Grupos que integram o movimento negro na cidade de São Paulo reivindicam a criação de um memorial da cultura negra em um terreno na Liberdade, na região central, onde foram encontradas nove ossadas de um antigo cemitério onde escravos eram enterrados.
As ossadas foram descobertas em dezembro do ano passado, quando começaram as obras para construção de um prédio comercial na rua Galvão Bueno, 69. O terreno faz parte da área onde ficava o antigo cemitério dos Aflitos, que funcionou até 1858. Atualmente, existe apenas a capela dos Aflitos, erguida em 1779.
As ossadas estão sob a guarda do Departamento de Patrimônio Histórico da Secretaria Municipal de Cultura, da gestão Bruno Covas (PSDB). É lá que tramita o pedido de desapropriação da área feito pelo movimento negro.
“Existe um decreto de utilidade pública do terreno em discussão. A ideia é desapropriar a área e construir um memorial do sítio arqueológico dos Aflitos, algo semelhante ao que foi feito na região do Valongo no Rio de Janeiro. Queremos fortalecer a nossa história”, afirmou o escritor José Abílio Ferreira, do Movimento de Literatura Negra.
O sítio arqueológico Cais do Valongo, na zona portuária do Rio de Janeiro, foi o principal porto brasileiro que recebeu os negros escravizados vindos da África.
Segundo a arqueóloga Sônia Cunha, da empresa A Lasca, responsável pelas escavações no terreno da rua Galvão Bueno, a maioria das ossadas era de adultos, sendo duas mulheres. Além disso, três ossadas mediam entre 1,56 m e 1,64 m.
Concluídas em abril de 2019, as análises laboratoriais das ossadas não foram conclusivas sobre a origem, a etnia, a idade e a possível causa das mortes. Isso porque, segundo Sônia, o material coletado estava em condições frágeis e fragmentadas, o que dificultou as análises.
A Secretaria Municipal de Cultura disse que está sendo feito exame de DNA nas ossadas, além de outras pesquisas para trazer mais informações sobre o cotidiano das pessoas que vivem naquela época.
Apoio
A Secretaria Municipal de Cultura confirmou que o DPH (Departamento de Patrimônio Histórico) “apoia e estuda” o pedido do movimento negro para transformar o terreno da rua Galvão Bueno em um memorial da cultura negra. “Diante dos achados arqueológicos e da reivindicação, o DPH apoia e estuda o caso”, disse.
A pasta disse que uma resolução editada no ano passado determinou a proteção arqueológica no entorno da capela dos Aflitos, na Liberdade. Além disso, segundo a secretaria, o antigo cemitério dos Aflitos, na mesma região, receberá uma placa do projeto Memória Paulistana, que destaca lugares de memória da capital.
Segundo José Adão de Oliveira, do Movimento Negro Unificado, a criação do memorial é importante para que a população possa se apropriar da verdadeira história da cidade de São Paulo e do Brasil.
Segundo a secretaria, a obra do terreno da rua Galvão Bueno está embargada por conta de uma demolição considerada irregular.
A reportagem procurou a construtora RMR Engenharia, responsável pelas obras no terreno, mas até a publicação desta reportagem não recebeu resposta. A reportagem não localizou o proprietário do terreno.
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