto é que, com essa altura, irá, com certeza, fazer muita sombra, impedindo que o sol chegue a muitas casas.”
O arquiteto alerta para os impactos sociais. “Este tipo de prédio tende a valorizar o bairro, aumentando o valor do metro quadrado e dos alugueis, incentivando o surgimento de outros empreendimentos similares e afugentando moradores antigos da vizinhança ou interessados que possuem menor poder aquisitivo, segmentando os locais mais centrais”, afirma.
“Em certo sentido isso aconteceu no largo da Batata [em Pinheiros, zona oeste]”, diz Chiaretti.
Comércio
Os comerciantes parecem gostar da ideia de ter no Tatuapé aquele que promete ser o maior prédio residencial da capital.
“A tendência é o bairro ficar mais movimentado e isso pode melhorar as vendas”, conta Marco Benício, 49 anos, dono de uma sapataria em frente à construção na rua Itapeti.
“Será muito interessante, vai aumentar o movimento e pode ter mais gente na loja”, afirma a atendente Rosimeire Carneiro da Silva, 27, que trabalha em uma pequena loja de roupas, também em frente ao arranha-céu luxuoso da zona leste da capital paulista.
Outra pessoa que também parece animada com a chegada do novo empreendimento e também de possíveis curiosos ao Tatuapé é a costureira Deni Diniz, 61.
“Talvez eu tenha mais clientes. Com mais gente morando e circulando por aqui, eles vão precisar dos meus serviços”, afirma.
A costureira vê outra vantagem no prédio luxuoso. “Algumas ruas ao redor são muito paradas e têm muito assalto, principalmente, com as senhorinhas que andam sozinhas pelas calçadas, com mais movimento isso pode ser inibido.”
Legislação
Segundo a prefeitura, o espigão do Tatuapé tem alvará. “O pedido para aprovação das obras do empreendimento foi protocolado em setembro de 2013 e foi aprovado de acordo com a Lei de Zoneamento (13.885/03), vigente à época”, diz a nota.
A antiga Lei de Zoneamento estabelecia “gabarito sem limite”, ou seja, permitia a construção de prédios altos para zonas mistas, o que não ocorre agora.
O edifício tem área total de 26.398,06 m². Desses, 2.530,55 m² foram adicionais, necessitando pagamento da outorga onerosa para se construir metragens a mais.
A prefeitura discute uma revisão da lei. Entre as propostas, nas zonas de centralidade, aquelas em que há atividades típicas de centros regionais, como comércio, a altura máxima passa de 48 metros para 60 metros; nas mistas, que mesclam residencial e não residencial, vai de 28 metros para 48 metros, ou seja, um terço do arranha-céu que sobe no Tatuapé.
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