A pandemia provocou o necessário distanciamento físico entre as pessoas, causando o fechamento de uma série de atividades que só ocorriam de forma presencial. Porém, em meio a tantas dificuldades e sofrimento impostos a todos pelo coronavírus, uma parte dos profissionais encontrou formas de expandir seus negócios para além dos limites de seus bairros, cidades e até do país, conquistando um público inimaginável.
Foi isso que fizeram Márcio Tateno, 46 anos, e Paula Millene Almeida Tateno, 42. O casal antecipou os planos e levou para a internet, em junho do ano passado, a Entrelinhas Aulas de Costura Criativa, um curso que só existia no presencial.
“Foi para não perder o faturamento e não quebrar. Vimos empresas tradicionais falindo. O mais positivo foi alcançar pessoas fora da nossa proximidade. É gente do mundo inteiro. Teve muita busca de pessoas da América do Sul, como Chile e Argentina”, diz Márcio. Antes 100% presenciais, os alunos agora são meio a meio.
A parceria entre o casal foi fundamental para fazer as aulas darem certo. “Domino as técnicas de aprendizado, de ensino, mas não as técnicas de gravação e edição. A gente acabou se completando nesse período”, afirma Paula. “Foi tenso, gerou muito estresse, muita insegurança, por lidarmos como coisas novas”, diz.
Antes 100% presenciais, os alunos agora são meio a meio. Dessa maneira, Tateno e Paula conseguiram superar mais um desafio que surgiu no meio de seu caminho. O casal, que chegou a ter confecção e lojas de vestuário no passado, teve que se adaptar após um revés e montar a escola de costura.
A interrupção das atividades presenciais foi, inicialmente, um banho de água fria para o professor de pilates Renan Pozzi, 32, que junto com a mulher, a terapeuta Jaqueline Lima Pozzi, 31, havia acabado de ampliar o estúdio onde dá aulas em Santos (72 km de São Paulo). O que parecia um baque duro de ser superado acabou abrindo uma oportunidade jamais imaginada.
“Não acreditava muito em aula online para exercícios. Como iria corrigir sem ver? Ou mesmo vendo, como faria? Mais por desconhecimento e preconceito, por não saber como funcionava”, diz o professor.
Pozzi fez, primeiro, uma live com a mulher. Deu tão certo que, em um ano, desde julho de 2020, atingiu 500 alunos na plataforma Pilates em Casa. “A gente abriu uma sociedade para atingir mais pessoas. Em um último evento, colocamos 2.200 pessoas online.”
Os conhecimentos físicos e de ortopedia de Jaqueline são alguns dos diferenciais, porque complementam as aulas como apoio. O casal conseguiu, assim, transformar algo ruim em uma oportunidade para se manter.
“Tudo o que veio, das criações, das coisas boas, surgiram não só para cobrir um buraco, mas para substituir ou ficar de forma híbrida. Tenho hoje alunos até de fora do país”, afirma. ”Tem que analisar o que está acontecendo e procurar uma solução. A gente pensou em um método para resolver o problema.“
Alunos aprovam a experiência e comodidades
O produtor de eventos Roberto Zenker, 44 anos, viu a pandemia interromper a frequência e o volume de suas corridas de rua, a atividade física que mais gosta de fazer. Foi então que as aulas de pilates online, ministradas pelo professor Renan Pozzi, se encaixaram em sua rotina de vida.
O incentivo foi dado pela mulher de Zenker. “Corro há alguns anos, desde 2015, e ela sempre falava para fazer ioga, pilates, alguma coisa assim. Não fazia, mas, com a pandemia, a gente ficou em casa, sem atividade na rua ou qualquer outra em local fechado”, disse.
As aulas online se mostraram mais relevantes do que o produtor de eventos imaginava no início. “Antes, achava que pilates era aula de alongamento. Realmente, não me interessava. Quando comecei a fazer, percebi o quanto era desafiador para o corpo. Muitos exercícios, eu não conseguia fazer corretamente”, diz.
Fora as duas aulas online, Zenker tem à disposição uma programação semanal com vídeos gravados pelo professor. “A dinâmica que há nas aulas faz com que pareça que ele está ao nosso lado, com a correção de postura, dicas. Dá para aproveitar muito bem”, conta. “Para mim, a grande comodidade é fazer em casa, em segurança”, diz.
Já a dona de casa Michele Araújo Bartulici, 40 anos, encontrou nas aulas online de costura uma oportunidade de pausar a rotina pesada do dia a dia. Ela trabalhou durante muito tempo no mundo corporativo e passou a ficar em casa há quatro anos, com o nascimento da filha.
“Precisava de algo para descansar a cabeça”, conta Michele. A atividade tinha que ser pela internet, para não expor a si mesma e a família. Assim, a dona de casa encontrou as aulas online.
Michele explica que a mãe dela trabalha com costura há muito tempo, mas voltada para consertos, o que não a atraía. “Não gosto do trabalho repetitivo”, diz. Na costura criativa, a produção é variada e já fornece até uma renda para a dona de casa. “Além de máscara, que foi o início, faço bolsa, nécessaire, pano de prato. Tudo é muito vendável, tenho encomendas”, afirma.
Situações como a de Michele são comuns, segundo os responsáveis pela escola de costura criativa. Para Márcio Tateno, 90% das pessoas que procuraram a Entrelinhas chegam em busca de uma atividade terapêutica, por estresse, depressão e ansiedade, algo que se multiplicou na pandemia.
“A gente ficou feliz por ajudar. As pessoas procuram também por uma renda extra, ou até uma renda principal, por ter pedido emprego”, fala.
Professor de kung fu se adapta à internet
O professor de kung fu Márcio Augusto Ferreira, 42 anos, não era, de início, muito simpático à ideia de dar aulas online. Mas a pandemia da Covid o colocou contra a espada e, com muita flexibilidade, ele percebeu que o golpe do destino poderia levá-lo a dar um passo à frente. E com sucesso.
“Atualmente, temos alunos até na Inglaterra. Estava aqui, foi visitar a mãe, não conseguiu voltar e faz aula de lá. Já tive aluno do Recôncavo Baiano, do interior de São Paulo”, diz. “A gente descobriu um nicho que não tinha na nossa escola, de atingir pessoas que estão mais distantes. Aprendemos e tem sido muito bom”, afirma o instrutor da Peng Lai Brasil.
Hoje, somente no online, são de 35 a 40 alunos tendo aulas de kung fu. Ferreira explica que, apesar do volume de alunos, a arrecadação ainda é apenas 15% do total da escola. Mas já é uma boa abertura. “Atrai, porque é uma possibilidade. Se estiver na praia, de férias, você pode abrir o celular e fazer a aula”, diz
O professor conta que foram necessárias adaptações na forma de ensino. “Nossa metodologia sempre foi baseada no contato entre os alunos, da aplicação dos movimentos”, diz. Outro fato curioso foi motivado pelo uso da tecnologia. “Fazer todos os movimentos do lado contrário, para que quem esteja em casa possa acompanhar”, diz
Ferreira conta que também se tornou mais maleável em relação à exigência técnica. “A pessoa em casa tem uma limitação da própria câmera, que não mostra em 3D”, diz.
Redução de custos ajuda, diz consultor
Consultor de negócios do Sebrae-SP, Davi Jeronimo afirma que uma das vantagens da prestação de serviços online é a redução dos custos.
"Você tem até plataforma gratuita. Não tem aluguel para pagar, pode massificar o público ou fazer atendimento personalizado, também trabalhar com preço mais baixo. Essa redução de estrutura, de ter que pagar aluguel, espaço físico, foi um ganho", diz.
Jeronimo diz também que é preciso saber qual o caminho será adotado pelo consumidor no futuro, se irá seguir no online ou preferir o retorno ao presencial. Porém, a comodidade pode pesar na escolha. ‘A pessoa está em casa, em meia-hora consegue fazer atividade, sem precisar se deslocar. É a praticidade‘, afirma.
Além do ramo educacional, outras áreas também tiveram um boom no atendimento pela internet. "Fora educação, a gente viu psicologia, medicina. Ganharam um aumento no online", diz o consultor.
A curiosidade é que o próprio Jeronimo fala de algo que consultores conhecem há tempos, que é o apoio online às empresas.
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