Descrição de chapéu Opinião

Marcos Guedes: Somos racistas

“Será que já raiou a liberdade ou se foi tudo ilusão?”, perguntou a Mangueira, no Carnaval de 1988, que celebrava um século da abolição da escravatura no Brasil.

Trinta anos depois, foi a vez de o Paraíso do Tuiuti revisitar a questão, trocando a exclamação de um lindo samba-enredo antigo pela interrogação: “Meu Deus, meu Deus, está extinta a escravidão?”.

Tuiuti grita, 130 anos após a abolição: "Não sou escravo de nenhum senhor" - Raphael David - 17.fev.18/Riotur

O samba é negro, e só quem é negro conhece verdadeiramente o “cativeiro social” cantado pelo Tuiuti. Não é o caso deste colunista, branco, que pode apenas imaginar, não sentir, o que é ser chamado de macaco.

Aconteceu, de novo, no último final de semana. Acontece sempre nos estádios brasileiros, mas os microfones captaram com nitidez mais um desses gritos no momento em que um negro comemorava o gol da épica vitória por 5 a 4 do Fluminense sobre o Grêmio, em Porto Alegre.

O caso, embora só mais um no sentido estatístico, é ilustrativo. O Fluminense, chamado de “pó de arroz” porque maquiava negros quando eles não eram aceitos no futebol, teve um triunfo hercúleo, homérico ou, melhor, zumbíico. E o negro que fez o gol, de cara limpa, foi chamado de macaco.

Não dá mais para dizer que a arquibancada permita esse tipo de manifestação, que não haja real racismo no grito de “macaco” no estádio — ou que não haja homofobia no grito de “bicha”. Há.

Há também a necessidade de reconhecer o óbvio. O mito da democracia racial brasileira, por mais que o presidente condenado por racismo não veja racismo, é só isso, um mito.

Somos um país racista. Tem que mudar isso daí.

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