Áreas particulares de proteção ambiental da Mata Atlântica estão sendo desmatadas na região de Parelheiros (zona sul). Além de crime, os terrenos estão sendo demarcados para loteamentos irregulares.
Segundo a Polícia Militar Ambiental, são, pelo menos, 23 hectares, que equivalem a 32 campos de futebol, loteados irregularmente e embargados neste ano.
A Prefeitura de São Paulo, da gestão Bruno Covas (PSDB), confirma que as áreas são de mananciais e privadas, sem autorização para desmatamento, parcelamento de solo ou qualquer tipo de loteamento.
A Promotoria de Justiça do Meio Ambiente tem inquéritos civis instaurados sobre a devastação verde, a partir de denúncias mais antigas. Outros arquivados.
Porém, o cenário em nada mudou. O Agora circulou na semana passada por várias áreas desmatadas e loteamentos. As árvores cortadas e jogadas ao chão eram o retrato da impunidade.
Pela extensa avenida Senador Teotônio Vilela, no trecho que liga Grajaú e Parelheiros, é possível ver cartazes colados em pontos de ônibus e postes, com vendas de terrenos. Entre as ofertas, uma delas no Jardim Casa Grande traz "excelente localização e a 5 minutos da futura estação Varginha", com entrada de R$ 7.000, mais parcelas de R$ 600,00.
Há informação importante, ao comprador, "sem consulta ao SPC e Serasa", órgãos de proteção ao crédito, mais "água, luz e ruas abertas".
A reportagem, sem se identificar, a princípio, ligou para quatro celulares para informações sobre os lotes. Um dos atendentes afirma que "quando a escritura sair, daqui seis meses, não será desmembrada. A pessoa só assina um documento de compra e venda", diz.
Em novas ligações, agora com identificação da reportagem, alguns dos vendedores desligaram; outros não mais atenderam "Eu só falo aqui para quem tem interesse em comprar. Não para fazer reportagem", afirma um terceiro. Os preços dos lotes, dependendo da localização e do tamanho, variam de R$ 60 mil a R$ 70 mil.
"São loteamentos criminosos, sem nenhuma licença para derrubar árvores nem lotear a terra. Colocaram no chão parte da mata atlântica, em um ataque organizado. O pior que sob o olhar inerte, quase conivente, do poder público", afirma o vereador Gilberto Natalini (PV), que preside o Comitê de Chuvas e Enchentes do Legislativo e quer instalar uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito).
Há cerca de duas semanas, grupo de sete vereadores vistoriou áreas verdes devastadas com apoio da Polícia Militar ambiental, não só em Parelheiros como no Grajaú.
Gato
"Até dias atrás, a gente puxava a água de gato, mas a Sabesp veio ligar os relógios. O esgoto ainda não", contou, aos risos, um dos moradores de loteamento instalado na avenida Jaceguava, em frente ao número 305, no Balneário São José. Detalhe: no muro externo, com portão de ferro e cadeado, não existe numeração oficial nem placa da responsável pelo loteamento.
A reportagem entrou no local, sem se identificar, com a justificativa de interesse pela compra de um lote. Lá, viu vários imóveis construídos, a maioria sem acabamento, com famílias morando.
Meninos empinavam pipas, caminhões entravam e saiam com materiais de construção e pedreiros erguiam paredes. Um cavalo circulava na vasta área de terra batida, com ruas já abertas. Há iluminação.
"Todos os lotes já foram vendidos por uma associação e agora só alguns donos revendem", disse outro morador. Há um único comércio, a lanchonete Vitória da Lagoa, ponto de referência aos recém-moradores.
Os lotes têm 5 x 25 metros. À reportagem, o dono de três no local pediu R$ 75 mil por um dos terrenos. "Tá tudo legal. Só não há escritura, mas ninguém tem por ser manancial", diz.
Resposta
A Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente, da gestão Bruno Covas (PSDB), diz, em nota, que a gleba na avenida Jaceguava, em frente ao 305, está "planejada para integrar o parque linear Ribeirão Caulim", segundo o plano diretor estratégico (Lei 16.050/2014). Porém, como a área não foi desapropriada, ainda permanece como privada.
Com relação aos terrenos da avenida Professor Hermann Von Ihering, no Jardim Casa Grande, e da avenida Jaceguava, altura do número 4.085, no Balneário São José, os proprietários foram autuados, notificados e multados pela prefeitura. Os loteamentos não têm autorização nem alvará de construção. A prefeitura não informou sobre o desmatamento em terreno da rua José Nicolau de Lima.
A estrada do Schmidt e rua Francisco Correia Vasques, na Capela do Socorro, serão vistoriadas nos próximos dias.
A Secretaria Estadual de Infraestrutura e Meio Ambiente, em parceria com a Polícia Militar Ambiental, do governo João Doria (PSDB), afirma, em nota, que realizou 588 fiscalizações, entre janeiro e junho, que resultaram em 90 autos de infração ambiental nas áreas de proteção e recuperação de mananciais nas zonas sul e norte da capital.
A Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), do governo João Doria, diz, em nota, que é impedida por lei federal de atuar em áreas irregulares.
Em alguns locais específicos, a autarquia leva o Água Legal, programa que permite a instalação de redes de água em loteamentos irregulares e que serão futuramente, mediante autorização das prefeituras.
Neste caso, a Sabesp afirma que no caso do loteamento na avenida Jaceguava, em frente ao 305, com entrada também pela rua Augusto Gomes Siqueira, ao lado do 610, "foram executadas obras do programa" neste ano.
O que não ocorreu com a rede de esgoto, porque "não há autorização legal".
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