O valor de uma única contribuição pode ser determinante para aumentar a renda de quem se aposenta pelo INSS. Parece bom demais para ser verdade, mas essa possibilidade é real.
A reforma da Previdência de 2019 criou a permissão para o descarte de quantas contribuições forem necessárias para a ampliação da média salarial sobre a qual o benefício será calculado.
Ao mesmo tempo, a nova legislação previdenciária também eliminou uma regra que obrigava que esse cálculo fosse realizado sobre um número mínimo de recolhimentos –o chamado divisor mínimo.
O descarte autorizado pela reforma possui apenas duas restrições: as contribuições descartadas não podem ser aproveitadas para quaisquer finalidades e o trabalhador deve manter número suficiente de recolhimentos para cumprir a carência do benefício.
A carência da aposentadoria do INSS é de 15 anos de contribuição –outras regras de acesso ao benefício devem ser observadas, como idade mínima e período total de recolhimentos para atender exigências das regras permanentes ou de transição criadas pela reforma.
Considerando que somente valores de contribuições feitas a partir de julho de 1994 são consideradas no cálculo da média salarial –o que foi recolhido antes disso só é contado como tempo–, um trabalhador que eventualmente tenha cumprido a carência naquele período poderia, por exemplo, descartar todos os recolhimentos com potencial de rebaixar sua média salarial.
“É claro que esse o exemplo da contribuição única é menos comum", comenta o advogado Rômulo Saraiva. "Mas o descarte é uma estratégia interessante para ampliar a renda do beneficiário", diz.
Saraiva alerta, porém, que a decisão de descarte seja tomada com cautela, pois o tempo eliminado não poderá ser aproveitado nem mesmo em uma aposentadoria do regime próprio de previdência do serviço público.
Embora o INSS esteja habilitado para realizar o procedimento de descarte de contribuições para aposentadorias requisitadas após a reforma da Previdência, Saraiva recomenda que o interessado na regra realize simulações com o auxílio de profissionais especializados em cálculos previdenciários.
“Não são raros os casos na história da Previdência em que o melhor cálculo deixou de ser aplicado na concessão do benefício”, diz. “Até mesmo depois da aposentadoria vale a pena verificar o cálculo e, se for o caso, solicitar a revisão.”
REFORMA DA PREVIDÊNCIA | COMO USAR O CÁLCULO
- A reforma da Previdência de 2019 não trouxe apenas desvantagens para os trabalhadores, embora as vantagens sejam incomuns
- Uma das regras que pode resultar em considerável aumento da renda é a permissão para descartar contribuições com valores baixos
Regra geral
- A reforma da Previdência estabeleceu uma regra geral para calcular o valor das aposentadorias
- A norma diz que o trabalhador que cumprir a carência de 15 anos de contribuição terá direito a uma aposentadoria de 60% da sua média salarial
- O valor tem acréscimo de 2% da média salarial para cada ano de contribuição a partir do 16º ano contribuído, para a mulher, e do 21º, para o homem
- O sistema permite também descartar contribuições com valores baixos para aumentar a média salarial e, consequentemente, o benefício
Exemplo:
- Entre 1995 e 2020, o valor médio das contribuições de um trabalhador de 65 anos é de R$ 2.000
- Os 25 anos de contribuição garantem a ele o direito de receber 70% da média salarial, ou seja, R$ 1.400
- Mas as maiores contribuições deste segurado ocorreram entre 2005 e 2020, sendo a média do período de R$ 3.000
- Os 15 anos contribuídos entre 2005 e 2020 permitem que o valor inicial do benefício, com apenas 60% da média salarial seja de R$ 1.800
- Para o trabalhador, neste caso, é vantajoso abrir mão de 10 anos de contribuição para aumentar o valor inicial do benefício
SÓ UMA CONTRIBUIÇÃO
Em uma hipótese extrema, bastaria uma única contribuição sobre um valor alto para aumentar consideravelmente a renda do segurado.
Exemplo:
- O trabalhador completou a carência de 15 anos de contribuição antes de julho de 1994
- Entre 1995 e 2020 ele realizou contribuições apenas sobre o piso salarial de cada ano
- O elevado período de contribuição (40 anos) não traz vantagem para o segurado, que receberá um benefício de um salário mínimo (R$ 1.100, em 2021)
- Esse segurado realiza então uma única contribuição sobre o teto previdenciário de (R$ 6.433,57) e descarta todas as contribuições de 1995 a 2020
- Com isso, ele passa a ter direito a 60% da sua média salarial calculada sobre um único pagamento sobre o teto, o que significa uma renda de R$ 3.860,14
Cálculo exige cuidado
- O exemplo de cálculo sobre contribuição única é uma simulação que evidentemente seria aplicada a casos provavelmente raros
- Mas o cálculo é algo que deve ser considerado por trabalhadores com possibilidade de ter vantagem com o descarte
- A ideia é válida até mesmo para a revisão de aposentadorias concedidas após a reforma da Previdência, em novembro de 2019
- Advogados ou contadores especialistas em cálculos previdenciários podem realizar esse tipo de simulação com segurança
Como pedir ao INSS
O INSS tem a obrigação de conceder o maior valor de benefício possível e seus servidores possuem programas de computador capazes de realizar os cálculos necessários.
Mas o trabalhador pode, por precaução, anexar cópias digitalizadas de simulações e indicar quais contribuições deseja descartar ao realizar o pedido pelo Meu INSS.
Veja um exemplo de texto que pode ser anexado ao pedido de benefício para requisitar o descarte das contribuições:
Ao diretor da Agência da Previdência Social,
Eu, (nome do segurado), com endereço na rua… (endereço completo), CPF n.º ...., venho requerer o que se segue:
Considerando que o INSS deve conceder o melhor benefício (Súmula n. 5 do Conselho de Recursos da Previdência Social) e que o art. 188-E, § 1º, do Decreto n.º 3.048/1999 autoriza a regra do descarte, vem requerer que o servidor da autarquia, por ocasião do ato concessório ou revisional do benefício previdenciário, simule o melhor cenário que traga a renda mensal inicial mais vantajosa, inclusive o descarte dos menores salários de contribuição.Cidade - UF e data,
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Nome do segurado e assinatura
Atenção
- Se o benefício já foi concedido, é possível pegar pelo Meu INSS o processo administrativo para verificar se haverá a necessidade de pedir uma revisão
- Para se aposentar, o trabalhador deve ainda observar as demais condições, como idade mínima e períodos de contribuição exigidos pelas regras permanente ou de transição
PENSÃO NÃO TEM DESCARTE
- Em abril de 2020, o INSS oficializou a adaptação de várias regras da reforma ao seu conjunto de normas internas
- Uma dessas normas internas determinou que o descarte de contribuições valeria só para aposentadorias programáveis
- Pensões por morte e aposentadorias por invalidez não são programadas e, portanto, foram excluídas da possibilidade de descarte
- Desta forma, a possibilidade de descarte de contribuições passou a ser aplicada às aposentadorias com idade mínima ou às aposentadorias das regras de transição
- Na Justiça, pensionistas têm apresentado ações para permitir o descarte de contribuições
Fontes: Decreto 10.410/2020 e advogado Rômulo Saraiva
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