Para cobrir um rombo de R$ 10 bilhões nas contas públicas neste ano, o Governo do Estado de SP enviou à Assembleia Legislativa projeto de lei que prevê aumento na alíquota de contribuição do Iasmpe —o plano de saúde dos funcionários públicos—, possibilidade de demissão de servidores e extinção de dez órgãos.
Há ainda a intenção de definir uma alíquota única de IPVA de 4%, o que elevará o imposto para algumas categorias e modelos, além de mudança no prazo de resgate dos créditos da Nota Fiscal Paulista. A proposta foi recebida com surpresa por deputados e servidores e suscitou debates nesta quinta (13).
O principal ponto é a mudança na contribuição do Iamspe. Hoje, há um percentual de 2% sobre o rendimento mensal, que garante atendimento médico ao servidor e seus familiares. A ideia é cobrar por pessoa, conforme faixa etária. A alíquota vai variar de 0,5% a 3% por mês.
Silvio Santos Martins, vice presidente do CPP (Centro do Professorado Paulista), diz que as entidades vão se reunir para tomar as devidas providências contra a medida. “O projeto pegou a gente de surpresa. Além do aumento da contribuição sem que o governo pague a parte dele, pode acabar com um instituto que existe praticamente há mais de 50 anos”, afirma ele.
Para Martins, o projeto onera os servidores públicos, ainda mais em um momento tão delicado, com a crise do coronavírus. "Entendemos que não é desta maneira que vai se arrecadar o que se perdeu na pandemia. Vai ser feito um trabalho junto aos deputados, que já aprovaram contra nós o projeto de reforma da Previdência e vai fazer com que as nossas alíquotas de contribuição subam. Estamos sem reajuste, uma situação complicada."
O deputado Carlos Giannazi (PSOL) acionou o Ministério Público contra a proposta. Para ele, além da elevação da contribuição ao Iasmpe, a extinção de órgãos de saúde, como a Sucen (superintendência de endemias), na pandemia de Covid-19, “não tem sentido”.
Segundo parlamentar, a renda dos servidores fica comprometida com as ações do governo federal. Ele afirma que a alíquota de contribuição maior para os funcionários públicos, trazida pela reforma da Previdência, o desconto a servidores aposentados, também definido na reforma, além de decretos acabando com benefícios como auxílio-alimentação, por causa da pandemia, fez com que a remuneração ficasse muito menor.
"Eu nunca vi um projeto tão perverso", afirma. Para ele, há um "ataque" à saúde pública. "o fim da Sucen é grave. Isso não tem cabimento; é um atentado à saúde pública no pior momento", afirma ele.
A presidente do Sindpesp (Sindicato dos Delegados de Polícia do Estado de SP),
Raquel Kobashi Gallinati Lombardi, afirma que a alíquota do Iamspe afeta diretamente os policiais e que o sindicato analisa os demais pontos. Para ela, a reforma administrativa "é o primeio passo para destruir direitos".
Demissões de servidores
O projeto prevê a implantação de um PDI (Plano de Demissão Incentivada) que tem como alvo 5.600 servidores celetistas, contratados antes de 1983. A justificativa do governo para a medida causou espanto e críticas, pois afirma que esses trabalhadores travalham com desinteresse e desestimulam seus colegas.
"Esses servidores já preencheram os requisitos da aposentadoria e a maioria é aposentada pelo Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS. Embora continuem a exercer suas atividades profissionais, o fazem com dificuldade ou sem interesse, desestimulando os demais servidores que desempenham suas atividades na Administração Direta, Indireta e Autárquica", diz a justificativa.
Para Giannazi, esse PDI pode afetar mais fortemente o Iamspe, que tem muitos funcionários que atendem aos requisitos apontados pelo governo. "O PDI vai esvaziar muito o Iamspe e isso é um perigo também. Se quer fazer um ajuste fical, ele [o governador] pode cobrar a dívida ativia do estado, que já é superior a R$ 340 bilhões."
Iamspe é deficitário, diz estado
Em nota, a Secretaria de Estado de Projetos, Orçamento e Gestão afirma que o Iamspe é deficitário. Segundo o órgão, as despesas mensais do instituto somam R$ 1,6 bilhão e a arrecadação é de R$ 1 bilhão. "A conta não fecha com pequenas variações. Estes recursos aportados pelo tesouro são dinheiro do contribuinte paulista de forma geral. É justo que a contribuição para cobrir este rombo seja feita por quem utiliza o serviço", diz o governo.
Sobre a extinção de órgãos públicos, a secretaria diz que a medida deverá levar a demissões, mas que parte dos servidores serão "absorvidas por outros órgãos". "Todas as dez fundações, autarquias e empresas terão suas atribuições essenciais às funções de estado absorvidas pelas secretarias correlatas e órgãos da administração. [...] Parte dos funcionários destes órgãos, que hoje totalizam 4.700, será absorvida pela administração, os demais , com a extinção das entidades, serão desligados."
Veja os principais pontos | Projeto do Governo de SP
- O governo João Doria enviou à Assembleia Legislativa o projeto de lei 529/2020, que altera diversos pontos do funcionamento do estado com objetivo de economizar
- Dentre as mudanças estão aumento da alíquota de contribuição do Iamspe, demissão voluntária de servidores e extinção de autarquias e demais órgãos
1 - Aumento da contribuição ao Iamspe
- Os servidores públicos pagam uma alíquota mensal para ter direito a atendimento pelo Iamspe (Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual de S. Paulo)
- A proposta é elevar o valor pago hoje e mudar o pagamento da contribuição, cobrando por cada membro da família
Como é hoje
- Há um desconto mensal de 2% sobre os rendimentos do servidor
- Este valor único atende ao trabalhador, seus filhos e cônjuge ou companheiro (a)
- No caso de pai, mãe, madrasta ou padrasto, o desconto é de 2% sobre os rendimentos do servidor para cada um dos agregados inscritos
- No caso de viúvas, a contribuição é de 1% sobre o valor total dos vencimentos
O que o projeto propõe
- As contribuições vão variar de 0,5% a 3% por pessoa, dependendo da idade, conforme a tabela:
Vínculo | Faixa etária | Contribuição (em %) |
Servidor | Menos de 59 anos | 2 |
Servidor | A partir de 59 anos | 3 |
Beneficiário | Menos de 59 anos | 0,5 |
Beneficiário | A partir de 59 anos | 1 |
Agregado | Menos de 59 anos | 2 |
Agregado | A partir de 59 anos | 3 |
2 - Demissão voluntária
- Sob a justificativa de que os funcionários públicos já aposentados que trabalham no estado atuam com desinteresse, desestimulando os colegas, o governo propõe um PDI (Plano de Demissão Incentivada)
- Neste caso, a meta é desligar voluntariamente 5.600 servidores, em especial os que já são aposentados pelo INSS
- Será preciso que haja verba disponível para pagar a indenização
Haverá dois percentuais de indenização:
>65% da última remuneração mensal
- Haverá ainda a multiplicação pelo fator que corresponde à quantidade de anos completos e ininterruptos de trabalho, limitando o fator a 35 (trinta e cinco)
- Esse valor será pago em até 90 dias após a rescisão
>80% da última remuneração mensal
- Haverá ainda multiplicação pelo fator que corresponde à quantidade de anos completos e ininterruptos de trabalho, limitando o fator a 35
- Essa indenização será paga em até 36 parcelas mensais fixas e sem atualização monetária
3 - Alterações no IPVA
- O projeto 529/2020 institui mudanças na lei 13.296/2008, que trata sobre o IPVA
- Entre as alterações que devem trazer arrecadação maior com o tributo estão a revogação do desconto de 50% para carros de locadoras
- Haverá ainda a unificação das alíquotas em 4%, ou seja, quem hoje paga menos, vai ter aumento do imposto
Deficientes
- Haverá ainda definição de critérios "mais adequados" para a compra do carro do deficiente
- A intenção é deixar mais claras algumas limitações que já valem hoje
4 - Mudança na Nota Paulista
- Criado para incentivar o pagamento de impostos no estado de São Paulo e acabar com a sonegação, o programa Nota Fiscal Paulista devolve aos contribuintes parte do imposto pago
- Para isso, é preciso informar o CPF na compra, se inscrever no programa e transferir os créditos para sua conta
Prazo menor
- O prazo-limite de transferência dos créditos gerados é de até cinco anos
- O projeto 529/2020, estabelece validade de até 12 meses (um ano) para os créditos gerados
5 - Extinção de dez órgãos públicos
- Há ainda a intenção de extinguir dez fundações, autarquias ou demais órgãos ligados ao governo
- A justificativa para a medida depende da especificidade de cada órgão
- Podem ser extintos:
- Zoológico
- Furp (Fundação para o Remédio Popular)
- Oncocentro
- Instituto Florestal
- CDHU (Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano)
- EMTU (Empresa Metropolitana de Transportes Urbanos de SP)
- Sucen (Superintendência de Controle de Endemias)
- Imesc (Instituto de Medicina Social e de Criminologia de SP)
- Daesp (Departamento Aeroviário do Estado de SP)
- Itesp (Fundação Instituto de Terras do Estado de SP)
Fontes: projeto de lei 529/2020, Governo do Estado de São Paulo e reportagem
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