Descrição de chapéu salário mínimo inflação

População trabalha 15 dias para comprar cesta básica, diz estudo

Cesta com 13 itens sai por R$ 640, 51 na capital paulista, mais da metade do valor do salário mínimo

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Flavia Kurotori
São Paulo

Um morador da capital paulista que recebe até um salário mínimo (de R$ 1.100 em 2021) trabalha aproximadamente 15 dias para pagar uma cesta básica no valor médio de R$ 640,51. Isso significa que metade do mês de trabalho é destinado à compra de itens básicos para a alimentação.

O cálculo integra estudo do Conjuscs (Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano do Sul), que acompanha o preço de 13 itens da cesta. Os dados da cidade de São Paulo foram levantados com exclusividade para o Agora.

A inflação do grupo de alimentação e bebidas acumula aumento de 13,25% nos 12 meses encerrados em julho; preço do óleo chegou a dobrar
A inflação do grupo de alimentação e bebidas acumula aumento de 13,25% nos 12 meses encerrados em julho; preço do óleo chegou a dobrar - Rivaldo Gomes/Folhapress

Os alimentos são um dos principais vilões no bolso do consumidor no último ano. Tanto que nos 12 meses encerrados em agosto, o grupo acumula encarecimento de 13,94%, de acordo com o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), medido pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística).

Jefferson José da Conceição, coordenador do Conjuscs, explica que o aumento dos itens que compõem a cesta básica é causado por um conjunto de fatores, como a pandemia, a alta do dólar e o incremento no preço da energia elétrica e dos combustíveis.

Moradora da Vila Formosa (zona leste), Cristiane de Souza, 38 anos, diz que a conta não tem fechado desde o início da pandemia. Ela trabalha como ambulante, vendendo trufas e doces na porta de bares da zona leste, e interrompeu o trabalho durante a crise da Covid-19.

Cristiane de Souza, 38, produz trufas para vender na porta de bares e sustentar a família de quatro pessoas
Cristiane de Souza, 38, produz trufas para vender na porta de bares e sustentar a família de quatro pessoas - Ronny Santos/Folhapress

Cristiane voltou a vender seus produtos há cinco meses e, desde então, a renda média mensal da família é de R$ 1.000 —quantia que é suficiente para pagar apenas o aluguel da casa onde mora com o marido, que é tetraplégico, e dois filhos menores de idade.

O “arroz e feijão” de cada dia não está garantido, uma vez que a família depende de doações que chegam conforme conhecidos conseguem ajudar.

Por causa da pandemia, Cristiane voltou a vender trufas há aproximadamente cinco meses
Por causa da pandemia, Cristiane voltou a vender trufas há aproximadamente cinco meses - Ronny Santos/Folhapress

Outros itens básicos do dia a dia também estão pesando no bolso. O gás de cozinha, por exemplo, encareceu 30,22% nos últimos 12 meses, mostra o IPCA. O estudo do Conjuscs indica que uma pessoa trabalha dois dias para pagar por um botijão de 13 kg de R$ 94,99.

A conta de luz é outra vilã. Ela ficou 21,08% mais cara entre setembro de 2020 e agosto de 2021 --e pode aumentar ainda mais por causa da criação da bandeira tarifária crise hídrica. Considerando uma casa de quatro pessoas com consumo mensal de 247 kWh, são cinco dias de trabalho para arcar com a fatura de R$ 221,49.

Brasileiro não deve ter alívio nos preços tão cedo, diz especialista

A má notícia é que não há previsão para que o preço de insumos básicos diminua. “A crise política e econômica brasileira não permite uma perspectiva otimista para o curto prazo. É preciso certa estabilidade no campo econômico e político”, avalia Conceição.

Segundo o especialista, diante do cenário de crise, é necessário ações dos governos federal, estadual e municipais para reduzir tributos que incidem sobre a cesta básica e outros itens fundamentais.

Conceição adiciona que, enquanto os preços não estabilizam, é preciso garantir o acesso da população mais vulnerável a insumos essenciais, como alimentos e gás de cozinha. Isso deve ser feito por meio da concessão de cestas básicas, cupons, mais parcelas do auxílio emergencial e outros programas sociais.

Especialista defende que o pagamento de mais parcelas do auxílio emergencial e a criação de outros programas para garantir insumos básicos à população mais vulnerável
Especialista defende que o pagamento de mais parcelas do auxílio emergencial e a criação de outros programas para garantir insumos básicos à população mais vulnerável - Gabriel Cabral/Folhapress

Preço dos alimentos | Entenda o aumento

  • O grupo de alimentação e bebidas acumula aumento de 13,94% nos 12 meses encerrados em agosto, segundo o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), medido pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)
  • Na capital paulista, a cesta básica chegou a R$ 650,50 em agosto deste ano, valor equivalente a 64% do salário mínimo (de R$ 1.100 em 2021), indica pesquisa do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos)

Por que os alimentos estão caros?

1 - Pandemia

  • A crise sanitária instaurada pelo coronavírus causou a redução da oferta de alimentos em todo o mundo
  • No entanto, a retomada da economia de países como a China e os Estados Unidos aumentam a demanda por alimentos, encarecendo as commodities —alimentos exportáveis— como a carne, a soja, o trigo, o café e o milho

2 - Dólar

  • No caso específico do Brasil, este problema é agravado pela desvalorização do real frente ao dólar
  • A moeda norte-americana está acima de R$ 5 desde 2020, ano em que acumulou aumento de 29%
  • Com isso, os produtores de alimentos lucram mais com a exportação, diminuindo a oferta de produtos no mercado interno
  • A queda na oferta pesa no bolso na hora de fazer as compras no supermercado

3 - Energia e combustível

  • Produzir e distribuir alimentos requer gasto de energia elétrica e de combustível, que também estão mais caros neste ano
  • O IPCA mostra que, de agosto de 2020 a julho deste ano, os combustíveis acumulam alta de 41,3%, enquanto a conta de luz acumula alta de 20% de aumento


Na ponta do lápis

  • Estudo do Conjuscs (Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano do Sul) expõe que, de modo geral, o salário mínimo paga apenas as contas básicas, como a cesta básica, o gás de cozinha e as contas de água e luz
  • Com isso, o poder de compra dos brasileiros que ganham o mínimo está cada vez mais comprometido; as famílias conseguem apenas custear sua subsistência, sem ter como avançar para consumir outros itens, o que faria a economia decolar

Veja a relação de dias trabalhados e o poder de compra de quem sobrevive com até R$ 1.100 por mês:

Cesta básica

  • Valor: R$ 640,51
  • Dias de trabalho necessários para aquisição dos alimentos básicos: 15

Botijão de gás de 13 kg

  • Valor: R$ 94,99
  • Dias de trabalho necessários para aquisição: dois

Conta de luz (247 kWh/mês), média de uma família com quatro pessoas

  • Valor: 221,49
  • Dias de trabalho necessários para aquisição: cinco

Conta de água (20 m³/mês), média de uma família com quatro pessoas

  • Valor: R$ 117,71
  • Dias de trabalho necessários para aquisição: três

Pacote básico de internet (120 Megabytes), TV e telefone

  • Valor: R$ 169,78
  • Dias de trabalho necessários para aquisição: quatro

Gasolina (125 litros para rodar 1.000 km por mês)

  • Valor: R$ 680
  • Dias de trabalho necessários para aquisição: 15

Aluguel (apartamento de dois dormitórios)

  • Valor: R$ 1.500
  • Dias de trabalho necessários para aquisição: 34

Fontes: Conjuscs (Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano do Sul), Jefferson José da Conceição, coordenador do Conjuscs, e IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)

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